Folha de S. Paulo


Crítica

Entre os estranhos escritores japoneses, Yoko Ogawa se destaca

Esses escritores japoneses são mesmo estranhos, ainda que Murakami, Kawabata e Mishima –só para ficar nos exemplos óbvios– sejam tão diferentes entre si. Pois em matéria de estranhamento, Yoko Ogawa, nascida em 1962, ocupa um lugar de destaque entre os colegas.

Acaba de ser lançado o segundo livro da autora traduzido no país.

O primeiro, "Hotel Iris" (Leya, R$ 34,90, 208 págs.), foi vertido do francês, então é um pouco suspeito; este veio direto do japonês.

Chama-se "O Museu do Silêncio", foi escrito em 2000 e é tudo, menos normal.

Ogawa é uma autora misteriosa, capaz de impor ao romance uma atmosfera de obscuridade e suspensão que não enfraquece a leitura.

A trama de "O Museu do Silêncio" se passa num tempo indeterminado e numa geografia desconhecida, embora os toques orientais estejam por toda parte.

Conta a história de uma velha mulher bastante ríspida e rabugenta que pretende criar um museu cuja finalidade principal é capturar o tempo, a memória e as lembranças mais pungentes e importantes de pessoas mortas.

O museólogo encarregado do trabalho é o narrador –e ele não faz muito esforço para desvelar a cortina de mistério que comanda a narrativa.

Tudo no texto, porém, é simples, mesmo que engane nas aparências. Estamos diante de um bom romance de suspense que não é só isso.

SEM NOMES

O que a dona do museu quer é a substância, a metáfora perfeita do que teria sido a vida do morto. São coisas difíceis de apanhar, e o livro se abre em diversas possibilidades.

Os personagens que gravitam ao redor do museu em construção parecem tão estranhos e misteriosos quanto o que é contado.

Nenhum, aliás, tem nome. São nomeados por suas características.

Há a filha adotiva da chefe, meio insinuante. Há um jardineiro pra lá de suspeito, mas que ao mesmo tempo é uma tremenda mão na roda.

Há os monges vestidos em pele de bisão-dos-rochedos-brancos, membros de uma seita misteriosa que pretende sumir com os palavras e assim dar vida ao silêncio do empreendimento.

Também há uma onda de assassinatos de mulheres na região. As mortes apontam para um criminoso em série, que mutila os corpos sempre no mesmo ponto.

Ao juntar todo esse estranhamento e entrar no clima do romance, fica bem difícil sair dele.

"O Museu do Silêncio" é um exemplo bastante eloquente de como escritores tão díspares, saídos de um mesmo país, são capazes de inventar universos tão fabulosos.

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O MUSEU DO SILÊNCIO
AUTORA Yoko Ogawa
TRADUÇÃO Rita Kohl
EDITORA Estação Liberdade
QUANTO: R$ 49 (304 págs.)


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