Folha de S. Paulo


Pesquisador encontra poema de Cecilia Meireles sobre mulheres de Portugal

Há quase 85 anos, no dia 31 de outubro de 1931, a jovem poeta Cecilia Meireles (que, à época, assinava como Meirelles) publicou, na revista "Lusitania", o poema "Rimance das Donas de Portugal".

O texto, em que ela exalta as mulheres portuguesas, famosas (como D. Joana ou Madalena de Vilhena) e anônimas, ficou esquecido até recentemente, quando foi garimpado pelo pesquisador da Unesp (Universidade Estadual Paulista 'Júlio de Mesquita Filho') Ulisses Infante, como informado nesta terça (8) pelo jornal "O Estado de S.Paulo".

"Eu fazia uma pesquisa na hemeroteca digital da Biblioteca Nacional sobre a relação da Cecilia com Portugal e encontrei esse poema numa revista de nicho", afirma ele à Folha. "Tive a sensação de que nunca tinha lido ele antes e, realmente, não foi publicado em nenhum outro lugar além da própria revista."

A "Lusitania" era editada no Brasil por imigrantes portugueses.

Acervo UH/Folhapress
A escritora Cecilia Meireles, autora de
A escritora Cecilia Meireles, autora de "'Romanceiro da Inconfidência'" e "'Retrato Natural"'

Para ele, "Rimance" não é um texto de grande impacto no conjunto da obra de Cecilia, sendo uma obra de transição. "Nele, ela está num momento em que parece estar repensando os parâmetros", diz Infante.

O achado, entretanto, joga luz, segundo o pesquisador, num aspecto pouco explorado da escritora, por ser seu primeiro poema narrativo —"é a primeira vez que ela usa 'rimance' para falar de um poema, o que diz muita coisa, pensando que ela publicaria em 1953 o 'Romanceiro da Inconfidência'", diz. Este livro é considerado uma das principais, senão a principal obra da poeta modernista, e brinca com o gênero do romance transmutado em poesia.

"Rimance" é também um "poema de circunstância", ou seja, um texto encomendado para a autora. No caso, por uma associação de imigrantes portugueses do Rio, para um evento beneficente que visava arrecadar fundos para os expatriados desempregados.

Segundo Infante, esse tipo de poema mostra a aproximação de Cecilia, tida muitas vezes como uma poeta mais ligada ao passado, que "dialoga com os mortos", à sociabilidade da poesia. "Para ela, isso é uma aproximação entre erudito e popular, ela gosta de ler poesia em público, por exemplo."

Ainda que a temática do poema fosse feminina, o pesquisador diz que a carioca descendente de açoriana não se identificaria como feminista. "Ela teve inclusive brigas com feministas na época", diz. Apesar disso, define Cecilia como defensora dos direitos das mulheres. "Mas ela gostava de ser independente, vivia reafirmando essa independência de escolas, por isso hesito em dizer que pertencia ao feminismo."


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