Folha de S. Paulo


Jordan Peele é o primeiro diretor negro a passar US$ 100 mi em 'Corra!'

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Daniel Kaluuya é o fotógrafo Chris no thriller 'Corra!', de Jordan Peele
Daniel Kaluuya é o fotógrafo Chris no thriller 'Corra!', de Jordan Peele

A eleição de Barack Obama como primeiro presidente negro dos EUA, em 2008, teve extrema relevância para a comunidade afro-americana. Mas colocou uma pulga atrás da orelha de Jordan Peele, um comediante negro em ascensão na época.

"A discussão sobre racismo e xenofobia não estava em voga, e o país escondia atitudes que evidenciavam o racismo. Isso me intrigou", explica Peele à Folha.

Da desconfiança nasceu a premissa de "Corra!", que gerou um "buzz" como havia muito não se registrava em torno de um filme de horror.

No longa, cuja estreia no Brasil está prevista para o próximo dia 18, o comediante fez as vezes de roteirista e, pela primeira vez, de diretor para contar uma trama simples: após cinco meses de namoro, Chris (Daniel Kaluuya), um fotógrafo negro, é convidado por Rose (Allison Williams), sua namorada branca, para conhecer os liberais pais dela na cidade do interior dos EUA onde vivem.

Chris é recebido com carinho e admiração. Mas aos poucos vai notando que há algo de estranho sob a superfície amistosa –e o filme vira um thriller de terror sobre racismo velado.

"Levei para o filme o incômodo que sinto na vida ao ser a única minoria em um local. Todo mundo te julga e te encara por causa da cor da sua pele, mesmo que não exista o confronto", diz Peele.

Esse clima encontra eco num momento em que o ideário da ultradireita ascende, muitas vezes travestido de patriotismo. "Achar que o país não é racista é um problema tão grande quanto qualquer outro", acredita ele.

"Desde que Trump foi eleito e as atrocidades raciais passaram a dominaram a conversa nos últimos anos, as pessoas se prepararam para discutir o assunto de frente."

O zoológico social que "Corra!" impõe ao espectador reflete a mistura entre a experiência do comediante, vindo do programa "Key & Peele", e a ousadia de um novato na função de cineasta.

"Foi difícil convencer as pessoas que sair da comédia para um longa de horror era correto", diz o diretor. "Mas meu passado na comédia me ajudou. Comédia e terror são similares, pois provocam uma reação física no espectador, exigem timing e satirizam a humanidade e a forma de encarar nossos medos."

Apesar de as sementes desse thriller social terem começado a germinar –sob a influência de obras como "Esposas em Conflito" (1975) e "A Noite dos Mortos-Vivos" (1968)– na época da primeira posse de Obama, foi só em 2013 que Peele escreveu o roteiro.

"Escrevi o filme que gostaria de ver, mas sempre achei que ele permaneceria para sempre como uma ideia", diz. "Várias produtoras odiaram meu roteiro, acharam-no estúpido. Em defesa delas, digo que 'Corra!' é um estilo novo de filme, um risco."

O risco, no entanto, virou lucro: custou US$ 4,5 milhões de dólares e, só nos EUA, rendeu mais de US$ 170 milhões –quase US$ 200 milhões no mundo todo.

"É bem louco", comemora Peele, que se tornou o diretor estreante de maior bilheteria da história e o primeiro cineasta negro a ter um filme de estreia passando os US$ 100 milhões. "As pessoas veem o filme duas, três vezes, e o público não tem raça, gênero ou idade. Dei aos afro-americanos a experiência que há muito tempo vinham pedindo."


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