Folha de S. Paulo


Em novo romance, Santiago Nazarian usa neve para criar pós-terror

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O escritor brasileiro Santiago Nazarian, que acaba de lançar
O escritor brasileiro Santiago Nazarian, que acaba de lançar "Neve Negra", seu nono romance

Até pouco tempo atrás rotulado como autor juvenil e relegado ao limbo dos escritores que não produzem literatura "séria", Santiago Nazarian agora nega qualquer possibilidade de voltar à temática adolescente porque não tem mais nada a dizer a eles.

"Eu não uso mais drogas, não saio para balada, não teria paciência para paquerar moleques de 20 e poucos. Mas o espaço no meio adulto faz parte do longo caminhar na carreira", diz.

Cercado pelas paixões e angústias de um homem de 40 anos, ele afirma que falta identificação com o público jovem que tentou abraçar com "Garotos Malditos" (Record, 2012). Essas questões existenciais perpassam a narrativa de seu novo livro, "Neve Negra", que explora as paranoias da paternidade em uma narrativa pós-terror –gênero que mescla elementos do horror com temas psicológicos.

No dia mais frio do ano, Bruno, um pintor de meia idade bem-sucedido, volta durante a madrugada para sua casa, situada em uma cidade fictícia da serra catarinense. Tudo parece normal, até que seu filho de sete anos desperta e sua cadela sangra até a morte no quintal.

Diferente dos outros romances de Santiago, "Neve Negra" foi uma encomenda da RT Features, coprodutora de "A Bruxa" (2015). Seu livro, porém, ainda não tem previsão para chegar às telas.

A ideia de explorar a neve como elemento veio há alguns invernos quando conheceu a página do Facebook "Bonecos de Neve Brasileiros". A raridade de registro de neve no país se mostrou uma oportunidade literária. "Pensei em como essas raras noites podiam gerar um cenário único para uma história de horror", relembra.

Mais do que um cenário propício ao aparecimento de criaturas diabólicas como o Trevoso, personagem que é a versão brasileira dos duendes europeus, a neve –tão rara e limitada– também é uma alegoria da paternidade limitada de Bruno, que está sempre fora de casa e não acompanha o crescimento do filho.

A trama também explora a relação conflituosa do protagonista com a arte. Apesar de ser um pintor de sucesso, Bruno não consegue amar a arte tanto quanto sua mulher. Santiago diz compartilhar dessa sensação: escritor, sente que sua carreira se torna maçante na medida em que é cobrado para ler as pilhas de livros que recebe todos os dias.

Outros conflitos, como a sensação de deslocamento de Bruno, que faz sucesso com o público, mas é desprezado pelos colegas, Santiago avisa que já superou. "Com nove livros publicados, as pessoas começam a pensar que posso ter vindo para ficar."

Neve Negra
Santiago Nazarian
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Exemplo disso é sua mudança de posicionamento profissional. Se antes se sentia deslocado por produzir uma literatura fora dos padrões brasileiros –o autor chegou a criar o gênero "existencialismo bizarro" (ou pós-terror), para descrever seus trabalhos– acredita agora ter conquistado seu espaço.

Até pouco tempo vivendo entre São Paulo, Florianópolis e Helsinque (Finlândia), Santiago decidiu se estabelecer de vez no Brasil. Em um relacionamento estável e com um coelho de estimação, quer se distanciar de uma rotina solitária, como a de Bruno em "Neve Negra".

"O protagonista [do livro] é um artista ancorado que quer manter o movimento. Eu sou um artista em movimento que tenta se ancorar".

NEVE NEGRA
AUTOR Santiago Nazarian
EDITORA Companhia das Letras
QUANTO R$ 39,90 (208 págs.)


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