Folha de S. Paulo


Manifestantes ocupam salões com obras de Portinari na sede da Funarte

Ricardo Borges/Folhapress
Rio de Janeiro, RJ,BRASIL, 16/05/2016; Artistas ocupam sala da FUNARTE com painel de Candido Portinari no Rio de Janeiro. Os manifestantes fazem ato contra a extinção do Ministerio da Cultura e ficarao por tempo indeterminado no predio. (Foto: Ricardo Borges/Folhapress. ) *** EXCLUSIVO FOLHA***
Artistas ocupam sala da Funarte com painel de Cândido Portinari, no Rio de Janeiro

O salão mais importante do Palácio Gustavo Capanema, prédio histórico no centro do Rio que abriga diversos painéis de Cândido Portinari, foi ocupado no início da tarde desta segunda-feira (16) por manifestantes contrários à extinção do Ministério da Cultura e por movimentos contrários ao governo do presidente interino Michel Temer (PMDB).

Manifestantes de movimentos como o Reage Artista e o Teatro pela Democracia, contrários ao processo impeachment da presidente Dilma Rousseff (PT) e seu consequente afastamento, ocupam o local "por tempo indeterminado".

A ação foi promovida por coletivos culturais e também por integrantes da Frente Brasil Popular e da CUT. O deputado federal Luiz Sérgio (PT-RJ) acompanhou o protesto, assim como o deputado estadual Marcelo Freixo (PSOL) e o vereador Jefferson Moura (Rede). O cineasta Ruy Guerra e o documentarista Silvio Tendler também estiveram presentes ao ato.

Um grupo de 50 pessoas promete passar a noite no chamado Salão Portinari, no segundo andar. Uma outra parte ocupou à tarde o mezanino onde foram realizadas assembleias e discursos. Na parte externa do prédio, sob o pilotis, será organizada uma agenda cultural com apresentações.

Além da oposição específica em relação a Temer, a pauta gira em torno do destino da cultura após o fim da pasta, responsável pela lei Rouanet, editais de fomento a produções culturais e o programa Pontos de Cultura, que apoia coletivos regionais pelo país.

"Estamos ocupando o Capanema, que é um prédio histórico, emblemático para a cultura do Rio, para dizer que não queremos o presidente Temer. Nós não reconhecemos a sua presidência. Estamos aqui para dizer que o MinC [Ministério da Cultura] é nosso", disse a atriz e produtora cultural Isabel Gomide, integrante do movimento Reage Artista e do Teatro pela Democracia.

"Queremos construir um espaço novo, mas sem diálogo com esse governo ilegítimo. Ao se extinguir o Ministério da Cultura, todos os projetos que estavam em andamento estão ameaçados."

O Palácio Capanema abriga as sedes da Funarte (Fundação Nacional das Artes) e da representação no Rio do Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional). O prédio, o primeiro de inspiração modernista do país, foi construído entre 1937 e 1945. Seu tombamento data de 1984.

Diante da entrada do prédio, a manifestação começou com o coro "Fora Temer". Às 11h, houve um abraço simbólico ao redor do edifício.

A atriz Débora Lamm, que integra o elenco do programa "Zorra Total" (Globo), esteve à tarde na ocupação. Ela disse estar representando principalmente a classe dos atores de teatro. Afirmou ainda que a extinção do ministério é um retrocesso e classificou o impeachment de Dilma como golpe.

"Estamos lutando pelos nossos direitos e dizendo não ao retrocesso. A partir do momento que você não dá atenção à cultura, acredito que não podemos nem considerar isso aqui um país. A cultura é muito importante para a formação do ser humano. Diminuir [o espaço das artes na sociedade] é algo inaceitável. A arte é muito importante, inclusive para esclarecer a população num momento como o que estamos vivendo", disse.

Luiz Sérgio afirmou que estava no local em solidariedade ao protesto e disse que parlamentares do PT apoiarão movimentos sociais contrários ao governo Temer em manifestações por todo o país.

"Extinguir o Ministério da Cultura é algo impensável, é colocar a cultura num degrau inferior. Do ponto de vista da economia, é muito pouco. Em todos os governos com viés autoritário, que não chegam ao poder através de voto popular, um dos primeiros atos é atacar a cultura. Porque a cultura sempre esteve na vanguarda da luta pela democracia."

PATRIMÔNIO

O Palácio Capanema abriga obras de arte de valor inestimável. Parte do piso do salão ocupado pelos manifestantes, no segundo andar do edifício, é coberto por um tapete criado pelo arquiteto Oscar Niemeyer, um dos projetistas do prédio. O tapete, que fica em frente à obra "Guerra e Paz", de Portinari, foi isolado com uma fita para evitar a circulação de pessoas sobre ele.

Os próprios manifestantes espalharam cartazes pedindo que ninguém fumasse ou comesse no local.

Neste momento, a fachada, os pilotis e quatro dos 16 andares passam por uma reforma iniciada há quase dois anos. O jardim de Burle Marx, no segundo andar, está interditado, mas o chamado Salão Portinari, onde estão os manifestantes, e a biblioteca continuam abertos ao público.

Procurado, o Iphan informou que "até o momento não houve nenhuma ameaça ao bem tombado" e afirmou, por meio de sua assessoria de imprensa, que os próprios ocupantes estão tomando cuidado com o patrimônio.

A Folha entrou em contato com a assessoria do extinto Ministério da Cultura, mas não obteve resposta até a publicação da reportagem.


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