Folha de S. Paulo


Filme sobre grupo de gays em defesa de vítimas da Aids é quase documental

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Cena do filme '120 BPM', de Robin Campillo, em competição na 70ª edição do Festival de Cannes
Cena do filme '120 BPM', de Robin Campillo, em competição na 70ª edição do Festival de Cannes

O título do filme "120 BPM" não esclarece a que batidas por minuto se refere: se às do coração acelerado dos militantes da trama, às da pulsão do orgasmo a que se entregam os protagonistas ou ao ritmo da música house que embala a história.

Pode ser tudo isso, diz o diretor francês Robin Campillo, que compete com o longa no Festival de Cannes. Em seu novo trabalho, o diretor faz um recuo pessoal ao início dos anos 1990 para retratar os gays parisienses do Act Up, grupo aguerrido de defesa de vítimas da Aids.

"Não é um filme para passar uma mensagem", disse o diretor na entrevista coletiva seguinte à exibição do longa. "É para lembrar um grupo de pessoas que se uniram quando a epidemia provocava resultados trágicos e ninguém ousava falar dela."

Entre atos que envolvem interromper seminários de saúde e despejar sangue falso em empresas farmacêuticas, a história do filme se tece em torno da relação entre dois desses militantes, um veterano soropositivo e outro novato soronegativo.

O diretor fez parte do Act Up naquela década. "Vivi coisas que aparecem no filme, como os debates acalorados e ter de vestir amigos que morreram. São momentos ambíguos, até ingênuos. Seria até mais fácil se fossem puramente emocionais."

O registro quase documental com que "120 BPM" retrata os protestos encampados pelos personagens tem ecos de "Entre os Muros da Escola", vencedor da Palma de Ouro em 2008 e dirigido por Laurent Cantet, colaborador frequente de Compillo.

A semelhança entre as duas obras talvez explique a acolhida mais calorosa que o filme teve entre o público francês do festival.

DESANCANDO O MUNDO DA ARTE

Outro título em competição é a comédia de tintas surrealistas "The Square", do sueco Ruben Östlund. O diretor de "Força Maior" (2014) volta aqui a mirar a câmera para dilemas morais, mas agora para desancar o universo da arte contemporânea.

Estão ali a incompreensibilidade dos textos de catálogo de exposição, os performers que não têm noção alguma de limites e as obras de arte pós-moderna de qualidade inquestionável.

Christian (Claes Bang), epítome do europeu urbano, é o curador de um museu que sente que precisa "viralizar" para atrair mais visitantes. A solução que lhe dão, contudo, toma rumos catastróficos numa história repleta de situações à beira do absurdo.

"Qualquer coisa pode acontecer num filme em que um macaco aparece num apartamento", diz Östlund. E de fato, "The Square" traz um chimpanzé aleatório numa das cenas. "Gostamos de macacos porque eles são nossos espelhos, mas despidos de cultura. São o que seríamos caso fôssemos puro instinto. O filme é muito sobre isso."

O jornalista GUILHERME GENESTRETI se hospeda a convite do Festival de Cannes


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