Folha de S. Paulo


Atriz e dramaturga inglesa interpreta Jesus transexual em monólogo

Rod Penn/Divulgação
A atriz e dramaturga transexual britânica Jo Clifford em cena da peça
A atriz e dramaturga transexual Jo Clifford na peça 'The Gospel According to Jesus, Queen of Heaven'

"God's New Frock" (algo como "a nova túnica de Deus"), peça de 2002 da inglesa Jo Clifford, foi um dos primeiros rascunhos daquilo que marcaria o trabalho da inglesa: a discussão da transexualidade.

À época, Jo ainda era John, mas desde a infância se sentia uma mulher. "God's" fala sobre crescer como um transexual e reprimir o sentimento.

"Escrevi a peça porque estava tentando me aceitar", diz à Folha a inglesa, no intervalo de oficinas que ministrou no British Council paulistano.

A montagem levou a "The Gospel According to Jesus, Queen of Heaven" (o evangelho segundo Jesus, rainha do céu), que a inglesa apresenta até segunda (23) no Festival Internacional de Teatro de Belo Horizonte.

Em "Gospel", Clifford recria a história de Jesus (vivido pela autora) como uma transexual. O monólogo estreou em Glasgow, em 2009, e causou rebuliço entre cristãos, que protestaram em frente à igreja onde a peça era encenada.

Rod Penn/Divulgação
A atriz e dramaturga transexual britânica Jo Clifford em cena da peça
A atriz e dramaturga transexual Jo Clifford na peça 'The Gospel According to Jesus, Queen of Heaven'

"Fiquei chocada", diz a dramaturga, segundo quem a peça não é uma crítica à igreja, mas um estudo da aceitação. "E isso inclui transexuais."

Clifford –ela mesma cristã e frequentadora da United Reformed Church– afirma que busca ali a essência de Jesus ("ele pregava o amor"). "Mas também desafio o preconceito das pessoas."

A peça foi traduzida para o português pela diretora Natalia Mallo, que trabalha com a atriz transexual Renata Carvalho numa versão brasileira, a estrear no segundo semestre.

No dia 30, Clifford ainda ministra uma palestra sobre diversidade no ciclo Mediações Acessíveis, em São Paulo.

TARDIO

Clifford, 66, já escreveu cerca de 80 peças, mas foi somente aos 30 que começou no teatro. Tentou escrever romances, sem sucesso. Deu aulas de ioga, foi motorista de ônibus e enfermeiro antes de conseguir reconhecimento nos palcos, com "Losing Venice" (1985).

Também foi tardiamente que assumiu seu gênero feminino. "Eu tentei por muitos anos ser um homem. Minha mulher [a feminista Sue Innes, com quem teve duas filhas] sabia que eu era transexual, mas dizia: 'Sinto muito, sou uma mulher heterossexual e gosto de você como homem'", conta Clifford.

Foi só após a morte de Innes, em 2006, de um câncer no cérebro, que a dramaturga tornou-se mulher. "Eu disse: 'Não dá mais para continuar'."

Hoje Clifford diz que se considera um "terceiro sexo" (toma hormônios, mas não fez cirurgia para mudar seus órgãos genitais). Suas filhas ainda a chamam de pai. Seu neto, 4, de avó. "E ambas [as definições] são verdadeiras."

THE GOSPEL ACCORDING TO JESUS, QUEEN OF HEAVEN
QUANDO dom. (22) e seg. (23), às 21h
ONDE Museu Mineiro, av. João Pinheiro, 342, BH, tel. (31) 3269-1109
QUANTO R$ 10; 16 anos

PALESTRA COM JO CLIFFORD
QUANDO 30/5, das 15h às 18h
ONDE Instituto Tomie Ohtake, r. Coropés, 88, tel. (11) 2245-1900
QUANTO grátis; inscrições via 11-2245-1937 ou setoreducativo@institutotomieohtake.org.br


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