Folha de S. Paulo


Historiadora defende importância da cultura judaica na formação do Brasil

Há mais de 50 anos, a historiadora Anita Novinksy investiga como os cristãos-novos, familiares de judeus convertidos à força, foram perseguidos pela Inquisição no Brasil.

É uma população que buscou asilo na colônia e, segundo fontes da época, corresponde a 75% da população livre brasileira no séc. 17. Entre eles, há nomes como Raposo Tavares e Fernão Dias.

Novinsky foi a primeira a se debruçar sobre os arquivos da Inquisição portuguesa, abertos ao público na década de 1960, após 500 anos de sigilo. Antes, era impossível calcular a relevância da cultura judaica na formação do Brasil.

Karime Xavier/Folhapress
SÃO PAULO / SÃO PAULO / BRASIL - 22/03/16 -16 :00h - RETRATO DE ANITA NOVINSKY. ( Foto: Karime Xavier / Folhapress). ***EXCLUSIVO***ILUSTRADA
A historiadora Anita Novinsky, no seu apartamento em São Paulo

A historiadora se orgulha de ter aberto uma fonte inédita na história do Brasil —e de ter a melhor receita de bolachinha judaica de São Paulo, degustada e aprovada pela Folha. Ela não revela a idade, mas sabe-se que se formou em filosofia na USP em 1956.

Sua pesquisa revela que a maioria dos bandeirantes tinha origens judaicas. "O ódio dos bandeirantes pelos jesuítas tinha razões ideológicas, não só econômicas", frisa Daniela Levy, colega de pesquisa de Novinsky na USP.

Os convertidos viveram um cenário de terror sobre o qual pouco ou nada era conhecido até agora. Eram queimados vivos em festas em praças, aos domingos. As famílias, quando não eram executadas, sofriam penas humilhantes, forçadas a viver marcadas pelo resto da vida.

A perseguição começou em 1492, quando, em Portugal, os judeus tiveram que se converter ou sair do país.

A ideia era integrá-los à burocracia do Estado, que carecia de mão-de-obra qualificada. Para isso, eles precisavam se tornar cristãos. "Os cristãos-novos eram todos alfabetizados e sempre arranjavam emprego, apesar de ser proibido", comenta Novinsky.

Para a historiadora, o catolicismo não "pegou" no Brasil —em comparação com a Península Ibérica— devido à grande parcela de descendentes de judeus na população. Os cristãos-novos não aderiam à liturgia católica, se entediavam na missa.

"Eram homens divididos. Não eram judeus, porque não sabiam o que era isso, já que não tinha livro, sinagoga, ensinamento. Mas também não queriam ser cristãos", afirma.

Nesse cenário, o que sobraram são ritos e identidades fragmentadas. "Vi brasileiros no Nordeste praticando o judaísmo sem saber, e outros que dizem que são judeus mas não sabem o que isso significa", diz a historiadora.

O assunto é tema de prolífica produção acadêmica de Novinsky e seus orientandos. Agora, ganhou também uma versão para leigos, publicada pela editora Planeta.

OS JUDEUS QUE CONSTRUÍRAM O BRASIL
AUTORAS: Anita Novinsky, Eneida Ribeiro, Lina Gorenstein
EDITORA: Planeta
QUANTO: R$39,90


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