Folha de S. Paulo


CRÍTICA

Filme 'Entrelinhas' soa como fanfic ao tratar de relações amorosas

Divulgação
Irina Björklund e Kevin Kilner em cena do filme 'Entrelinhas
Irina Björklund e Kevin Kilner em cena do filme 'Entrelinhas'

ENTRELINHAS (ruim)
(The Unattainable Story)
DIREÇÃO Emilia Ferreira
PRODUÇÃO EUA, 2017, 14 anos
ELENCO Irina Björklund, Edoardo Ballerini, Harry Hamlin Mais
QUANDO estreia em 31/8
Veja salas e horários de exibição

*

"Entrelinhas" (2017) é o primeiro longa-metragem de Emilia Ferreira, diretora brasileira radicada nos Estados Unidos. "A Fronteira" (2003) possuía origem semelhante: rodado fora do Brasil, com diretor brasileiro (Roberto Carminati) e baixo orçamento. No entanto, "A Fronteira" adotou uma temática latina, ao acompanhar famílias que emigravam para os Estados Unidos.

Emilia Ferreira já está do outro lado do muro. O que era sonho para os personagens de "A Fronteira" é algo concreto para Emilia, que, justamente por isso, não fez de "Entrelinhas" um manifesto sobre a brasilidade. Ao contrário, trata de um tema universal: as relações entre homem e mulher.

A dramaturga Jacqueline (Irina Björklund) envolve-se com Peter (Kevin Kilner), David (Harry Hamlin) e Skene (Edoardo Ballerini). Os atores são estrangeiros e toda a trama é falada em inglês. Peter é o boa-praça; David, o artista; Skene, o diretor da peça de teatro escrita por Jacqueline. Atenção para a peça: narra os desencontros entre Gustav Mahler e Alma, sua esposa, que abdicou do próprio talento em prol do compositor.

Tudo o que se vê são exercícios ególatras de Jacqueline e a óbvia insistência do filme em deixar claro que se trata de uma criatura manipuladora. No entanto, é a manipuladora em "processo de descoberta pessoal".

"Entrelinhas" não surte o efeito desejado. Existem limitações claras. Alguém fala sobre a vida "ser um jogo de xadrez" e outra cascata de obviedades. David na prisão é edulcorado, gourmetizado. A melhor amiga aparece quase sempre acompanhada por um husky siberiano, ouvindo Jacqueline e retrucando com blagues irônicas.

Até mesmo o ótimo mote de Mahler e Alma se perde. Alma teria aberto mão do futuro artístico por ser mulher e Jacqueline tenta o oposto: encarna a mulher alfa, devoradora de quem lhe atravessar o caminho. Acontece que Alma é uma referência icônica do século XX, jamais uma pobre moça ao léu. Faltam as sombras, as contradições que elevariam "Entrelinhas" e o distanciariam da fanfic.

Gay Walley escreveu o roteiro com Guinevere Turner e adaptou o próprio livro, "The Erotic Fire of the Unattainable", em que o filme é inspirado. Haveria muito o que burilar, para transpor a literatura ao cinema. Esteticamente, "Entrelinhas" está mais próximo de um programa de televisão.

*

Assista ao trailer


Endereço da página:

Links no texto: