Desde o começo não foi questão de cinema, mas de política. De cara, e sem papas na língua, o apresentador, Jimmy Kimmel, lembrou que a cerimônia estava sendo transmitida "para 245 países –que agora nos odeiam".
Depois de uma provocação sutil a Mel Gibson (talvez o único apoiador de Trump ali), lembrou a presença de Isabelle Huppert e agradeceu à segurança por tê-la deixado entrar. Era só o começo e, já então, sabíamos todos qual seria o negócio de Kimmel.
Primeiro fez uma referência ao Twitter de Trump, em seguida afirmou, solenemente sarcástico, que ali ninguém tolerava notícias falsas.
Como a dizer que era preciso dar um fim –provisório ao menos– a isso, a presidente da Academia, Cheryl Boone Isaacs, chegou lembrando que "a arte não tem fronteiras". Poderia ter dito muros: seria mais claro.
Claro, havia uma dívida do Oscar do ano passado em relação aos negros. E esse era o segundo ponto em questão.
O pedido de desculpas começou logo no prêmio de ator coadjuvante, para Mahershala Ali (que, por sinal, não estava nem aí para o problema).
Os negros prosseguiram em destaque: as atrizes de "Estrelas Além do Tempo" apresentaram a real Katherine Johnson, a matemática do filme, de 98 anos; o prêmio de documentário foi para um negro (que dedicou o prêmio a rapazes mortos pela polícia americana nos últimos tempos); Viola Davis foi a melhor coadjuvante.
Mas nem só de negros vive a oposição. Asghar Farhadi, o iraniano que não foi à festa, levou o prêmio de filme estrangeiro. Um dos maquiadores premiados dedicou o Oscar a todos os imigrantes. Etc.
Já dava para pensar que, se Trump não soltasse seu tuíte, se Mel Gibson não levasse nada, a coisa ficaria um tanto monótona. E não mudou muito: a ênfase continuou em Trump e adjacências. Hollywood comprou essa briga: eis a mensagem –dita e redita.
Do meio para o fim, em todo caso, a política cedeu espaço a outro espetáculo, o cinematográfico, e a pergunta geral era: afinal, "La La Land" desencantaria?
À medida que os prêmios eram distribuídos percebia-se que as 14 indicações eram exageradas. Ao final, "Moonlight" consagrou uma noite dedicada aos negros e aos excluídos. E à guerra a Trump.