Folha de S. Paulo


Premiado na França, quadrinista brasileiro disseca desejos em nova HQ

Premiado no sábado (30) em um prestigioso festival europeu de quadrinhos, o artista brasileiro Marcello Quintanilha, 44, não é otimista em relação a nada. Nem pessimista. Quintanilha é realista. "Tento enxergar as coisas como elas são", diz à Folha.

O realismo é um dos traços de seu discurso –e um dos seu charmes, pelos quais recebeu o troféu de melhor história policial no 43º Festival Internacional de Quadrinhos de Angoulême, na França.

O prêmio foi entregue devido a seu trabalho no gibi "Tungstênio", ambientado em Salvador e publicado no Brasil pela editora Veneta.

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Quadrinhos de Marcello Quintanilha Foto: Divulgacao ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
Trecho de 'Hinário Nacional', nova HQ de Marcello Quintanilha

A obra de Quintanilha é marcada pelos temas populares e pela linguagem coloquial. São dois elementos que estarão presentes em sua próxima HQ, "Hinário Nacional", a que a reportagem teve acesso exclusivo. Esse gibi deve ser publicado no mês de março.

"Meu trabalho vem do que conheci no Brasil. São as coisas que mais têm relação comigo", diz o artista, que hoje mora em Barcelona. Há 14 anos longe de seu país, Quintanilha refuta a ideia de que desenhe esses temas por nostalgia. "O conceito de nostalgia envolve distância, e não me sinto distante do Brasil."

"Hinário Nacional" é uma coletânea de histórias curtas que, diz o autor, representam aspirações e desejos humanos. O realismo é um dos traços do gibi. "Minha intenção é sempre trabalhar o ser humano da forma mais real possível", conta Quintanilha.

COLOQUIALISMO

Inclusive na linguagem. Um personagem diz em um determinado trecho, por exemplo, "a gente tínhamos".

"O coloquialismo revela muito da realidade, do naturalismo. Sempre fui fascinado por escritores capazes de transcrever a oralidade nas obras, e meu trabalho é muito real nesse sentido", diz.

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Quadrinhos de Marcello Quintanilha Foto: Divulgacao ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
Trecho de 'Hinário Nacional', nova HQ de Marcello Quintanilha

O que se torna um desafio na hora da tradução, como na de "Tungstênio" ao francês. "Não se pode traduzir um trabalho assim. Eu reescrevi. Pude trabalhar com os tradutores, trocamos ideias."

Quintanilha inclui a realidade também no seu estilo de desenho, marcado em "Hinário Nacional" pelo uso da retícula –técnica de finalização que cria texturas, por exemplo, com pontilhado. Com isso, afirma, "reivindica" o processo de impressão.

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A técnica era comum nos quadrinhos antes dos processos digitais de desenho e impressão. "A retícula sempre teve essa característica limitante, em um papel de baixa qualidade. Isso gerou uma maneira de entender o trabalho impresso que eu valorizo."

"Hinário Nacional" também é marcado pelo formato narrativo. Gibis em geral são desenhados em quadros dentro de uma grade mais ou menos regular, muitas vezes com um quadro ao lado do outro.

Já no quadrinho de Quintanilha, há páginas com uma só ilustração. Em outros trechos, as sequências de ação não são separadas por linhas, mas se fundem umas às outras.

"Essa opção vem da minha convicção em relação à linguagem", explica. "Eu trabalho o quadro como unidade narrativa, e não a página."

HINÁRIO NACIONAL
AUTOR Marcello Quintanilha
EDITORA Veneta
QUANTO R$ 49,90 (136 págs.)


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