Folha de S. Paulo


crítica

'O Abraço da Serpente' poderia ser bom, mas diretor o torna artificial

assista ao trailer

O premiado terceiro longa de Ciro Guerra, "O Abraço da Serpente", tem sido anunciado como um marco para o cinema colombiano devido ao seu grande sucesso, além da indicação ao Oscar de melhor filme estrangeiro.

As duas coisas só ocorreram, provavelmente, porque o filme foi muito bem recebido em Cannes, em 2015, do qual saiu com o prêmio da Quinzena dos Realizadores, vitrine para o cinema dito autoral.

Já sabemos que, hoje em dia, premiações de espécie alguma tem a ver com qualidade, e talvez seja o caso de também nos perguntarmos o que a plateia que o ovacionou em Cannes viu de fato.

Porque este filme sobre uma história passada no século 20, entre brancos e um índio, na Amazônia colombiana, não tem nada de especial.

A história fala do índio Karamakate, único sobrevivente de sua tribo, e de seu envolvimento, num intervalo de 40 anos, com dois cientistas que buscam uma planta medicinal da região, muito rara.

Efe
Cena do filme 'O Abraço da Serpente
Cena do filme 'O Abraço da Serpente'

O primeiro deles é Theo (Jan Bijvoet), baseado no cientista alemão Theodor Koch-Grunberg (1872-1924). O segundo é Evan (Brionne Davis), o americano Richard Evans Schultes (1915-2001).

Ambos escreveram diários que serviram de base para o roteiro ficcional do próprio Ciro Guerra, com o auxílio de Jacques Toulemonde Vidal.

O jovem Karamakate (Nilbio Torres), inicialmente desconfiado, passa aos poucos a ajudar Theo, mesmo notando que o cientista nem sempre é cordial com os índios de outras tribos da região.

O velho Karamakate (Antonio Bolivar) é naturalmente mais sábio e menos desconfiado. Ele ajuda Evan a refazer a seu modo o caminho percorrido por seu antecessor.

Quem não ajuda muito é o próprio Guerra. Em vez de fazer um interessante mergulho na cultura indígena e na natureza da Amazônia, prefere imprimir artificialismo.

'EU SOU ARTISTA'

Por que filmar em preto e branco? A fotografia grita "eu sou artista" o tempo todo, como num filme de Lav Diaz ou Raya Martin. De que modo isso contribui ao drama que está sendo narrado?

Um outro aspecto é a falta de ritmo em alguns momentos de seus longos 125 minutos. Isso provoca buracos nos quais o sono é quase irresistível.

A se ressaltar o trabalho dos atores. Bijvoet é o protagonista do elogiado "Borgman" (2013), inédito no Brasil. Torres e Bolivar são amadores e têm seus primeiros papéis no cinema. Essa escolha provoca um contraste com a artificialidade reinante.

O ABRAÇO DA SERPENTE
(El Abrazo de la Serpiente)
DIREÇÃO: Ciro Guerra
ELENCO: Nilbio Torres, Antonio Bolivar, Jan Bijvoet, Brionne Davis
PRODUÇÃO: Colômbia/Venezuela/Argentina, 2015, 10 anos
QUANDO: estreia nesta quinta (25)


Endereço da página:

Links no texto: