Folha de S. Paulo


Ex-presidiário fecha trilogia literária sobre seus anos de cárcere

"O ônibus finalmente partiu", narra Luiz Alberto Mendes uma de suas saídas da prisão, quando vivia em regime semiaberto e podia voltar para casa aos feriados.

Seu estilo seco, feito de frases diretas e sinceras, já é conhecido. Preso durante 31 anos e dez meses, ele encerra com "Confissões de um Homem Livre" a trilogia sobre seus anos de cárcere.

Nesta última obra, narra os anos finais, quando se dividia entre a prisão e a família recém-feita, e pôs tudo a perder em um assalto malsucedido, adiando seu retorno à sociedade.

O livro é publicado exatos dez anos após o anterior, "Às Cegas" e 14 anos após "Memórias de um Sobrevivente", que chegou às lojas quando Mendes ainda estava na cadeia. Nesse meio tempo, lançou por outras editoras um volume de contos e um de poesias.

Danilo Verpa/Folhapress
SAO PAULO - SP- 17.12.2015 - Retrato do escritor Luiz Alberto Mendes, em sua residencia. (Foto: Danilo Verpa/Folhapres, ILUSTRADA)
Retrato do escritor Luiz Alberto Mendes, em sua residência

Não se considera, porém, poeta ("traço umas linhas em cima das outras, de cunho existencial, nada romântico"), tampouco escritor ("sou uma pessoa que escreve, e só"), apesar de seus cinco livros publicados e do fato de que vive de suas palavras.

Desde que foi solto, há 11 anos, nunca conseguiu um emprego fixo, mas mantém uma coluna na revista "Trip" e outra na "Revestrés", do Piauí. Também faz palestras pelo país. "Livro não dá dinheiro no Brasil."

Seu maior orgulho não é ter sido o primeiro presidiário a ingressar na faculdade (direito, na PUC de São Paulo), mas educar presidiários. Hoje, participa de projetos de conscientização em centros de recuperação.

"Tentamos empoderar os caras. Eu queria voltar [para a prisão] e mostrar que o que falta lá é educação, cultura. A sociedade manda os caras pra cadeia, depois enterra em pé e abandona."

MEMÓRIA

Mendes mal sabia escrever quando foi detido pela primeira vez, aos 19 anos, acusado de assalto e homicídio. Passou pela então Febem e, posteriormente, por diversas casas de detenção.

Descobriu a literatura numa cela forte. Outro preso contou-lhe, pelo encanamento da privada que ligava as duas celas, a história de "Os Miseráveis", de Victor Hugo.

"Ele me contou por capítulos, como novela, porque não dava para falar tudo de uma vez. Quando fui ler, achei desinteressante perto do que ele contava."

Tenta, há algum tempo, distanciar-se da literatura de prisão, mas sua vida continua a ser a maior inspiração. Planeja um livro sobre os anos de liberdade.

"Você nem imagina o que já me aconteceu. O que eu já fiz. Seria um livro bastante interessante, talvez mais do que os sobre a cadeia."

Confissões De Um Homem Livre
Luiz Alberto Mendes
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Não por menos, sua memória não falha. Nas mais de 400 páginas em que escreve sua vida, impressiona pelos detalhes dos fatos e sensações.

Como em seu estilo literário, também pede que a jornalista faça perguntas diretas. Como lembra de tudo isso? "Coloque-se no meu lugar. Você esqueceria?"

CONFISSÕES DE UM HOMEM LIVRE
AUTOR Luiz Alberto Mendes
EDITORA Companhia das Letras
QUANTO R$ 54,90 (432 págs.)


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