Folha de S. Paulo


'Spotlight' exibe bastidor de jornal que revelou como igreja escondia pedofilia

Spotlight

Um "pecado jornalístico" é deixar a verdadeira notícia escapar por entre os dedos.

Na Boston do começo dos anos 2000, a notícia de verdade não era informar sobre mais um caso de abuso sexual cometido por um padre pedófilo, mas revelar por que, após 34 anos e 130 relatos de estupro, ele continuava impune.

A questão assola a equipe de jornalistas retratados em "Spotlight - Segredos Revelados", recém-eleito o melhor filme do ano pela associação de críticos dos EUA e que estreia nesta quinta (7) no Brasil com grandes chances de se destacar no Oscar.

"Spotlight" é inspirado no furo jornalístico dado pelo diário "The Boston Globe", que revelou como a cúpula local da Igreja Católica acobertou dezenas de padres acusados de molestar crianças e adolescentes –a cobertura rendeu um prêmio Pulitzer em 2003.

"É a história de um abuso físico e espiritual: de crianças que se sentiram abandonadas por não terem a quem recorrer", disse o diretor Tom McCarthy logo depois da exibição do longa, que fez sua estreia mundial em setembro, durante o Festival de Veneza.

O filme mostra como a Igreja Católica estava imiscuída nos círculos de poder da cidade americana, onde era mais forte do que a média graças à comunidade irlandesa.

"A polícia, a política, as famílias importantes: todos tinham algum rabo preso com a igreja na cidade", afirmou o ator Mark Ruffalo, que interpreta um dos repórteres que trabalharam nesse caso.

Mais do que expurgar o drama das vítimas desses padres, o filme quer levar o jornalismo ao confessionário.

Michael Keaton faz o papel do chefe da equipe Spotlight, espécie de destacamento do jornal devotado a reportagens de fôlego. Além de Ruffalo, Rachel McAdams e Brian d'Arcy James compõem a equipe de jornalistas. Liev Schreiber faz o editor-executivo, um novato no "Boston Globe".

Nem abutres nem super-heróis –polaridade que não raro é o retrato da profissão no cinema–, os repórteres do filme enfrentam as agruras mundanas da apuração: as fontes desconfiadas, a concorrência com outros veículos, a checagem de dados e os egos e rivalidades internos.

Com o novo filme, McCarthy de alguma forma se redime após a direção de "Trocando os Pés" (2014), outra comédia com Adam Sandler malhada pela crítica. Em Veneza, "Spotlight" roubou os holofotes mesmo fora da competição do festival.

"Sou pessimista quanto aos rumos da igreja, não espero reações dela. Mas adoraria que o papa assistisse", disse o diretor, de formação católica.

Bem, o papa ainda não se pronunciou sobre "Spotlight", mas Luca Pellegrini, comentarista de cultura pop na rádio do Vaticano, o chamou de "honesto" e "persuasivo".

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PRIMEIRA PÁGINA Como o cinema retrata o jornalismo

Divulgação
Cena do filme
Cena do filme "Todos os Homens do Presidente", de 1976

"Todos os Homens do Presidente" (1976)

O maior clássico do gênero esmiuça o caso Watergate, revelado por Bob Woodward e Carl Bernstein, que culminou na renúncia do presidente Nixon

"Nos Bastidores da Notícia" (1987)

Uma produtora de TV insufla a rivalidade entre dois repórteres que têm estilos opostos: um é mais charmoso e o outro, mais competente

"A Montanha dos Sete Abutres" (1951)

Um jornalista se aproveita do caso de um homem preso numa caverna para voltar aos holofotes e criar um circo sensacionalista em torno dele

Divulgação
Jake Gyllenhaal (direita) em cena do filme
Jake Gyllenhaal (direita) em cena do filme "O Abutre"

"O Abutre" (2014)
Um jovem carreirista decide levar a vida correndo atrás de crimes e cedendo as imagens para telejornais sensacionalistas, mas começa a deixar de ser mero observador

"Boa Noite e Boa Sorte" (2005)

Um âncora de telejornal desafia o senador Joseph McCarthy, que na Guerra Fria chefiou uma 'caça' a simpatizantes do comunismo


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