Folha de S. Paulo


Crítica

Musical à moda antiga falha nos efeitos especiais da Fera

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Dan Stevens e Emma Watson em pôster de 'A Bela e a Fera', da Disney
Dan Stevens e Emma Watson em pôster de 'A Bela e a Fera', da Disney

Como estratégia de negócio, um remake com atores de "A Bela e a Fera" –animação da Disney de 1991– pode parecer uma operação sem riscos. Afinal, na linguagem do marketing, trata-se da repaginação de um produto de sucesso, com forte apelo junto ao consumidor.

Mas, em termos artísticos, as coisas não são tão simples. Havia uma série de desafios no projeto de transformar a animação –que, com seu quarto de século, já pode ser chamada de clássica– em filme de live action, com atores.

O primeiro era a comparação com o original. Não poderia ser nem muito distante, nem mera cópia daquele produto querido pelo público.

O diretor Bill Condon saiu-se dessa encruzilhada com elegância. Por um lado, valendo-se da experiência como roteirista de "Chicago" (2002) e diretor de "Dreamgirls" (2006), ele entregou um musical à moda antiga.

Para fãs nostálgicos do gênero, há cenários grandiosos, figurinos suntuosos e a bela trilha sonora com números originais e novos, em parceria de Alan Menken e Tim Rice.

Por outro lado, Condon deu, nas entrelinhas, piscadelas a questões da contemporaneidade. Há insinuação de que um coadjuvante –Le Fou, ajudante do vilão Gaston– seja gay. E há reforço no empoderamento feminino da protagonista Bela (Emma Watson).

Na escala das convenções femininas das heroínas Disney, ela aparecia em posição intermediária, alguém que recusa um casamento por conveniência, mas se apaixona pelo príncipe encantado (ainda que na forma de ogro). Nem Branca de Neve, nem Moana.

Bela não ressurge como heroína feminista, mas avança nessa régua como uma mulher mais assertiva e autônoma.

Nesse sentido, a escalação de Watson é perfeita: o feminismo que marca sua persona pública é transferido em parte, como carga simbólica, ao personagem. Além do desafio artístico da adaptação, havia outro de ordem tecnológica.

Como preservar o universo fantástico –um homem que se torna fera, objetos inanimados que ganham vida– dentro da proposta de live action (portanto, de natureza mais realista que a animação)?

Condon acerta nos detalhes: o candelabro, o relógio, a xícara, o guarda-roupa que se portam como humanos são perfeitamente "críveis".

Mas o diretor se atrapalha no essencial: sua Fera (Dan Steves) nunca deixa de parecer o resultado de efeitos especiais, não de um feitiço –o que rouba parte do encanto.

É mais difícil se envolver com a história de amor entre mulher e monstro se não esquecemos que ele é uma imagem criada no computador.

Setenta anos atrás, em sua versão de "A Bela e a Fera", o francês Jean Cocteau apresentou um monstro não apenas mais poético, mas também mais convincente. O que nos faz lembrar de que é o talento, não a tecnologia, que torna o cinema fantástico.

A BELA E A FERA
(Beauty and the beast)
Direção Bill Condon
Produção EUA, 2016, 10 anos

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NOVA BELA
Personagem ganha contornos contemporâneos

EMPODERAMENTO
Bela, quem diria, usa roupas feitas com algodão orgânico. Para se adequar às novas sensibilidades e atender pedidos de Emma Watson, a heroína de "A Bela e a Fera", mesmo vivendo em 1740, é adepta da moda sustentável e do empoderamento feminino

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Em 'A Bela e a Fera', a protagonista é uma inventora
Em 'A Bela e a Fera', a protagonista é uma inventora

INVENTORA
A nova Bela já surge mostrando que filha de peixe, peixinha é. Ela agora segue os passos do pai, um inventor, e cria uma máquina de lavar

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LEITORA
Contumaz leitora no desenho original, Bela agora é mais específica. Seu livro preferido é "Romeu e Julieta", de Shakespeare. Em vez de carregar o tomo numa cestinha, suas roupas do dia-a-dia ganharam bolsos externos. "Além de livros, acho que Emma colocou nos bolsos maçãs, nacos de pão e flocos de sabão", diz Bill Condon à Folha

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REÚSO
Em vez de sapato de bailarina, Bela ganhou botas. Além do vestido de algodão orgânico, a preocupação sustentável aparece nos apliques de uma capa, feitos com pedaços de madeira descartados no set pelos carpinteiros

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LIVRE
Para o longo de noite amarelo na cena da valsa, a figurinista Jacqueline Durran seguiu o mesmo padrão das outras peças do guarda-roupa de Bela: eliminou o corselete

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Emma Watson pediu para o corsalete ser eliminado do figurino
Emma Watson pediu para o corsalete ser eliminado do figurino

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