Folha de S. Paulo


'Minha obra é um livro e meio!', diz Raduan Nassar sobre Prêmio Camões

Moacyr Lopes Jr./Folhapress.
O escritor Raduan Nassar

Raduan Nassar estava em casa, nesta segunda-feira (30), quando recebeu uma ligação de Portugal com a notícia: foi ele o eleito pelo Prêmio Camões, principal troféu literário da língua portuguesa, que escolhe escritores pela obra completa.

O autor reagiu com modéstia e uma dose de auto-ironia. Questionado pela Folha, ao telefone, se gostaria de dar uma entrevista sobre o prêmio, Raduan se limitou a dizer: "Eu não entendi esse prêmio, minha obra é um livro e meio!" E riu.

Renato Lessa, presidente da Biblioteca Nacional, conta ter ouvido o mesmo quando ligou para dar os parabéns: "Mas uma obra tão minguada..."

"Respondi a ele: 'Não é o que corre por aí, Raduan...'", diz Lessa.

Em 28 edições, Raduan é o 12º brasileiro a vencer o Camões, que oferece um prêmio de cem mil euros (R$ 398 mil). O júri destacou "a extraordinária qualidade da sua linguagem" e a "força poética da sua prosa".

"Um livro e meio" é modo de Raduan dizer. Além dos clássicos, "Lavoura Arcaica" (1975) e "Um Copo de Cólera" (1975), ele tem o volume de contos "Menina a Caminho e Outros Textos" (1997).

Continua inédito em português o ensaio "A Corrente do Esforço Humano", publicado na Alemanha em 1987. Na mesma situação, está o conto "O Velho", que saiu em uma antologia francesa "Des Nouvelles du Brésil", em 1998.

TRADUÇÕES
O Camões chega em um ano de grande projeção para a obra de Raduan Nassar. O escritor paulista chegou à semifinal do Man Booker International Prize, com "Um Copo..." (Companhia das Letras), mas perdeu.

"Lavoura..." e "Um Copo..." foram traduzidos pela primeira vez para o inglês este ano, pela Penguin do Reino Unido. Além da língua inglesa, seus livros ganharam outras traduções. As últimas edições internacionais eram dos anos 1980, quando Raduan foi publicado na França, na Alemanha e na Espanha.

"O lançamento pela Penguin foi um grande empurrão, além do reconhecimento pela qualidade literária dos livros", diz Luiz Schwarcz, presidente da Companhia das Letras.

Não deixa de ser um bom sinal que, nos tempos em que novos autores se dedicam com afinco na divulgação de suas obras, um escritor recluso desde os anos 1980, consiga essa projeção. Raduan quase não dá entrevistas ou faz aparições públicas. Passou a dedicar-se à agricultura, mas doou sua fazenda à Universidade Federal de São Carlos.

A última aparição foi no dia 31 de março, quando o escritor falou contra o impeachment no Palácio da Planalto. Depois que a Câmara aprovou a abertura do processo de afastamento de Dilma Rousseff, Raduan publicou um texto em blogs de esquerda. Nele, acusava o Supremo Tribunal Federal de propiciar "por omissão, o golpe".


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