Marília Pêra passou as últimas semanas de vida fazendo algo que lhe era familiar: construindo para o palco o retrato de uma mulher célebre, desta vez, como diretora.
Depois de viver personagens como Carmen Miranda, Coco Chanel e Maria Callas, em seus últimos meses era a atriz Marilyn Monroe (1926-62) o objeto de seu interesse.
Quando morreu, aos 72, em dezembro, Marília finalizava a peça "Depois do Amor", que retrata um momento na vida de Marilyn, um dos maiores símbolos sexuais e de fragilidade psicológica do cinema americano. A peça está em cartaz no Rio, sem previsão de estreia em São Paulo.
Já debilitada pelo câncer, Marília dirigiu o espetáculo da sala de sua casa, onde aconteceram os ensaios.
Guga Melgar | ||
Maria Eduarda de Carvalho como Margot Taylor e Danielle Winits no papel de Marilyn Monroe |
"Ela sabia que não poderia ser a diretora ativa que fora em outras peças, mas queria muito dirigir. E nós a queríamos de qualquer jeito. Decidimos ensaiar como desse. Foi uma troca", afirma o autor, Fernando Duarte, que também escreveu "Callas" (2014), dirigido por Marília.
E assim foi por pouco mais de um mês. Nos últimos cinco dias de ensaio, Marília entregou a direção a Fernando Philbert. Não chegou a ver o cenário. A peça estreou em Manaus no dia em que ela morreu, 5 de dezembro.
'MULHER COMUM'
"Ela dizia: 'De manhã, penso no médico, à noite, não durmo por não conseguir respirar. O momento do ensaio é minha grande alegria'", relata Duarte.
Sentada na poltrona da sala de sua casa em Ipanema, na zona sul do Rio, Marília dava instruções a Danielle Winits, que interpreta Marilyn.
"'Desconstrua o mito da sex symbol, me mostre uma mulher comum.' Ela dizia isso todos os dias", conta Winits.
Guga Melgar | ||
Maria Eduarda de Carvalho como Margot Taylor e Danielle Winits em cena de 'Depois do Amor' |
A peça, um drama com momentos de comédia, relata o encontro de Marilyn com uma velha amiga, Margot Taylor (papel de Maria Eduarda de Carvalho), após as duas terem passado dez anos sem se ver.
A conversa, que aconteceu de verdade, ocorreu semanas antes da morte da atriz e dias depois da famosa performance de "Happy Birthday, Mr. President" que Marilyn fez no aniversário do então presidente dos Estados Unidos, John F. Kennedy (1917-1963).
Taylor era noiva do jogador de beisebol Joe DiMaggio (1914-99) quando Marilyn o conheceu. Meses depois, DiMaggio e Marilyn estavam casados.
Segundo o autor, não há registros detalhados do que as duas falaram. Na versão imaginada por Duarte, a conversa se torna uma grande lavagem de roupa suja que acaba virando uma troca de experiências de duas mulheres que seguiram caminhos opostos.