Folha de S. Paulo


Tento fazer as pessoas crerem que a vida vale a pena, diz Egberto Gismonti

O músico e compositor Egberto Gismonti se apresenta em São Paulo, nessa quinta-feira (10), com a Camerata Romeu, primeira orquestra de cordas feminina na América Latina, formada por 17 musicistas cubanas, que gravaram com ele o álbum "Saudações", em 2009.

Gismonti acaba de ser homenageado na 54ª edição do Festival Villa-Lobos, que vai até 15/11 no Rio, e que contou com a apresentação do artista com a mesma orquestra no evento de abertura.

Criado para reverenciar a obra do compositor e maestro Heitor Villa-Lobos (1887-1959), o festival é o mais antigo evento de música brasileira com apresentações de música sinfônica e de câmara, recitais e espetáculos de música popular e de dança.

Gismonti, compositor com 69 anos e mais de 70 discos gravados, falou sobre a importância da homenagem, além de revelar o que irá apresentar em São Paulo, onde tocará violão e piano.

Aline Massuca - 27.mai.2013/Valor/Folhapress
O músico Egberto Gismonti, que toca em Pinheiros na quinta-feira
O músico Egberto Gismonti, que toca em Pinheiros na quinta-feira

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Folha - Como será o show de São Paulo nesta quinta?

Egberto Gismonti - Será diferente do feito no Rio de Janeiro pela natureza das coisas. Cada espetáculo é uma nova tentativa de tornar muito mais real o nosso imaginário.

O repertório é um pouco diferente porque não poderemos contar com Ana de Oliveira, solista, spalla, violinista devido a outros compromissos profissionais. Mas contaremos com o [compositor e clarinetista] Batista Jr. –ele apresentará "Música para Clarinete e Orquestra", que foi dedicada a Carlo Gesualdo [compositor italiano renascentista].

Além de "Lundu", "Forrobodó" e de alguns movimentos de "Sertão Veredas", o espetáculo terá outras de suas composições?

O público de São Paulo poderá ouvir quatro dos sete movimentos do "Sertões Veredas", que duram cerca de 40 minutos. Certamente, eles nunca foram ouvidos ao vivo, por falta de acordo com orquestras que se dispusessem a estudar todos os movimentos.

Também poderá ouvir "7 Anéis" e "Forrobodó", em versões para piano e orquestra, que até então não foram executadas ao vivo por aqui. Também ouvirão "Bodas de Prata & Quatro Cantos", que gravei com o [violoncelista] Yo-Yo Ma. A duração dessas músicas é de cerca de 80 minutos.

Como pretendo fazer um solo, além da apresentação da "Música para Clarinete e Orquestra", teremos uma apresentação com duração aproximada de 100 minutos.

Tratando-se de sonoridade, há diferença entre uma orquestra feminina e uma masculina?

Não sei responder. No entanto, garanto que há uma imensa diferença entre a Camerata Romeu e qualquer outra orquestra de câmara que eu conheço.

O que difere um músico cubano de outros?

Também não sei responder. No entanto, o que difere um músico de outros é a crença de que nossa vida foi doada à música, que é mais importante do que qualquer um de nós.

Qual o conceito desse espetáculo?

Sei que as músicas que serão executadas dependem de uma doação extrema, como músicos e como reverência à música.

Imagino que, pelo fato de entrarmos todos no palco cheios de vontade de tocar e de tentar emocionar as pessoas, levando-as, por qualquer período de tempo, a crerem que a vida vale a pena, uma diferença fica evidente.

A questão não é ser melhor ou pior, a questão é quando nós acreditamos profundamente no que fazemos. Isso existirá de sobra na apresentação do grupo no dia 10, em São Paulo.

Você tem algum ritual antes de tocar? Qual?

Nenhum. Interrompo a conversa quando anunciam o terceiro sinal. Ponho o pé no palco e tento aproveitar ao máximo a chance que o público me dá, sorrindo como se dissesse: "Estamos te dando o que temos de mais importante, nosso tempo de vida".

No dia 15, você volta à Sala Cecília Meireles, no Rio, para se apresentar com o Duo a Zero, dos violonistas Alexandre Gismonti [filho do compositor] e Jean Charnaux, além do também violonista Daniel Murray e da Orquestra Corações Futuristas. Como será o espetáculo?

Os integrantes do espetáculo do dia 15 serão esses e mais outros que pediram para participar. Credito esses pedidos ao resultado magnífico da apresentação do dia 4/11. Além dos citados, participarão o grupo Inventos [composto por seis músicos de sopro], a Orquestra Revelia [13 músicos] e, Bianca Gismonti, minha filha, que também pediu para participar.

Sendo o festival uma mostra de várias interpretações, opto por aquela que diz: momento de colheita do plantio feito e renovado desde Mario de Andrade, passando por muitos músicos e, sobretudo, pelo pensamento autodidata, teimoso, inspirador, vibrante e criativo de Heitor Villa-Lobos.

EGBERTO GISMONTI E CAMERATA ROMEU
QUANDO quinta (10), 21h
QUANTO de R$ 12 a R$ 40
ONDE Sesc Pinheiros, r. Paes Leme, 195, tel. (11) 3095-9400


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