Folha de S. Paulo


análise

Produtora marcou retomada de musicais, mas hoje arrisca pouco

"Les Misérables", primeira produção da T4F, é tido como marco zero da retomada dos musicais no Brasil, em 2001. Não é bem assim.

Dois anos antes, estreava "Rent", produção de Billy Bond com alguns nomes que viriam a definir o gênero no país. Outras podem ser lembrados, como o "Hair", de Jorge Fernando. Todos foram firmando o apreço, sobretudo paulistano, pelos chamados musicais da Broadway.

O que a T4F fez foi estabelecer um novo patamar, ao reformar todo o antigo Paramount, tornado Teatro Abril e hoje Renault, com um modelo de negócios inovador, em que a venda de "naming rights", por exemplo, é central. A prática vinha de outro momento pioneiro da T4F, com o Credicard Hall.

O teatro trouxe alta qualidade, da acústica às opções de consumo, ao mesmo tempo em que mantinha a ponte com o tradicional distrito teatral da cidade, a Bela Vista, numa sala de 1929 desenhada por Ramos de Azevedo.

Mais importante, a T4F introduziu praticidade e escala à venda de ingressos, com a Tickets For Fun, que vinha dos shows. Para artistas que passaram por suas produções, é esse o maior impacto.

Com peças como "Les Mis" e "O Fantasma da Ópera", talvez mais significativa na trajetória por aqui, o gosto paulistano se definiu por esse teatro hoje globalizado.

É negócio de custo e faturamento elevados. O êxito na operação ajudou a T4F e sócios como a gestora Gávea, dez anos depois, em seu lançamento de ações (IPO). Reproduzia-se o fenômeno observado antes na Broadway: uma empresa aberta, não mais produtores isolados, investe no teatro –sem constrangimento– comercial.

Um dos efeitos foi ajudar a formar uma geração de artistas qualificados para o gênero. Conviveram não só com profissionais das linhas de produção de Nova York e Londres, que atuam nas franquias mundo afora, mas com diretores seminais como Julie Taymor, de "O Rei Leão".

Porém o modelo já dá sinais de acomodação, até estagnação. O retorno da produtora a "Les Mis" reafirma que pouco avançou na busca de alternativas nacionais. Mais bem-sucedida, nessa direção, é a Aventura, que se tornou referência para o Rio com espetáculos biográficos sobre ídolos musicais.

Foi um passo à frente que a T4F não quis dar.

Em conteúdo nacional, na verdade, seu maior concorrente foi a Geo, da Globo, mas o projeto durou só três anos e no fim transferiu o teatro para a própria T4F –o Cetip. A sala em Pinheiros ainda prioriza temas nacionais, como "Gabriela, Um Musical", agora com a chancela da T4F, mesmo que não sejam produções originalmente suas.

Dezesseis anos atrás, o investidor e presidente da T4F, Fernando Alterio, assumiu um risco incomum no Brasil ao erguer teatro tão qualificado para estrear "Les Mis". A partir daí, como confirma a volta hoje a "Les Mis", as apostas são de menor risco.


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