Folha de S. Paulo


Silvio Tendler dirige série sobre 'Poema Sujo', de Ferreira Gullar

Ferreira Gullar merece o Nobel de Literatura, crava o cineasta Silvio Tendler. Enquanto a láurea não vem, ele mesmo presta a sua homenagem ao poeta e colunista na Folha: estreia, no sábado (5), uma série documental inspirada na mais célebre obra do escritor, o "Poema Sujo", publicado em 1976.

Dividida em sete capítulos, "Há Muitas Noites na Noite", vai ao ar pelo canal TV Brasil e é parte de uma trilogia concebida por Tendler para homenagear o poeta e vizinho em Copacabana, no Rio.

A primeira delas foi uma video-instalação feita no Oi Futuro em Ipanema, em 2010. Na produção, atores sentavam-se em um café e, no lugar do cardápio, tinham de escolher um trecho do "Poema Sujo". A segunda é a série que estreia agora e a terceira, um longa-metragem sobre a composição do livro, em fase de captação.

Americo Vermelho/Divulgação
Silvio Tendler (dir.) e Ferreira Gullar em cena da série
Silvio Tendler (dir.) e Ferreira Gullar em cena da série "Há Muitas Noites numa Noite"

TRADUZIR-SE

A vontade de traduzir uma parte (o poema) na outra parte (um filme) é uma questão para Tendler desde que viu "Martín Fierro" (1968), adaptação para o cinema feita por Leopoldo Torre Nilsson do poema de José Hernández, um clássico da poesia argentina.

E por que o "Poema Sujo"? "Porque é uma das maiores obras da literatura universal. Um poema que tem a ver com o refúgio total do poeta na memória; o poeta, ameaçado de morte [no exílio] na Argentina, o único lugar em que ele pode se refugiar é a própria memória", afirma o diretor. "E é um poema muito lindo, não vejo por que não adaptar."

Além do poema, Tendler se baseou em "Rabo de Foguete" (1998), em que Gullar conta como foram seus anos de exílio na ditadura. A série começa, cronologicamente, em 1964 com o golpe militar e a resistência política no Partido Comunista, do qual o poeta foi dirigente, e artística, em torno da fundação do teatro do Grupo Opinião, que teve Gullar entre os organizadores.

O contexto histórico e político coloca em perspectiva a escrita de "Poema Sujo", em 1975, na Argentina. Três episódios de "Há Muitas Noites na Noite" (o quarto, o quinto e o sexto) apresentam o poema, a partir da leitura de artistas, como cantor Raimundo Fagner, e intelectuais.

Na série, Silvio Tendler usou entrevistas (há depoimentos de Maria Bethânia, Sérgio Cabral e Agildo Ribeiro) e animações para recriar momentos da vida de Gullar sem imagens de arquivo.

"Como você conta a vida de uma pessoa que viveu na clandestinidade? A vida clandestina é subterrânea, escondida. Há poucas imagens", diz o diretor, que reviveu essas memórias sem arquivos com a ajuda do traço do desenhista João Pinheiro.

NA TV
Há Muitas Noites na Noite
QUANDO sáb., às 23h45, na TV Brasil (livre)


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