Folha de S. Paulo


Para parceiros de Chico, maturação e variedade são trunfos de 'Caravanas'

Um disco enxuto –nove faixas, sendo sete inéditas–, mas maturado lentamente, ao longo de dois anos. Assim é "Caravanas", 23º álbum solo de estúdio de Chico Buarque, que chega às lojas físicas e virtuais na sexta (25).

"Antes, a gente entrava em estúdio com um núcleo mais definido, dessa vez optou-se por ir gravando uma a uma à medida que foram sendo criadas. Dá mais tempo para a maturação", diz Vinicius França, 61, produtor de Chico há três décadas.

O longo período de gestação trouxe também uma pressão sobre os que participaram da obra, segundo o maestro Luiz Cláudio Ramos, 68, que assina a direção e a produção musical –como faz desde "Paratodos" (1993).

"Fazer um disco já é uma coisa estressante, com o Chico ainda mais, pela relevância que tem. Foram dois anos nessa expectativa", diz o arranjador. "Para ele então, tendo que compor, nem se fala."

SEM EXPLICAÇÕES

A primeira das canções novas de "Caravanas" surgiu em meados de 2015: "Blues pra Bia", cuja letra fala de um homem apaixonado por uma moça em cujo coração "meninos não têm lugar".

É uma das que levantam dúvida sobre o quê (ou quem) teria inspirado o autor. Outra dessas é "Desaforos", em que Chico ironiza uma "dama florescida num viveiro e em salões que nunca vi" que "profere desaforos pro meu lado".

França, amigo de longa data do compositor, diz não ter ideia do que ele está falando.

"Não pergunto pra ele, cada um faz a leitura que quiser, o autor não tem de explicar", afirma o produtor.

Ele também desestimula tentativas de enxergar posicionamento pessoal do autor nas letras, como aconteceu com "Tua Cantiga", primeiro single do disco, que foi debatida nas redes sociais por sua letra em que o personagem diz que largaria "mulher e filhos" para seguir um amor. Confira abaixo o clipe da canção.

Tua Cantiga

"Uma minoria perdeu tempo, em vez de apreciar a qualidade poética, preferiu partir para a retórica carrancuda, confundiu a obra com o criador", diz França.

Não que o disco seja desconectado dos dias de hoje, como fica claro na regravação de "Dueto", em que Chico e sua neta Clara Buarque, filha de Helena e de Carlinhos Brown, atualizam a letra da canção citando Instagram, YouTube, Facebook e Tinder.

Em "As Caravanas", que fecha o álbum, critica "a gente ordeira e virtuosa que apela pra polícia despachar de volta o populacho pra favela", referindo-se aos conflitos entre a elite carioca e os jovens suburbanos que chegavam de ônibus às praias da zona sul.

"Ele é um cara antenado, que vive o mundo de hoje, e a obra dele sempre foi ligada a seu tempo. Esse disco tem essa influência", diz França.

Assim como a longa duração do processo, a variedade de gêneros e a qualidade melódica das composições de "Caravanas" foram citadas por todos os participantes do disco ouvidos pela Folha –o dono do trabalho não quis dar entrevistas.

Caravanas
Chico Buarque
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"É cada vez mais nítido esse aprofundamento melódico, harmônico, como ele encaixa as palavras na melodia", diz o baixista Jorge Helder, 55, que trabalha com Chico desde "Paratodos". No novo CD, assina sua terceira parceria com Chico, "Casualmente".

"O Chico consegue achar o som da nota musical numa palavra. Tem notas que são um pouco mais agudas, e ele acha o fonema que vai expressar bem aquela nota. É um detalhe sutil, com o qual ele se preocupa."

Confira abaixo o teaser de "Caravanas".

Caravanas


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