Folha de S. Paulo


Carrinhos de supermercado gigantes tomam SP em intervenção artística

Nas cercanias da estação Paraíso do metrô, o asfalto engole um carrinho de supermercado gigante enquanto a rotina de consumo do paulistano se desenrola ao redor.

A cena se repete em nove pontos de São Paulo desde a última semana, quando o artista plástico Eduardo Srur começou a instalação silenciosa de sua frota de dez carrinhos de 3,8 metros, amassados, enferrujados e tombados pela cidade.

Conhecido por intervenções urbanas, Srur usa suas obras para chamar a atenção para questões do cotidiano nas metrópoles, sobretudo as de cunho ambiental. Batizado de "Mercado", o atual projeto é um desdobramento de "Supermercado", instalação multimídia feita em 2012 em que o artista conduziu um carrinho de compras, jogou os produtos sobre o próprio corpo e os consumiu ali mesmo, em cima de sua pele, em uma orgia consumista.

Apropriando-se do objeto cotidiano, Srur exorta o público a repensar os atuais sistemas de produção e distribuição de produtos.

Segundo o artista, na primeira semana, uma das peças desapareceu no Vale do Anhangabaú. Nas mãos de um carroceiro, seus 300 kg e quase 4 m de altura foram despedaçados como carniça para virar desmanche. Do outro lado da cidade, o carrinho postado diante do shopping JK Iguatemi foi recolhido e atirado na garagem do centro comercial. A peça já foi recolocada no mesmo local.

"Já estou calejado com essas coisas. É uma resposta da cidade, mostra como cada um faz o que quer dela", diz Srur. "A cidade é surpreendida pelo trabalho, depois o trabalho é surpreendido pela cidade. Nem alegria nem tristeza, mas uma energia que modifica a obra."

"Mercado" ficará exposta nas ruas de São Paulo até 30 de setembro. Segundo a lógica de resíduo zero de suas obras anteriores —suas colossais garrafas Pet que margearam o rio Tietê em 2008 se transformaram em mochilas, por exemplo—, Srur planeja montar um cemitério artístico para reunir seus carrinhos decrépitos após o fim da intervenção.

"É uma obra que não dá nós no cérebro, mas os desata por ser pop, por convidar o público a participar. Me aproprio de um ícone do consumo atual, mas o jogo de escala gera um estranhamento imediato, como se tivéssemos sido engolidos por essas esculturas", diz ele. "O carrinho representa a compra por impulso, sem qualquer reflexão. É a problemática dos hábitos de consumo, do desperdício, do excesso, de como a gente vem consumindo mais do que o planeta consegue repor."


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