Folha de S. Paulo


Bienal do Whitney tem engajamento político sem tom panfletário

Os cubos de vidro laminado dispostos num terraço que se projeta do edifício para a cidade podem não ser a melhor síntese da diversidade das obras escolhidas para a nova Bienal do Museu Whitney. Mas a elegância minimalista do trabalho de Larry Bell atesta as preocupações formais da mostra.

A Bienal, que começou no sábado (17) e vai até 11/6, não tem medo da vida, da política e da violência, mas não esquece o principal —a elaboração artística.

Numa época em que o ambiente cultural se deixa levar pela simplificação panfletária e pelos sermões politicamente corretos, os jovens curadores Christopher Y. Lew, 36, e Mia Locks, 34, dão uma salutar e bem-vinda demonstração de que a urgência das questões sociais não precisa ser inimiga de padrões estéticos sofisticados.

A Bienal deste ano é a primeira que tem lugar no novo prédio do Whitney, projeto do arquiteto italiano Renzo Piano, inaugurado em 2015.

É bem mais enxuta e precisa do que a anterior, que ultrapassava uma centena de artistas. Num esforço bem-sucedido de edição, a curadoria escolheu 63 participantes (alguns são coletivos) e distribuiu os trabalhos por dois andares do edifício, aproveitando os espaços ao ar livre criados por Piano.

VITRAL

A ideia de tomar partido da arquitetura da nova sede se estendeu também aos janelões de vidro —um deles suporta um vitral criado pelo mexicano Raúl de Nieves, que pode ser visto do lado de fora, iluminado após o anoitecer.

Desde sua primeira versão, em 1932, sob os cuidados da fundadora Gertrude Vanderbilt Whitney, a série de exposições anuais e bienais do museu volta-se para o ambiente americano, com o objetivo de traçar um panorama da arte do país, por meio da obra de artistas jovens e veteranos (como é, agora, o caso de Larry Bell).

A montagem da exposição, ordenada, fina e limpa, pode causar uma impressão de domesticação institucional, o que não surpreende, tratando-se, afinal, de uma sólida instituição -e não de um espaço experimental no Brooklyn.

Mas as obras se encarregam de falar por si e mostrar as garras da produção contemporânea emergente.

Em matéria de linguagens, há um pouco de tudo, de realidade virtual a pinturas, passando por fotografia, escultura, instalações e filmes.

É chocante, em realidade virtual, o trabalho "Violência Real", de Jordan Wolfson. Depois de vestir os óculos e os fones de ouvido, você entra num mundo que se apresenta com uma visão de baixo para cima de uma avenida com arranha-céus.

A imagem desce até chegar à calçada, onde você está parado diante do artista e de um homem. O Wolfson virtual te olha nos olhos, pega um taco de beisebol e começa a bater com violência na cabeça do sujeito, para depois pisoteá-la até virar uma pasta sanguinolenta.

Não consegui ficar dentro daquilo os 90 segundos originalmente programados; tirei os óculos e me afastei com o estômago embrulhado —não sem antes ouvir um aflitivo "tenha um bom dia" de um dos monitores que orientam os visitantes.

PINTURA FIGURATIVA

Na pintura, embora a abstração marque presença, a maior parte é figurativa e contempla temas do cotidiano americano, com suas opressões, absurdos e banalidades. É o que se vê, por exemplo, nas telas de Aliza Nisenbaum, Celeste Dupuy-Spencer e também de Henry Taylor.

Taylor apresenta uma visão do assassinato de Philando Castile, no qual o homem negro foi baleado por um policial no banco de seu automóvel, em julho do ano passado, no Estado de Minnesotta, ao lado da namorada e da filha de 4 anos.

São dignas de nota, ainda, as telas de Jo Baer, menos literais e mais intrigantes.

A crítica de uma maneira geral aplaudiu a mostra com entusiasmo.

No jornal "The New York Times", Roberta Smith elogiou a linha de "engajamento social sustentado pela ambição formal" e considerou que a Bienal "reflete o surgimento de artistas comprometidos com o tema político, mas que não querem limitar sua arte ou dar lições aos espectadores".


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