Folha de S. Paulo


CRÍTICA

Mistura de linguagens, longa 'Pendular' cumpre promessa

Divulgação
Os atores Raquel Karro e Rodrigo Bolzan formam o casal de artistas do longa 'Pendular
Os atores Raquel Karro e Rodrigo Bolzan formam o casal de artistas do longa 'Pendular'

PENDULAR (bom)
DIREÇÃO Julia Murat
PRODUÇÃO Brasil, 2107, 18 anos
ELENCO Raquel Karro e Rodrigo Bolzan
QUANDO estreia nesta quinta (21)
Veja salas e horários de exibição

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Falar sobre arte é perigoso. Quantas vezes o leitor já foi apresentado a uma figura irreal de artista? Um ser intocável, imaculado, na contramão da sociedade. Interessante seria vermos uma ode aos medíocres. Quando todos são gênios, é sinal de que algo vai errado.

Em "Pendular" (2017), a diretora Julia Murat apresenta a história de uma dançarina e de um escultor. "Ela" e "Ele". Anônimos. Deixa claro que artistas também podem ser falíveis. Presos na eterna luta entre o que é liberdade pessoal e o que é respeito ao espaço alheio.

O homem e a mulher dividem um galpão. Moram nele, vão ao banheiro, jogam videogame. Murat traz o mundo externo para dentro do lugar: amigos, peladas de futebol, lembranças do passado. Acaba transformando-o em zona de conflito, dividido com fita vermelha. De um lado, a área dela. De outro, a dele. Um exercício de bucólica democracia.

Os letreiros iniciais afastam a sílaba "lar" das sílabas "pendu". É realmente um "lar", onde a ação cai uma hora no colo do homem, uma hora no colo da mulher. A câmera força um clima de intimidade. O espectador parece olhar pelo buraco da fechadura, até nas cenas de sexo –que trazem uma corajosa inversão de papéis, a certa altura do filme.

Ela e Ele, porém, não são tão interessantes assim em termos de vida interior. Derrapam em pregações que lembram "Baixo Gávea" (1986), crônica do mundo descolado dos anos 1980. A dançarina e o escultor conversam com frieza, apesar de termos que acreditar que se fusionam em uma relação poderosa.

"Pendular" é um combo entre o excesso de palavras e a composição dos objetos. Tudo é corpóreo, como as rotinas da dançarina e o trabalho físico do escultor. É nítido que Murat não quis se esgotar na dramaturgia (no roteiro, nos diálogos). As esculturas criadas para o filme também são personagens importantes para compreendê-lo.

Como prática dessa intenção, "Pendular" é bem resolvido, embora deva assumir os ônus que vêm com o projeto. Não se trata apenas de cinema, mas de uma junção com a dança e as artes plásticas. O silêncio, por exemplo, poderia ser melhor aproveitado. Caetano Gotardo utilizou-o em "O Que Se Move" (2013), intercalando com a música, que é mera coadjuvante no longa-metragem de Murat. "Pendular" padece da mistura de linguagens, mas cumpre o que promete, sem maiores expectativas.

Assista ao trailer de 'Pendular'

Assista ao trailer de 'Pendular'


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