Folha de S. Paulo


Crítica | Filmes na TV

Semana tem nacional 'Boi Neon', além de Kubrick e Brian de Palma

Nesta semana, a TV exibe seleção variada com filmes que vão desde épicos históricos, como "Spartacus", de Kubrick, a eróticos moderninhos como "Cinquenta Tons de Cinza".

A programação inclui ainda o aclamado nacional "Boi Neon", filme de Gabriel Mascaro premiado nos Festivais de Veneza e Toronto.

Leia abaixo quais são os destaques desta semana, selecionados pelo crítico da Folha Inácio Araujo:

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Segunda-feira (26)

Se boa parte do tempo o cinema alemão recente acerta contas com o nazismo, no que lhe resta dedica-se, não raro, a acertar as contas com o comunismo.

Pode-se dizer que "Barbara" (2012, Arte1, 0h15) é isso. No entanto, o filme de Christian Petzold nos interessa menos pelos motivos habituais (o caráter ora policialesco, ora corrupto, ora ambos) do que pela atmosfera que constrói.

Barbara é a cirurgiã em Berlim Oriental que as autoridades suspeitam de querer passar para o Oeste. Não sem razão: o seu namorado vive no lado ocidental da cidade e está mesmo querendo patrocinar sua fuga.

Estamos em 1980 e Barbara é mandada para um hospital nos confins da Alemanha Oriental. Esse é o grande ponto: o enorme desencanto que o filme transmite paisagem por paisagem, cena por cena. Não é miserável, é pobre. Não é horrível, é triste: é pior, porque a ideia é que fosse isso para sempre.

Trailer de 'Barbara'

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Terça-feira (27)

O que há de mais interessante em "Boi Neon" (2015, Canal Brasil, 22h) é que nada do que acontece ali é decisivo, não chega nem mesmo a ser relevante.

Em troca, esse longa de Cristiano Mascaro nos leva, cena por cena, a conhecer um modo de vida, o da vaquejada, tal como se desenvolve num Nordeste em transformação.

São coisas por vezes tolas, do tipo: como segurar o rabo do boi antes da hora de ele sair para a arena, onde o vaqueiro tentará laçá-lo. São detalhes, coisas por vezes pequenas. E temos ali um vaqueiro cujo talento é ser desenhista de moda, uma menina que não gosta de bois, mas de cavalos.

E por aí vai, de deslocamento em deslocamento, como se nada ali encontrasse o seu lugar, como se tudo estivesse de pernas para o ar. Um pouco como o próprio Nordeste. Não o lugar de mito e sim um lugar que não conhecemos.

Ainda hoje: "Invictus" (2009, Cinemax, 18h10).

Trailer de 'Boi Neon'

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Quarta-feira (28)

Jean Simmons não era apenas uma boa atriz. Foi a atriz oficial das superproduções envolvendo Roma. Normalmente ela era a boa cristã que amava um romano que vivia feliz da vida até que resolvia se converter e a vida dele virava um inferno.

Em linhas gerais era isso. Em "Spartacus" (1960, TC Cult, 22h), ela é a garota enviada pelos romanos para satisfazer o gladiador Spartacus. Este se recusa a transar com ela dessa forma.

Inútil dizer: Varinia, a moça, acompanhará o ex-gladiador em seu destino depois que ele passa a comandar a rebelião de escravos contra o Império Romano, por volta do século 1º a.C. Jean era o mais perto possível do cristianismo.

O filme foi escrito por Dalton Trumbo a partir de um romance de Howard Fast. Ambos comunistas de carteirinha. Stanley Kubrick não era, mas era bem esquerdista. Se fosse hoje e por aqui, essa galera toda estava na mira.

Trailer de 'Spartacus'

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Quinta-feira (29)

Brian de Palma gosta de personagens duplicadas, como as de "As Irmãs Diabólicas" ou "Femme Fatale". Reencontrá-las é também reencontrar o cinema de Hitchcock e, claro: "Um Corpo que Cai".

Em "Dublê de Corpo" (1984, TCM, 23h55) ele retorna ao tema. Em cena há um ator claustrofóbico e desempregado. Um amigo, também ator, o convida para morar em sua casa. E dessa casa se vê a janela de uma bela mulher que costuma se despir com ela aberta.

Sim, claro, estamos no território de "Um Corpo que Cai", basicamente (outros filmes são evocados). O ator está lá, com sua claustrofobia, para que testemunhe um assassinato. Ou seja: De Palma decalca Hitchcock, ou fragmentos hitchcockianos, os desloca e introduz num filme que evoca mais um "B" do que outra coisa.

Chega a um filme secundário em sua obra: uma espécie de repetição de achados anteriores que retornam quase sem compromisso e com muito prazer.

Trailer de 'Dublê de Corpo'

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Sexta-feira (30)

Se há uma coisa que eu nunca engoli foi a literatura de Fernando Sabino. A literatura séria, essa de que tanto se fala, de "Encontro Marcado" entre outros.

Já suas crônicas, que são na verdade pequenos contos, me parecem não raro notáveis. "O Homem Nu" (1997, Canal Brasil, 18h), entre eles. No entanto, essas crônicas colocam um problema à adaptação: sendo curtas, é preciso esticar o relato.

Roberto Santos foi muito feliz, no seu filme de 1968, entre outras porque adotou uma estética cheia de referências às HQs. Hugo Carvana, neste "remake", foi bem menos feliz. Optou por uma narrativa convencional e daí resultou um filme... convencional.

Diga-se, no entanto, que tem lá seus momentos. Sobretudo quando o lado bem carioca do relato se impõe: é onde Carvana sempre se deu melhor.

Setor blockbuster, temos hoje o primeiro e melhor "Homem Aranha" (2002, TNT, 22h30).

Trailer de 'O Homem Nu'

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Sábado (1/10)

Parece mais uma ameaça do que outra coisa: "Cinquenta Tons de Cinza" (2015, TC Premium, 1h35) em versão estendida! Como se a versão normal já não fosse insuportável o bastante.

Mas é isso: nosso mundo visual divide-se hoje em "mainstream" e pornografia. O que se promete é aqui pornografia, desde que um miliardário atrai uma jovem universitária para seu universo.

Universo sadomasoquista? Nada feito. Quem quiser isso procure, digamos, o Polanski de "A Pele de Vênus", de 2013. O universo de Christian Grey, a bem dizer, é muito pouco sádico, masoquista ou erótico.

Sua real perversão é o exibicionismo. Quanto a Sam Taylor-Johnson, a diretora do filme, sua perversão parece ser a proximidade com o pornôchic tipo "9 ½ Semanas de Amor". Só que pior. E, se pornô existe, consiste na exibição ostensiva de imóveis, carros, helicópteros e, para completar, chicotes. É ver para crer.

Trailer de 'Cinquenta Tons de Cinza'

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Domingo (2/10)

Paulo Honório começa pobre em "São Bernardo" (1972, TV Brasil, 19h), mas se faz na vida o suficiente para comprar a fazenda que dá nome ao livro de Graciliano Ramos e ao filme de Leon Hirszman.

Depois disso, Paulo Honório dirigirá com mão de ferro sua fazenda e sua casa, de tal modo que Madalena, sua mulher –e também professora– vai tomar partido contra ele.

Esse destino estará nas mãos de Othon Bastos, o Paulo Honório, de Isabel Ribeiro, a Madalena: dois atores notáveis, Nas de Hirszman, naturalmente, que também adaptou o livro. E na luz de Lauro Escorel, de uma limpidez particular.

O filme se destaca no domingo, em parte porque "A Conversação" (1974TC Cult, 19h50), de Coppola, tem sido bem reprisado, "Femme Fatale" (2002, Paramount, 9h15), de De Palma, é só para madrugadores e "Garota Exemplar" (2015, TC Action, 15h15), de David Fincher, é ok, sem mais.

Trailer de 'São Bernardo'


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