Folha de S. Paulo


Obra-prima de Brasília, Palácio Itamaraty completa 50 anos

Palácio Itamaraty

A rainha Elizabeth, a primeira-ministra da Índia, Indira Gandhi, e o príncipe (futuro imperador do Japão) Akihito já eram recebidos no novíssimo Palácio Itamaraty com o Eixo Monumental de Brasília ainda semideserto.

Protocolo e segurança não faltaram desde a abertura da nova sede da diplomacia brasileira, há 50 anos, em 14 de março de 1967. Desafia todos os clichês sobre a arquitetura de Oscar Niemeyer e as obras públicas no Brasil.

É funcional, majestosa e evitou desperdícios ou reformas por falta de planejamento. Ali, o mestre carioca encontrou um raro cliente público exigente, que sabia o que queria e que fiscalizava o que era erguido.

Inicialmente, seria uma singela caixa de vidro, como os palácios do Alvorada e do Planalto. O diplomata Wladimir Murtinho, chefe da comissão de transferência do Ministério das Relações Exteriores para Brasília, exigia uma construção mais segura. Assim nasceu o jardim aquático de Burle Marx, que protege o prédio, solução típica em castelos medievais.

Como contornar o pesadelo do protocolo das recepções, quando uma comitiva enorme se perde em filas nos elevadores e alguma autoridade é deixada para trás?

Já na quarta reunião da comissão de trabalho, em setembro de 1959, pede-se uma escadaria monumental. Ela surge como caracol flutuante, com degraus largos, que leva do térreo ao terceiro andar, com longos descansos entre um e outro, já que muitos dignatários não são exatamente jovens serelepes.

Com 72 mil m2 de área construída, o Itamaraty é maior que os palácios do Planalto, da Alvorada, do Jaburu e o edifício do Supremo Tribunal Federal juntos. Os diplomatas bateram o pé para não ganhar um ministério igual aos demais da Esplanada, não exatamente graciosos.

"Com diversas funções cerimoniais de Estado, de posse do presidente a recepções a chefes de Estado visitando o país, nasceu como palácio, mais funcional que megalômano", relata o conselheiro Heitor Granafei, organizador das comemorações do cinquentenário do local.

NEGOCIAÇÃO

Nos primeiros prédios de Brasília, a pressa superava o cuidado. O próprio Niemeyer relatou à Folha, em entrevista em 2011, um ano antes de morrer, que vários prédios públicos foram desenhados "sem sabermos exatamente quantas salas e gabinetes abrigariam".

"No Itamaraty, o arquiteto precisava negociar sua experimentação com uma comissão de altíssimo nível. Foi uma obra singular, no planejamento e na execução", afirma o professor Eduardo Rossetti, da UnB, que faz um doutorado sobre o palácio.

Wladimir Murtinho, muito próximo dos melhores designers do Rio, que fariam o mobiliário sob encomenda, instalou-se em uma sala no Ministério da Saúde, com vista para o canteiro das obras.

O chefe do setor de Patrimônio da pasta era o arquiteto Olavo Redig de Campos. Filho de diplomata e formado em Roma, já tinha projetado a celebrada residência da família Moreira Salles, no Rio de Janeiro, hoje sede do instituto homônimo, e era muito respeitado pelo mestre carioca.

O coordenador-geral da obra foi o rigoroso e detalhista arquiteto Milton Ramos.

Recém-formado, chegou à nova capital ainda em obras em 1959, levado por uma construtora. Produziu enormes protótipos dos arcos para ver a espessura e os efeitos da luz nas formas. Testou a composição do concreto com areia para criar o efeito final dos arcos -muito mais delicado, por exemplo, que o concreto aparente comum ao brutalismo nos anos 1960 e 1970.

Por razões acústicas, Ramos ainda desenvolveu painéis forrados de algodão e juta nas paredes, para evitar o eco comum a espaços gigantes com poucos móveis. Tapetes também criam espaços mais íntimos na amplidão do lugar, mais útil para a diplomacia.

A arte e o mobiliário foram encomendados a Athos Bulcão, Alfredo Volpi, Sergio Camargo, Maria Martins, Portinari, Burle Marx, Bruno Giorgi, Joaquim Tenreiro e Sergio Rodrigues.

Para celebrar o aniversário do prédio, o ministério anunciou o restauro de um mural de Volpi e uma iniciativa com estudantes de restauro de móveis para recuperar o mobiliário original.


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