Folha de S. Paulo


Mostra de Tomie Ohtake em NY é início de reconhecimento mundial

Numa galeria do Chelsea, o epicentro do mercado da arte em Nova York, Tomie Ohtake tem agora uma grande retrospectiva de sua obra, com trabalhos que vão desde uma de suas famosas pinturas cegas, que fez com uma venda nos olhos em 1960, às telas que realizou nos últimos anos.

Esse é um retorno póstumo da artista à arena internacional. Tomie, morta aos 101, no ano passado, chegou a fazer exposições em Washington, Nova York e Miami nas décadas de 1960 e 1970, mas nunca teve grande visibilidade fora do Brasil, uma ausência que a família da artista agora se esforça para combater.

Ricardo Ohtake, filho de Tomie, conta que obras da mãe vêm sendo requisitadas para mostras no mundo todo. Desde que ela teve uma sala dedicada a ela no ano passado na feira Frieze Masters, em Londres, e alguns de seus quadros numa mostra no centro cultural Parasite, em Hong Kong, o mundo parece querer saber quem foi essa japonesa que passou a vida no Brasil.

Esse lugar intermediário ocupado pela artista, entre o expressionismo abstrato de pintores orientais e o concretismo em voga em São Paulo, é talvez o dado mais magnético de sua biografia, que agora intriga a crítica e agentes do mercado internacional.

"Quando vi o trabalho dela pela primeira vez, aquilo fisgou meu olho", diz Tina Kim, galerista que agora mostra obras de Tomie em seu espaço no Chelsea. "Ela foi diferente porque não estava só pintando com os artistas japoneses. Ela tinha um estilo oriental, mas sempre esteve interessada em cores sofisticadas e na natureza das curvas."

Essa leitura de Kim, aliás, passa por um filtro coreano. Filha de Lee Hyun-sook, fundadora da Kukje, uma das galerias mais influentes de Seul, a marchande de Nova York viu no trabalho de Tomie semelhanças com o estilo dansaekhwa, uma espécie de minimalismo coreano, marcado por telas monocromáticas.

Kim, que acaba de vender uma obra dessa escola para o MoMA, em Nova York, lembra que artistas da vanguarda chegaram a participar da Bienal de São Paulo, onde podem ter sido vistos por Tomie. A curiosidade da crítica mundial por esse movimento, na opinião da galerista, também parece turbinar o interesse em torno de Tomie.

"Esses artistas hoje estão sendo reinventados à luz do minimalismo e do expressionismo abstrato", observa Kim. "Estão sendo redescobertos."

Na abertura da mostra na galeria Tina Kim, aliás, estavam diretores do MoMA, da Americas Society e do Museu do Brooklyn. Retrospectivas da artista também estão sendo planejadas agora pela Triennale, em Milão, e pelo Museu de Arte Contemporânea de Tóquio. Enquanto isso, uma de suas telas acaba de entrar para o acervo da Tate Modern, em Londres.

Nara Roesler, brasileira que abriu neste mês uma filial de sua galeria em Nova York, também levou obras de Tomie para seu espaço a poucas quadras do Chelsea, num esforço concentrado para emplacar mais trabalhos da artista em coleções americanas.

"Esses quadros aqui a gente só viu no escurinho do cinema, ainda no ateliê da Tomie", dizia Nara, no vernissage da mostra na Tina Kim, na semana passada. "Nessa luz, eles ficam espetaculares."

Espetaculares ou não, poucas obras da artista continuam nas mãos dos herdeiros. Mesmo vendidas por até R$ 1 milhão, telas de Tomie, cada vez mais cobiçadas, só deverão ser ofertadas a museus ou "colecionadores muito importantes", nas palavras de seu filho.

Interessados não faltam. A julgar pela lista de convidados de um disputado jantar organizado por Tina Kim em homenagem a Tomie, suas obras deverão estar em boas mãos.


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