Folha de S. Paulo


Após indícios de direcionamento, licitação no Municipal de SP é anulada

Uma jornalista indicada pelo secretário da Cultura da gestão João Doria (PSDB-SP), André Sturm, venceu um processo de licitação em que há indícios de direcionamento.

A concorrência ficou sob a responsabilidade da Fundação Theatro Municipal de São Paulo, por meio da organização social IBGC (Instituto Brasileiro de Gestão Cultural), que gere o teatro paulista.

As irregularidades aconteceram no processo de contratação do escritório de comunicação [EM BRANCO], da jornalista Luciana Branco, orçado em R$ 60 mil mensais.

Após questionamento da Folha, o secretário e também diretor-geral da Fundação Theatro Municipal atribuiu as falhas no processo ao IBGC e cancelou a licitação. Não haverá, por ora, nova concorrência.

A empresa de Luciana Branco foi escolhida após uma tomada de preços feita em março, mas até o momento a prefeitura não havia terminado as formalidades da contratação. Por isso, ela vem atuando em regime de "doação" no teatro, ou seja, de graça.

A jornalista, que já havia colaborado com Sturm durante a transição em 2016, afirma ter sido convidada neste ano pelo secretário para dar ideias sobre a comunicação do teatro, considerada deficiente por ele. Diz ter passado a atuar gratuitamente desde o dia 3 de março.

Seis dias depois, Luciana disse ter recebido pedido de orçamento feito de maneira oral por funcionário do IBGC. Na ocasião, não chegou a receber documento com os detalhes dos serviços, como de praxe. A proposta da jornalista foi enviada no dia 13.

Só no dia 29 é que o setor de compras do IBGC pediu propostas a mais empresas, com prazo encerrando no dia seguinte.

Outras quatro assessorias foram consultadas, mas só duas apresentaram valores, um maior (R$ 77 mil por mês) e outro menor (R$ 54 mil).

A tomada de preços, mais simples que licitações grandes, não leva em conta só o valor mas também questões técnicas. A empresa [EM BRANCO] foi escolhida, mas o resultado não saiu no "Diário Oficial" por se tratar de uma OS.

Segundo o advogado Adib Kassouf Sad, da comissão de direito administrativo da OAB-SP, os prazos devem ser os mesmos para todas as empresas em processos de contratações públicas para evitar qualquer tipo de favorecimento.

O pedido de orçamento feito pelo IBGC a outras empresas no dia 29 se parece muito com a proposta enviada pela [EM BRANCO] no dia 13.

Tem até trechos idênticos, como o tópico: "Criação de ações que amplifiquem os produtos do Theatro Municipal (ex: #BisNoMunicipal)".

O Bis no Municipal, que permite o registro do final dos espetáculos com celular, foi implantado pela assessoria em março.

A proposta da empresa da jornalista fala em contrato inicial de cinco meses –ao todo, R$ 300 mil. Mas Luciana disse ter aberto mão da proposta e que atuará em esquema de doação até dia 3 de maio.

A prefeitura enfrenta problemas com o IBGC desde a gestão de Fernando Haddad (PT). A OS está no centro de um escândalo no Municipal; suspeita-se que desvios lesaram o erário em R$ 15 milhões.

Em março, a Justiça determinou que o IBGC se afaste do teatro. Cabe recurso. A gestão Doria quer outra OS à frente da instituição. Para isso, deve ser feita uma nova licitação.

Eduardo Knapp/Folhapress
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Processo não teve favorecimentos, afirma secretário

O secretário André Sturm e a jornalista Luciana Branco disseram haver falhas na concorrência, que afirmam ter descoberto após os questionamentos feitos pela Folha, mas negam um direcionamento.

Sturm afirmou ter determinado a contratação de assessoria de imprensa "competente" para o teatro e avisou Luciana para que concorresse.

"Juro que não interferi [na licitação]. Podia ter prestado mais atenção", disse. "Que não pareça que a Luciana teve benefício, porque seria muito injusto com uma profissional séria, que absolutamente agiu de boa fé."

A jornalista disse ter tomado conhecimento no último dia 20 de que o processo não ofereceu a concorrentes o mesmo prazo dado a ela. "Deploro a maneira como o processo foi conduzido pela OS."

Ela afirmou que vai concorrer quando outra entidade estabelecer "critérios transparentes de tomada de preço".

O IBGC só disse que "não firmou contrato algum com a empresa da jornalista Luciana Branco, razão pela qual não houve qualquer remuneração para a referida empresa".


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