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análise

'Universal', trajetória de Rogério Duarte prova sua multiplicidade

Luiz Carlos Murauskas/Folhapress
O designer Rogério Duarte, capista de discos da Tropicália e de cartazes do cinema novo
O designer Rogério Duarte, capista de discos da Tropicália e de cartazes do cinema novo

Um dos protagonistas da Tropicália e da contracultura brasileira, o designer baiano Rogério Duarte morreu aos 77 anos no Hospital Santa Lúcia, em Brasília, na noite desta quarta-feira, 13.

Em 2009, o artista foi diagnosticado com um câncer de garganta. Depois do primeiro ciclo do tratamento, publicou uma tradução do poema em sânscrito "Gitagovinda" (A Cantiga do Negro Amor), de Jayadeva, e realizou exposições de sua obra no Brasil e na Alemanha.

A canção "Gayana", de sua autoria, terminou gravada por Caetano Veloso no álbum "Abraçaço". Recém-lançado, o documentário "Rogério Duarte - O Tropikaoslista", do diretor baiano José Walter Lima, celebra os vários Rogérios, da aventura contracultural à conversão hare krishna. No último ano, voltou a adoecer e decidiu mudar-se de Salvador para Brasília.

"Sou uma pessoa muito polimórfica e universal", declarou Duarte em sua última entrevista, em dezembro de 2015. A trajetória do designer comprova a multiplicidade. O cartaz do filme "Deus e o Diabo na Terra do Sol", de Glauber Rocha, se estabeleceu como sua obra-prima. Por trás de todos, estava Rogério, sentenciou Glauber, que ainda confiou ao amigo uma parte da trilha musical de "A Idade da Terra".

Em diálogo com os parceiros tropicalistas, Duarte criou memoráveis capas dos discos de Caetano, Gilberto Gil e Gal Costa, nos anos 1960 e 70. Com Hélio Oiticica, organizou a exposição "Apocalipopótese". No grupo tropicalista, ficou célebre sua oposição ao empresário Guilherme Araújo, acusando-o de ser "pasteurizador" do movimento.

Torturado por militares, junto com o irmão Ronaldo, em abril de 1968, ele apontava esse episódio como um corte violento em sua vida criativa e afetiva. Até os anos 70, enfrentaria sucessivas internações psiquiátricas.

Definia-se como "eminência parda" de outros criadores: "Eu tinha uma autoestima muito baixa, devido à repressão familiar. Ao mesmo tempo, uma vaidade extrema. Meu negócio era o papo direto com as pessoas. Era a conspiração, o diálogo. Era na véspera chegar".

Segundo a família, o enterro será realizado em Santa Inês (BA), onde o tropicalista tinha uma fazenda. Para homenageá-lo, o filme "Rogério Duarte - O Tropikaoslista", que ainda não estreou no circuito comercial, será exibido no Espaço Itaú de Cinema Glauber Rocha, em Salvador, na próxima semana.


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