Folha de S. Paulo


Espetáculos físicos substituem dramas no Festival de Teatro de Curitiba

É perceptível. A mudança de curadoria do Festival de Curitiba provocou um desvio nesta que é a mostra de teatro mais numerosa do país.

Assinada por Guilherme Weber e Marcio Abreu, a 25ª edição quebrou balizas das grades anteriores.

Esta edição tem sido pontuada por espetáculos de expressões mais físicas e visuais. São trabalhos que, distantes do drama, estimulam o contato entre ator e plateia, sem a formalidade das poltronas e do palco italiano.

Peças como "Batucada", "Confete da Índia" e "La Bête" deram lugar central a coreografias, música e questões sobre o corpo. Narrativas e diálogos foram colocados em segundo plano, senão empurrados de vez para escanteio.

Na quarta (23) e na quinta, "Batucada", de Marcelo Evelin, ocupou um salão sem cadeiras, e o público dividia espaço com dezenas de artistas mascarados. Há na peça um corpo a corpo de Carnaval.

Lenise Pinheiro/Folhapress
Curitiba, Paraná, Brasil. Data 23-03-2016. Espetáculo Batucada.Direção Marcelo Evelin. Performance com cidadãos artistas selecionados via convocatória pública. Espaço Cult. Fotos Lenise Pinheiro/Folhapress
"Batucada", performance com cidadãos artistas selecionados via convocatória pública

Os intérpretes se aproximam, tocam o espectador, encaram-no com agressividade. Depois, batem lata, produzindo uma massa sonora que ganha ritmo. Numerosos, movem-se em bandos. Depois se dispersam, num ensaio que lembra a fúria dos arrastões.

O público dança, uiva e fica zanzando para fugir do coro de homens e mulheres nus.

Da mesma forma que "Batucada", a peça "La Bête" (o bicho), de Wagner Schwartz, mostra uma criação absolutamente dependente da participação do público.

Sobre um tablado quadrangular, Schwartz se move nu, lentamente, até parar ao lado da cópia de um objeto de Lygia Clark. A peça é igual às outras da série "Bichos", tem figuras geométricas articuladas e é manipulável.

O intérprete diz: "quem quiser pode mexer na pequena escultura". E ele próprio está ali à disposição, para nos servir de brinquedinho.

Um espectador toma a iniciativa, vai até ele e dobra-lhe uma perna. Um outro se levanta e entra em cena para arrastá-lo. Onde cai, o ator fica, na posição proposta pelo manipulador.

A reportagem também testou o bichinho.

Não precisa de muita força, com um toque leve ele se molda, toma novas posições.

Por fim, "O Confete da Índia", de André Masseno, também surpreendeu o público com coreografia, gritos e grunhidos, mas sem palavras.

Cercado pelo público, Masseno usa salto alto e vestido vermelho para assumir a fúria libidinosa de uma figura que em nada fica devendo à cafonice de quem usa brincos iguais ao colar.

Ele entra em cena com um saco na cabeça, dançando músicas brasileiras que marcaram a contracultura dos anos 1970. Aos poucos, a coreografia se redimensiona em ações escatológicas e representações sobre o desbunde. O ator tira a calcinha, usa a lingerie para coar um café. Bebe cidra até urinar e depois desliza o corpo pelo piso molhado com o próprio xixi.

O público aplaudiu.


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