Folha de S. Paulo


Sou meio Deus, meio demônio, diz Vera Fischer, que vive diabo em peça

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Vera Fischer chega ao palco do teatro para a entrevista com um vestido dourado e um sobretudo vermelho-inferno. "Hi", cumprimenta a todos, e já surge um fã –um cabeleireiro da produção– para pedir uma foto.

Ela concede, enquanto alisa os cabelos longos. Ato contínuo, tem nas mãos um tufo de cabelos, que entrega para um auxiliar jogar fora. O cabelo de Vera está caindo tanto assim?, é a primeira pergunta que surge. Não, logo sabemos que o rabo de cavalo é um aplique.

Na sessão de fotos, atende aos pedidos da fotógrafa, faz caras e bocas e a todo instante pergunta à equipe: "Tá bem assim?", "Esse vestido tá bom, ou é melhor o preto?". Então troca pelo preto.

Em poucos minutos, percebe-se que Vera Fischer continua a se comportar como a diva que é.

A atriz está ali para promover seu novo trabalho. Nesta sexta (6), no Teatro Folha, no Shopping Pátio Higienópolis, estreia em São Paulo a peça "Ela É o Cara", de Andrea Batitucci e Márcio Araújo, em que contracena com Edson Fieschi (veja horários e preços ao fim do texto).

Na comédia, o analista Gilberto Fonseca (Fieschi) busca pacientes-celebridade para ser ele mesmo alçado à fama. Entra em crise quando um de seus clientes morre e decide fazer um pacto com o diabo para dar a volta por cima.

Eis que chega ao seu consultório Vera Fischer em pessoa. Mas há algo de estranho: não se sabe se ela sofre de alguma crise de identidade ou se é o demônio, personificado na imagem da atriz, quem está ali.

Não é um espetáculo biográfico, mas tem traços da atriz e referências à sua trajetória.

Vera volta à cidade um ano e meio depois de se apresentar com outra peça, "Relações Aparentes". Continua fora da TV. A Globo, onde completa neste 2017 40 anos de trabalho, acaba de renovar contrato com a atriz, mas continua sem aproveitá-la –a última novela que fez foi "Salve Jorge", de 2012.

Questionada sobre por que Vera não é aproveitada e se há algum plano de trabalho para ela, a Globo respondeu: "Questões de contrato são internas e, em respeito aos nossos funcionários, não divulgamos".

Catarinense radicada no Rio que se tornou famosa primeiro como miss Brasil (em 1969), Vera Fischer fez 65 anos em novembro passado, 44 deles como atriz, numa carreira em TV, cinema e teatro que alternou boas atuações a outras destroçadas pela crítica, gangorra semelhante à de sua vida privada.

"Vera é um fenômeno. Começou como apenas uma mulher bonita e, pelo esforço dela, tornou-se uma grande atriz", diz o diretor de "Ela É o Cara", Ary Coslov, que já a dirigira em novelas na Globo e na peça anterior dela, "Relações Aparentes". Para ele, a avaliação de que Vera é uma atriz irregular, alternando grandes papéis com outros sofríveis, "pode ser porque ela é muito invejada".

Vera dá de ombros aos críticos. Continua inquieta e sem rédea. Em 45 minutos de entrevista, falou muito (na primeira pergunta, engatou uma resposta de 11 minutos) e sobre quase tudo, menos da atual crise brasileira e de política. Neste quesito, só abriu uma exceção –para comparar Donald Trump ao diabo.

*

Folha - Quando estreou "Relações Aparentes", em 2015, estava havia nove anos longe do teatro. Como foi transitar de "Relações" para "Ela É o Cara", em que ainda mais você é meio você mesma?
Vera Fischer - Na verdade não. Na verdade o diabo assume a forma que ele quer. E ele resolveu assumir a forma de Vera Fischer. Começando no "Relações Aparentes", eu nunca tinha feito uma comédia inglesa. Então, assim, é outra coisa, é totalmente o oposto dessa peça. Ela [sua personagem, uma dona de casa] era simpática, era, assim... inglesa.

Depois pulamos para esta, que foi escrita. Porque na verdade a gente tem uma outra peça guardada, que é um "peção", que precisa de muito patrocínio. Estamos guardando, e, nesse meio-tempo, pra não ficar... assim... estamos todos sem trabalho, então vamos lá fazer uma peça. Eu estou adorando, porque eu acho que tenho um lado de Deus e de demônio. Acho que todas as pessoas deveriam ter isso. Porque, na verdade, o que é o demônio? Ele era o Lúcifer, ele era um anjo de Deus que se indispôs com Deus, como no caso de Martinho Lutero com a Igreja Católica. Ele foi para o protestantismo o que o nosso Lúcifer foi para o inferno.

A gente fez sem patrocínio, estamos nos bancando. E acho que, como na primeira peça viajamos pelo Brasil inteiro, nessa aqui a gente está tendo uma receptividade muito maior.
Eu não apareço na televisão desde "Salve Jorge", então as pessoas dizem: "A gente tem que vir te ver aqui porque na televisão não vê, agora, pessoalmente é muito melhor". E eu curto também. Quem não é vaidoso? Quem não quer ser olhado nos olhos e ouvir assim: "Ai, eu te amo, você é linda, você é uma deusa, você é diva".

E eu estou achando bonito eles trazerem os filhos adolescentes. Eles vêm porque no teatro eu sou a dona. Eu tenho a minha voz, a minha expressão corporal, o meu físico, o meu tamanho, o meu balé, os meus movimentos. Isso tudo, na televisão, às vezes, você tem que saber a diferença. E tem público, os mais jovens, não estão acostumados. Porque realmente é uma honra eles saírem. Hoje em dia com internet, televisão, com o caralho a quatro, as pessoas se vestirem, pegarem o carro, pagarem ingresso, se sentarem e ficarem em silêncio no escuro. Nessas duas peças que eu fiz, não tocou o celular uma vez sequer.

Como você atua numa comédia?
Eu uso todos os meus potenciais. A minha voz, antigamente, ela tinha um timbre. Eu fui trabalhando a minha voz. Ela é grave, por exemplo: "Quais os pecados? Os sete" [em voz grave e macabra]. "Ah, não, mas eu sou cinéfila" [bem aguda]. "Tem certeeeeza?" [em tom baixo e irônico].

Numa comédia como essa, eu tenho chance de fazer várias coisas, de fazer a simpática, a agressiva, a perigosa, a boazinha, quando eu falo com ele: "Mas você me curou". "Mentira minha" [com voz grave e escrachada]. Então dá pra brincar com todos esses tons de voz, movimentos físicos. E eu também falo, quando eu quero pedir, exigir alguma coisa, eu peço em alemão. Assim, tipo assim, quando ele pede uma coisa: "das will ich passieren" [Vera usa uma construção gramatical esdrúxula para dizer algo como "eu quero que isso aconteça"] e eu faço um gesto assim é pro telefone tocar. Aí o telefone não toca. E aí o diabo puto, né?

E você fala ainda alemão?
Falo.

Fala bem?
Falo. Eu estava usando [na peça] uma frase só. Mas agora vou usar acho que umas três.

Se o diabo falasse uma língua você acha que seria o alemão?
Poderia ser. O mais próximo do diabo era Hitler, né? Mas tem outros. Temos o Donald Trump.

E no Brasil?
No Brasil eu não vou falar. Porque aí seria difícil tirar algum. Teria que ser todos e tirar um ou dois.

Numa das tuas memórias você falava do teu pai, que teu pai era um nazista típico, uma coisa assim.
Um nazista convicto. Mas aí eu explico: meu pai era alemão e trabalhava na roça, ele era um cara pobre, um camponês. Então os discursos inflamados do Hitler pegavam a cabeça dessa gente. E meu pai veio para o Brasil não foi nem por causa da guerra. É porque as coisas que eles vendiam ficaram caras, quando os judeus inflacionaram o mercado, aí eles foram ficando mais pobres. Essa história o meu pai nunca me contou direito, porque ele não era de falar. Alemão não é de falar muito. Eu deduzi mais ou menos que ele veio ainda nesse período dos anos 1930 e começou a montar uma lojinha no sul, ele ouviu falar que no Sul do Brasil tinha alemães, aí ele veio.

Mas eu falo isso porque ele lutava, dizia: você tem que ler o "Mein Kampf" ["minha luta", livro de memórias de Hitler]. Eu dizia: "Não vou ler, pai tu não tem pena nem um pouco dos judeus?". Ele falava: "Eu não, o Hitler estava certo". Então eu não iria discutir com o meu pai. E eu acho que a gente não tem que ter vergonha de falar essas coisas. Ele acreditava, achava que estava tudo certo. Porque era o que o outro vendia. O outro vendia que iria dar tudo certo.

Você acabou de renovar o contrato com a Globo até 2020. Você tem vontade de voltar a fazer TV, e a fazer novela especificamente?
Eu gostaria muito de fazer minisséries. Porque eu acho que os temas são mais contundentes, mais arrepiantes, mais modernos, mais despudorados. Mas, assim, claro que, se vier um papel importante, não precisa ser o principal, não existe mais isso. Se for um papel importante, claro que eu vou fazer. Eu sou contratada.

Se você me perguntar por que isso está acontecendo, eu não sei te explicar, realmente eu não sei por que eu não estou lá fazendo um personagem. Talvez só me chamem quando tiver um que seja realmente para mim, porque não? Eu tenho que pensar assim. Mas quem sai perdendo não sou eu. São eles. Porque eu sou muito boa atriz. E eu gosto muito de teatro e eu não vou parar.

Você tem uma outra peça grande em vista. Pode falar um pouco dela?
A gente tem os direitos, vai comprar de novo, é o terceiro ano em que a gente vai recomprar, "O Doce Pássaro da Juventude", do Tennessee Williams. Uma atriz também que vai à estreia de um filme e as pessoas olham: "Será que essa atriz envelheceu?". Aí tem todo um problema de identidade. E eu fiz o "Gata em Teto de Zinco Quente", que era maravilhoso, foi um sucesso estrondoso.

Na sua última novela, "Salve Jorge", você se queixou do papel.
[interrompendo] Eu não, eu sozinha não. Todos os personagens se queixaram. Porque era uma novela que tinha mais de cem atores e não era boa.

A crítica também não achou...
Ninguém achou. Mas pronto, acabou. Acaba aí. Ponto. Period [ponto final, em inglês].

Você teve proposta nesse período de outras emissoras?
Às vezes tenho.

E você está contratada lá na Globo, é uma grande atriz, você é famosa, você, enfim...
Eu ainda não fiz esse tipo de... como se chama isso? Chantagem! Não faço.

Mas você acha que a Globo renova sem te colocar no ar somente para uma concorrente não te levar?
Não acredito que seja só isso. Eles estão esperando alguma coisa acontecer. Que eu não sei o que é, mas que eu vou poder fazer. Mas pode ser também. Medo da concorrência. Por que não?

Nos anos 1990 você fazia muita publicidade e tinha um dos cachês mais altos. Você ainda é chamada para fazer essas coisas?
Agora não, agora o máximo que pode acontecer é um evento, por exemplo, no Recife, um congresso, uma festa, de ser chamada para apresentar ou para fazer presença.

E você faz?
Às vezes eu faço. Quando compensa eu faço. Agora, já me chamaram 300 vezes para fazer "A Paixão de Cristo", eu digo, "não dá". E eu sou sempre a Nossa Senhora, nunca a Madalena, o que eu acho perfeito. Mas você tem que ir meses e meses antes lá gravar. Depois, eu tenho um problema no joelho, e tem que andar muito pela cidade inteira, sabe? Aí eu gostaria de fazer, mas tem coisas que não dá mais.

Você acaba de completar 65 anos. Como encara a velhice? O que ela traz de bom? E quais são as piores coisas da velhice?
A velhice não é a velhice para mim ainda, é só a sabedoria. Você fica mais sábio. E você lê mais, você vê mais coisas, você chega a mais conclusões. Eu tenho por dentro um arquivo –de leituras, de filmes, de tudo– muito grande. Isso te serve para milhões de coisas.

Eu não me considero uma atriz só, eu sou uma artista. Porque eu pinto quadros, eu escrevo livros, eu faço colagens. Eu sou muito artesanal, manual. Eu escrevo à mão, eu tenho paciência para fazer as coisas. Não gosto muito dessa era cibernética, internética.

Você desejar feliz aniversário pelo celular?... Manda um cartão... Eu compro, no Metropolitan, no Louvre, sabe aquelas lojinhas? Eu compro cartões, compro coisas. Eu sou assim, gosto disso.

Uma atriz de teatro tem de estar inteiraça. A voz tem de estar boa, você tem de estar sempre consultando médicos para voz. Tem que ter o quadril, o joelho. Eu dancei balé desde pequena, dancei jazz, dancei muito em boates. Meu joelho está em pandarecos. E às vezes eu faço movimentos que eu não deveria fazer, porque piora, mas eu faço. Só não faço realmente o que é impossível –corridas e coisas assim.

Então a gente tem de se preparar muito mais do que quando a gente é jovem. Agora, a gente ganha muito mais também porque você faz mais pausas, entende melhor cada palavra. Às vezes a peça está em cartaz há seis meses e você descobre que naquela palavra, naquela construção ali... enriquece. Você compreende melhor. É como se estivesse claro e ali fica mais claro. Isso acontece muito.

Também tem o lado de eu fazer ginástica, que eu faço. Faço massoterapia. Compro cremes, muitos. E eu tenho, a minha camareira sabe, depois que eu saio do teatro à noite eu tomo um baaanho, eu me esfrego toda. Tem creme pro olho, pra pele, pro pescoço, pro corpo, pros pés. Eu sou uma pessoa cara. Caaara. Cara. Eu gasto. Não sou muquinha não. Eu prefiro... minha secretária aí se vira. Pega emprestado.

Você contou que em uma cena da peça a personagem diz que tem medo de ser esquecida.
Não, não. É que ele [o ator] senta na cadeira e diz, "vamos fazer umas dinâmicas". Um medo, aí ela fala: "Ser esquecida e desaparecer"; gosto de: "Ouvir as pessoas me chamando". Vera Fischer e o diabo.

E é isso mesmo, Vera Fischer tem medo de ser esquecida?
É isso mesmo, claro que é isso mesmo, eu, hein...

Mas você vê algum indício de que isso possa acontecer?
Nenhum. Nenhum. Do Oiapoque ao Chuí estão todos lá [imita alguém embevecido], babando. E eu adoro ser babada.

Você falava de seu incômodo com as coisas digitais. A internet ampliou a superexposição das celebridades. Como você lida com isso?
Eles fazem. Eu sei que certas partes da imprensa, falada ou televisada ou sei lá o quê, ganham uma fortuna por cada foto horrenda que eles tiram, gente de boca aberta, bocejando, caindo de bêbada, eles ganham uma fortuna. Então eu deixo pra lá. Porque eu sou assim. Quando eles me veem ao vivo eu sou assim. Na foto eles podem fazer lá o que quiser.

E rede social? Você diz que não usa celular, mas tem sempre publicado fotos no Instagram.
Ah, mas eu tenho uma pessoa muito querida, que eu falo, "faz isso". E ela faz.

Quem é?
Não vou dizer. Eu me propus a fazer só isso e falei, quero dividir com vocês coisas antigas e coisas novas. Então, quando não tem assunto recente, tem uma novela [do passado]. As pessoas adoram. Eu sou uma pessoa que tiro fotos, faço álbuns de todas as novelas, todos os filmes, todas as peças. Fotografo todo mundo, então eu tenho a coisa em papel. Eu gosto. Quando não tem uma do celular que fique boa, a gente posta a do papel.

Outro dia você postou uma na banheira com a Carolina Dieckmann na época de "Laços de Família"...
Botei uma que ninguém tem. Nós duas dentro da banheira, peladas, com as pernas pra cima. É interessante, nem o fotógrafo tirou essa foto, tenho fotos que só são minhas. Mas é claro, quando a gente está em viagem, o celular é mais rápido, porque você tira foto e manda e imediatamente elas colocam, e eu digo assim: "diga isso, fale aquilo".

Mas, voltando à indústria de celebridades, em 2015 houve um episódio em que circulou uma foto tua no aeroporto com roupas mais despojadas.
[interrompendo] Não, eu estava com um vestido da Osklen... Vestidinho, simplesinho... era um vestido da Osklen. Eu estava de cabelo molhado e metendo a mão na bolsa procurando...

Sim, e circularam na internet montagens comparando com fotos suas mais jovem e comentários depreciativos... Como você lidou com aquilo?
Eu fiquei mal pra caralho, se você quer saber. Fiquei mesmo, muito mal. Aí depois falei: "Ah, é?". Aí um repórter bacana escreveu: "Olha, gente, vocês podem bater foto o quanto quiserem, a Vera vai continuar andando pelos aeroportos pra lá e pra cá, continuar fazendo a peça, vai continuar trabalhando". E aí surgiram pessoas me defendendo, o que foi muito bacana, adorei. Mas eu não vou lá e bato boca, não faço isso. Quando tem alguma coisa escrita, que acho de duplo sentido, que eu não gosto, eu deleto rapidinho, antes que as pessoas vejam, só isso não respondo. Só agradeço sempre às pessoas, por eles se lembrarem, mas não vou discutir...

Você tinha comentado que, entre outras habilidades, você escreve...
Tenho dez livros escritos à mão, porque escrevo à mão. Não sei fazer [no computador], aquilo ali na minha frente embaralha, fico enlouquecida. Gosto das palavras e gosto da palavra escrita. E, quando eu leio, eu leio. Não gosto de ouvir as pessoas lendo pra mim, não absorvo nada. Poesia também, a pessoa pode dizer poesia o melhor possível, eu lendo é outra coisa.

Então tenho dez livros escritos. Vai ter uma época em que vai ser bom lançar. Eu já lancei quatro ["A Pequena Moisi" e "Um Leão por Dia", ambos de memórias, e os romances "Serena" e "Lucíola"].

Você já disse que tinha pronto um chamado "Milagre do Amor"...
Eu? Nunca. Deve ser da Danielle Steel, da Nora Roberts... Eu não, não existe. Meus livros todos, pra evitar isso, "uma canoa e dois amores" ou então "o crepúsculo infinito"... pra evitar isso, os meus livros têm o nome de mulheres.

E todos com personagens femininas fortes...
É, mas às vezes o personagem masculino é melhor. Às vezes a antagonista vai ficando melhor à medida que eu vou escrevendo, aí ganha uma importância maior que a protagonista.

E tem uns que eu mato. Tem umas ruins, assim... que botam veneno pra matar o gato. Tem uma puta que não soube aceitar um namorado rico, aí ela morre no próprio vômito, e pronto, cabou. Eu gosto de escrever essas coisas assim, sabe? Tem uma personagem que senta numa tachinha enferrujada, aí a outra fica toda feliz, "vai ter tétano"...

Você tem também uma peça escrita, "Como Ser Feliz Depois dos 60". Como está?
Tenho também. Pode ser que saia, mas eu vou ter de ter uma ajudazinha, porque ainda não cheguei nesse ponto, acho que ela não está pronta.

Na verdade, eu escrevi "Como Ser Feliz Depois dos 80" porque eu quis que a Fernandona [Fernanda Montenegro] fizesse. Olha que exagero... exagero não, é você gostar mesmo da pessoa. É uma mulher que apanhava muito do pai, ela tinha medo dos homens, tinha medo de amor, não gostava de toques físicos. Sempre muito bem vestida. Mostrar uma Fernandona mais... sabe, falando poesia, "ai, eu gosto do pôr do sol", umas coisinhas assim. Eu tava sonhando com isso. Mas ela não pôde, claro. Aí se tiver alguém pra fazer daqui pra frente vai ser eu mesmo. Pode ser depois dos 60, depois dos 70...

E tem traços autobiográficos?
Não, tem o que eu penso, né? Eu falo do Amazonas, falo o que eu acho do Amazonas, mosquitos [faz zumbido de mosquito]... Tem sempre um personagem que é cruel, crítico, horroroso, que odeia Brasil, sempre tem. Tem o bom e tem o mau.

O Brasil viveu nos últimos tempos, e ainda vive, uma enorme turbulência política, seguida por uma crise econômica que perdura...
É, recentemente foi brabo. Mas aí você lê uma entrevista da Lenny Niemeyer, dos biquínis, que ela diz, "crise, que crise?, qualquer pessoa pode comprar um biquíni meu de R$ 1.000 e dar de presente".

Mas como você acompanhou/participou disso? Como você se posiciona politicamente neste momento?
Rien de tout [nada disso, em francês]. Tô nem aí. O que é ruim é ruim, a gente não participa. Podia ficar que nem a Glória Pires, "não tenho opinião formada". Se a entrevista estiver comprida, não bota isso não. Mas se ficar curta, pode botar.

Numa entrevista recente você disse que estava namorando, mas que não podia ainda revelar quem...
Eu inventei [dá uma gargalhada e um gritinho, abrindo um arco com os braços]. Tava cansada de as pessoas me perguntarem, "como assiiim, 12 anos sem namorado?", me enchendo o saco. Aí inventei um que cozinhava pra mim, cozinhava alcachofra, fazia iiihhhh.... Imaginação é comigo mesmo. [Disse] "Só não posso falar porque é uma pessoa muito importante, não posso falar".

Você foi dependente química, recorreu a clínicas de reabilitação algumas vezes...
[interrompendo] Querido, nos anos 80 as pessoas com as quais eu andava todas cheiravam cocaína, porque era a moda. Nos anos 60 foi o LSD, eu não participei porque ainda era muito guria. No teatro, Arena, Oficina, todo mundo usando LSD, cogumelos etc e tal.

Eu usei mesmo, e foi ótimo e depois acabou. Também era a única droga, porque eu não gosto de ficar três dias vendo morango no lugar de porco, não gosto disso não. Gosto de estar elétrica, mas já passou essa fase. Passou.

Editoria de Arte/Folhapress

Queríamos propor um bate-bola, com questões e respostas curtas...
[Interrompendo] Ah, não, me poupa... quantas perguntas são?

Do que você se arrepende?
Nada.

Qual é o seu maior medo?
[pensa durante alguns segundos] Medo? Tem uma porção, né? Quer dizer, eu tenho poucos medos. Eu tenho medo de que um filho meu morra. Isso é um medo, real.

O que nunca fez e gostaria de fazer?
Nada. Eu faço tudo, vou fazendo. Até eu morrer, que vai ser depois dos... se eu nasci antes da criação do mundo, vou morrer depois de o mundo acabar. Então tenho muita coisa pra fazer ainda. Faço tudo, tudo que eu quero eu faço.

O que te dá alegria?
Felicidade.

Mas o que é a felicidade?
É sorriso, é saudabilidade [sic], inteligência, bom-humor, gentileza, honestidade, criatividade.

O que te tira do sério?
Gente abusada e burra.

Maior ator brasileiro vivo:
[balança a cabeça negativamente, indicando que não vai responder]

Maior atriz brasileira viva:
Não existe o maior nem a maior. Tem muita gente boa e muita gente ruim.

Um filme:
Também não tenho um só. Mas eu gosto muito de "O Céu que Nos Protege" [de Bernardo Bertollucci], que é daquele escritor maluco, como é o nome dele... [Paul Bowles].

Um livro:
Gosto muito do D.H. Lawrence. Thomas Mann, também gosto muito.

Um disco:
"The White Album", dos Beatles

Um homem bonito:
Tem alguns, mas meu preferido... posso falar mesmo? É o Pierce Brosnan. Pra esse...

Uma mulher bonita:
Carmem Mayrink Veiga.

Em quem votou na última eleição presidencial?
Votei em trânsito [rindo, como quem não quer responder].

Você poderia definir de forma curta algumas pessoas?
Nein, nein, nein [não, em alemão], não acho bom isso não.

Michel Temer
Hã? Nananão, tira isso, não quero isso, não.

Dilma Rousseff
Não, não quero falar sobre isso. Política não. Política não tem nada a ver com artista.

*

ELA É O CARA
QUANDO sex., às 21h30, sáb., às 20h e 22h, dom., às 20h; até 26/2
ONDE Teatro Folha - Shopping Pátio Higienópolis, av. Higienópolis, 618, tel. (11) 3823-2323
QUANTO R$ 50 a R$ 70
CLASSIFICAÇÃO 12 anos


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