Folha de S. Paulo


Em Toronto, filmes apresentam visões opostas da sociedade americana

credf
O ator Jake Gyllenhaal e o autor Jeff Bauman falam em coletiva sobre o filme
O ator Jake Gyllenhaal e o autor Jeff Bauman falam em coletiva sobre "Stronger" em Toronto

Ambos baseados em histórias reais, os filmes "Stronger" e "I, Tonya" trazem duas visões diametralmente opostas sobre a sociedade americana. Os dois foram exibidos na manhã deste sábado (9) no Festival de Toronto.

No primeiro, Jake Gyllenhaal vive Jeff Bauman, sobrevivente do atentado terrorista à maratona de Boston em 2013. Após perder as pernas na explosão, ele passa por todos os clichês e as provações de qualquer história de superação que Hollywood já produziu.

No outro extremo, Margot Robbie dá vida a Tonya Harding, polêmica ex-patinadora olímpica acusada de sabotar a carreira de uma rival para ascender aos pódios. O longa de Craig Gillespie faz um retrato ácido da competitividade americana.

"Sempre busco filmes que tenham essa carga que transcende a própria trama", disse Gyllenhaal, que é também um dos produtores de "Stronger", na entrevista coletiva.

O ator afirma que se sentiu intimidado antes de encontrar o verdadeiro Bauman. "Ninguém pode entender o que ele viveu", disse. "Sempre me perguntam se um dia eu vou interpretar um super-herói. Pronto, interpretei um."

Dirigido por David Gordon Green, "Stronger" enfoca o processo de recuperação de Bauman -a recriação da explosão, já retratada em "O Dia do Atentado", com Mark Wahlberg, acontece logo no início da trama.

O protagonista tem de lidar com a perda das pernas enquanto enfrenta os dilemas de ter involuntariamente virado um herói nacional. O próprio estofo do roteiro, com direito a final catártico, aponta para uma exaltação da comunidade de Boston, retratada como um microcosmo americano de fraternidade.

Ao contrário de "Stronger", fixado no infortúnio vivido pela vítima local (Bauman, o da comunidade) pelas mãos do agressor estrangeiro (o terrorista, de fora), "I, Tonya" não traz heróis ou vilões nem alivia a barra dos americanos.

Muito pelo contrário. No longa, o australiano Gillespie cutuca a hipocrisia que levou a esportista Tonya Harding a virar, no início dos anos 1990, a inimiga que toda uma nação amava odiar.

O longa retrata com humor negro o tal incidente desencadeador desse ódio generalizado -o golpe no joelho sofrido pela rival Nancy Kerrigan a mando do marido de Tonya, que impediu a primeira de participar de um torneio de patinação artística nos Estados Unidos.

Gillespie não transforma a protagonista nem em vilã nem em vítima. Filha de uma mãe monstruosa e casada com um sujeito que a espancava, Tonya reage ao mundo à sua volta com o mesmo cinismo com que vem colhendo desde que, aos 3 anos de idade, foi levada a patinar.


Endereço da página: