Folha de S. Paulo


De 'saco cheio' de NY, Jim Jarmusch se refugia em casinha e estreia 'Paterson'

Alberto Pizzoli/AFP
US director Jim Jarmusch poses on May 25, 2013 as he arrives to attend the screening of the film
O diretor Jim Jarmusch

Jim Jarmusch, um dos mais importantes cineastas americanos em atividade, está de bem com a vida. Aos 64 anos, passou a fase turbulenta de precisar "mendigar" para financiar filmes como "Amantes Eternos" (2013) e encontrou refúgio na Amazon Studios, empresa ligada ao portal de vendas on-line.

Seu longa mais recente, "Paterson", que estreou na última quinta (20), reflete o momento "paz e amor" do diretor de "Estranhos no Paraíso" (1984). É uma ode à vida simples numa cidade do interior, onde um motorista de ônibus (Adam Driver) aproveita cada segundo para escrever poemas cotidianos.

Inspirado pelos textos do modernista William Carlos Williams (1883-1963), o filme traz poesias de Ron Padgett, membro da New York School, movimento da década de 1950 que influenciou o jovem Jarmusch. "Ficaria profundamente honrando se alguém um dia falasse que sou a extensão cinematográfica da New York School", disse em entrevista à Folha em Cannes, onde lançou o filme no ano passado.

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Folha - "Paterson" é uma carta de amor à vida simples?
Jim Jarmusch - Estou ficando de saco cheio da cidade. Ainda moro em Nova York, mas também tenho uma pequena casa nas montanhas, onde estou cercado por natureza, com ursos, coiotes e cervos. Ainda passo três semanas por mês na cidade e uma no campo, mas estou trabalhando para inverter isso. A cidade é muito barulhenta. Tudo gira em torno de dinheiro.

Engraçado você falar isso sendo que sempre teve interesse pela cultura underground urbana.
Hoje, Nova York tem três vezes mais pessoas que no fim dos anos 1970, quando me mudei para lá. A cultura underground vem dos jovens ou das pessoas que não têm muita grana. A cidade agora é para os ricos.

Alguns anos atrás, você disse que estava deprimido e pensava em abandonar a carreira por causa das dificuldades de financiamento. Isso mudou?
Estava em baixa. Conseguir dinheiro é muito difícil. "Amantes Eternos" se passa em Detroit, mas filmei muito fora da cidade e em estúdios. Foi como domesticar um lobo. Gosto de estar solto no mundo em lugares reais. Ainda não estou feliz com a situação.

Mesmo com a Amazon bancando o projeto?
É uma grande corporação, certo? Antigamente, vendíamos o filme e dividíamos o lucro. Era simples. Agora, se você faz US$ 1 milhão, ganha US$ 3. Mas foda-se, só quero fazer a porra do filme. A Amazon foi cuidadosa comigo, nunca deixou de pensar no lançamento nos cinemas, nunca quis interferir no elenco. Não me entenda mal, eles não são malvados que estão me oprimindo. O mundo é assim hoje. A Amazon facilita meu trabalho, mas o cenário geral é frustrante, e eu estava preparado para desistir de fazer novos longas.

Essa luta não faz parte da profissão?
Sou um cineasta amador. Esta palavra vem do amor. Profissional é aquele que faz o trabalho por dinheiro. Gostaria de cavar um buraco no meu jardim e encontrar dinheiro para financiar meus filmes.

Uma grande mudança em "Paterson" é que não é um filme irônico.
Quando eu era mais jovem, eu me sentia um espertalhão. Ironia pode ser interessante, mas representa menos na minha vida hoje em dia. A vida é tão frágil e efêmera.

Por que escolheu Adam Driver como protagonista?
Adoro o rosto dele, sua maneira de se movimentar. Adam tem um tempo só dele.


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