Folha de S. Paulo


Fechado há 3 anos para reparo, Museu do Ipiranga ainda não iniciou reforma

Muito pouco mudou desde que o Museu do Ipiranga foi fechado às pressas há dois anos e meio depois de um alerta de que os forros do teto poderiam desabar. Esse mesmo estudo também apontava que a fachada do prédio estava tombando e afundando e que toda a sua estrutura estava abalada.

Desde sua interdição, não há, ainda, um orçamento definido nem planos concretos para a recuperação do prédio. Nesse meio tempo, a Universidade de São Paulo, responsável pelo museu, alugou imóveis nos arredores para abrigar peças do acervo que precisam ser removidas para a reforma sair do papel.

Mas, além de essas casas não comportarem todo o acervo, algumas obras nem podem sair do museu, caso de "Independência ou Morte", tela emblemática de Pedro Américo pintada em 1888, que está chumbada à parede.

Enquanto isso, em marcha lenta, tudo que poderia sair foi sendo embrulhado. Essas obras-fantasma ficarão longe do público até pelo menos 2022, quando a USP quer reabrir o espaço como parte das comemorações do bicentenário da independência do país.

Isso se o prazo for mantido, já que uma estimativa inicial de que as obras custariam R$ 21 milhões agora já bate os R$ 100 milhões —a única intervenção física dentro do prédio até o momento foi o escoramento de partes do teto para que equipes do museu possam trabalhar sem correr riscos.

Sheila Ornstein, diretora do Museu do Ipiranga, associa o atraso na reforma a uma revisão para baixo no volume de verbas destinadas às obras por causa da crise econômica. Há quatro dias, a USP abriu a licitação para determinar o que, de fato, precisa ser feito no interior do prédio.

De acordo com o vice-reitor, Vahan Agopyan, a universidade "está gastando sem parar" com o museu, embora ele não saiba dizer quanto foi investido até o momento —procurada, a assessoria da USP também não informou o valor até a conclusão desta edição.

"Qualquer coisa pode ser motivo de atraso. Estamos correndo contra o tempo", diz Agopyan, acrescentando que a universidade busca driblar a burocracia das licitações recorrendo a doações de entidades privadas para bancar a reforma. "Nosso caminho crítico é retirar o que está no prédio."

É nesse ponto que a Pinacoteca do Estado entra na jogada. Enquanto o Museu do Ipiranga não é reaberto, a instituição da Luz exibe agora alguns clássicos esquecidos que estavam trancados no museu.
Quadros de Henrique Bernardelli, que retratam em chave triunfal os feitos dos bandeirantes, voltam a ver a luz do dia, só que meio acanhados.

Isso porque deixaram a escadaria monumental projetada pelo italiano Tommaso Bezzi para o museu e ganharam uma salinha na Pinacoteca. O mesmo aconteceu com as ânforas com água dos rios do país, que saíram do salão nobre do Ipiranga e ressurgem amontoadas num pódio.

Dizem os restauradores que a água desses vasos era trocada de tempos em tempos, trazida do Amazonas, do Paraná e de outros rios por pilotos da Varig com certo tempo livre. Mas desde que a empresa aérea deixou de funcionar, até isso acabou virando uma espécie de relíquia.

Não estranha o fato de as peças do Ipiranga irem parar na Pinacoteca —a instituição fundada em 1905 na Luz surgiu com uma primeira doação de 20 peças que ficavam no museu histórico, entre elas "Caipira Picando Fumo", obra de Almeida Júnior realizada em 1893, dois anos antes da fundação do Museu do Ipiranga.

Embora o diálogo entre as coleções não seja forçado, a transposição de um acervo trancafiado para as salas de outro que se consolidou como um dos principais espaços culturais da cidade acaba revelando um jogo sinistro de descaso, lentidão e falta de preparo do poder público em lidar com acervos de importância histórica —o Ipiranga tem mais de 170 mil peças.

Além da falta de recursos, mais um impasse abala o futuro do museu. A instituição precisa eleger um novo diretor em breve, já que Sheila Ornstein, atual titular, chega ao fim de seu mandato.

De acordo com as regras da USP, pelo menos dois candidatos precisam disputar o pleito, mas só um parece estar disposto a encarar o desafio de administrar um gigante adormecido. A professora de história Solange Lima, de acordo com pessoas próximas às negociações, é a única candidata que demonstrou interesse pelo cargo, mas, sem um oponente, sua eleição fica travada.

Enquanto isso, a Pinacoteca vem intensificando seus esforços para retirar do Ipiranga as telas em grande formato, algumas delas já emprestadas, como "Inundação da Várzea do Carmo" e "Fundação de São Vicente", ambos quadros de Benedito Calixto.

COLEÇÕES EM DIÁLOGO
QUANDO de qua. a seg., das 10h às 17h30; até 29/1/2017
ONDE Pinacoteca, pça. da Luz, 2, tel. (11) 3324-1000
QUANTO R$ 6


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