Folha de S. Paulo


John Neschling é afastado do cargo de diretor artístico do Theatro Municipal

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O maestro John Neschling, que foi afastado da direção artística do Theatro Municipal

Dizendo-se traído por "todos aqueles" que um dia disseram prezar seu trabalho, o maestro John Neschling foi afastado na segunda-feira (5) do cargo de diretor artístico do Theatro Municipal de São Paulo, sala administrada pela prefeitura.

A decisão foi tomada pelo Instituto Brasileiro de Gestão Cultural (IBGC), organização social ligada à prefeitura e que responde pelas contas do teatro. O assistente do maestro, Thomas Yaksic, pediu demissão na manhã de segunda.

Neschling é investigado pelo Ministério Público e também é alvo de uma CPI na Câmara dos Vereadores desde que foi citado em duas delações: de José Luiz Herencia, ex-diretor geral do teatro, e de William Nacked, diretor afastado do IBGC.

Ambos os delatores são investigados por participação em esquema que causou rombo de R$ 15 milhões nas contas da instituição.

As suspeitas que eles apontam sobre Neschling são de conflito de interesses nas contratações comandadas pelo maestro, e entre elas está a de um agente internacional que o representa no exterior, Valentin Proczynski (leia cronologia nesta página).

Diversas vezes durante o último ano, o prefeito Fernando Haddad interveio pela permanência do maestro no cargo. Após o escândalo sobre as contas do teatro vir a público, em março, a prefeitura nomeou um interventor, Paulo Dallari, para pôr ordem na casa. Dallari, porém, se afastou em agosto, alegando divergências em relação às investigações conduzida pela Controladoria Geral do Município.

O interventor pediu a demissão de Neschling a Haddad, mas não foi atendido. A Folha apurou que o conselho administrativo do IBGC também defendia a demissão do maestro. Contra isso, era alegado o comprometimento com a qualidade da programação do Municipal.

OSESP

Neschling é conhecido por ter elevado, entre 1997 e 2009, a Osesp (Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo) a um nível internacional. Ele foi demitido em 2009 da direção da Osesp durante o governo de José Serra.

O afastamento seguiu denúncias de autoritarismo por músicos Osesp e farpas trocadas com o governador. O maestro chamou José Serra de "menino mimado" e ganhou, com o episódio, o apelido de Neschlíngua.

Em nota, o maestro definiu o rompimento de contrato com o Theatro Municipal como "unilateral, ilegal e arbitrário". A decisão, diz, "será objeto de providências legais, sujeitas a avaliação conjunta com meus advogados".

"Mantenho-me com altivez, de cabeça erguida. Não participei de nenhum esquema, de nenhum tipo de falcatrua. Reitero a minha inocência. Sempre julguei que aquele que é inocente deve permanecer onde está para aguardar com tranquilidade a investigação em todos os âmbitos", disse, no texto.

O maestro responsabilizou atuação do Ministério Público, a quem atribui pressão nos órgãos municipais por sua demissão.

PROMOTORIA

O promotor Arthur Lemos, responsável pelo caso, diz que "o MP investiga os fatos com muita cautela". Por nota, afirmou ainda que "sem perder o respeito com os investigados e seus direitos individuais, a investigação criminal vai a fundo para que todos os fatos sejam desmantelados".

Sobre as frequentes reclamações da defesa de Neschling de que o maestro não tenha sido ouvido ainda no inquérito, o promotor explica: "O advogado do maestro, há muito tempo, tem acesso aos autos do procedimento investigatório".

Segundo ele, Neschling "será inquirido no momento oportuno e terá a oportunidade de dar sua versão para os fatos sob apuração".

Por nota, a secretaria de comunicação da prefeitura reconheceu o valor do trabalho desenvolvido pelo maestro "ao longo dos últimos três anos" no Theatro.

O texto também reitera que o afastamento não se deu em razão de análise da Controladoria Geral do Município, "uma vez que as apurações sobre as ilegalidades praticadas ainda estão em curso". A agenda de apresentações do Municipal segue inalterada, segundo a assessoria de imprensa do IBGC.

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ENTENDA O CASO

NOV.2015
José Luiz Herencia, então diretor-geral da Fundação Theatro Municipal, pede exoneração do cargo. Em dezembro, após apreensões em seus imóveis, passa a responder inquérito no Ministério Público. A Controladoria Geral do Município identifica rombo milionário nas contas do Theatro, relacionadas a esquema de superfaturamento de óperas

FEV.2016
Herencia tem bens bloqueados na Justiça. A Promotoria faz nova apreensão no Instituto Brasileiro de Gestão Cultural, organização social responsável pelas contas do teatro. William Nacked, seu diretor, é afastado do cargo e Paulo Dallari assume a administração geral do Municipal como interventor

MAR.2016
Com acordo de delação premiada, Herencia envolve outros agentes do Theatro na investigação. Aponta conflitos de interesse em contratações que envolvem um agente internacional de John Neschling, diretor artístico

JUN.2016
Câmara abre CPI do Theatro Municipal. No mês seguinte, Carlus Padrissa, diretor do grupo Fura Dels Baus, atesta no Ministério Público que o agente de Neschling no exterior, Valentin Proczynski, cobrou valor maior do teatro do que aquele que deveria ser pago ao grupo. Relatório da Controladoria aponta que rombo nas contas do teatro são de R$ 15 milhões

AGO.2016
Justiça autoriza a quebra de sigilo dos e-mails do maestro John Neschling, pedida pelo Ministério Público do Estado. A comissão da Câmara dos Vereadores faria o mesmo pedido à Justiça, porém este foi cancelado antes da votação pelo relator da CPI, o vereador petista Alfredinho

A CPI sinalizou requerer à Justiça a condução coercitiva de Neschling a uma próxima sessão. Também houve a decisão de requerer à Polícia Federal o passaporte do maestro e a suspensão de pagamentos a ele pelo Instituto Brasileiro de Gestão Cultural

SET.2016
Na noite de quinta (1º), a Justiça determinou que a CPI do Theatro Municipal na Câmara dos Vereadores não pode requerer a apreensão do passaporte do maestro

Quase quatro anos após assumir a direção artística do Municipal, Neschling é afastado do cargo pelo Instituto Brasileiro de Gestão Cultural. O maestro deixou o teatro nesta segunda (5), antes de as investigações no MP serem concluídas. Ele alega inocência e, por nota, diz que tomará "providências legais" com seu advogado.


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