Filho de um dos maiores narcotraficantes da história, Juan Pablo Escobar, 38, cresceu em meio à ostentação de mansões, helicópteros e muitas festas até a morte do pai, em 1993.
Passou a fugir dos inimigos da família, diz ter pago dívidas deixadas pelo pai e decidiu não ser um novo Escobar.
Autor da biografia "Pablo Escobar, Meu Pai" (ed. Planeta, 480 págs, R$ 49,90), ele esteve em São Paulo no último final de semana para dar palestra no evento da ONG Turma do Bem, e afirmou, em entrevista à Folha, se sentir "insultado" com a abordagem de sua história feita pela série 'Narcos', da Netflix.
Sebastián Marroquín, nome que adotou na Argentina, acusou o produtor-executivo da série e diretor, José Padilha, e a Netflix de cometerem um "delito" ao usarem a imagem de sua família sem consentimento.
"Queria saber do senhor Padilha como ele reagiria se eu escrevesse uma história da vida dele sem que soubesse?", afirma o colombiano, que diz pensar em uma ação contra os responsáveis.
"O relato biográfico não é propriedade do personagem ou de sua família, ele pertence a quem elaborou a história", diz o advogado Gustavo Binenbojm, responsável pela ação que liberou as biografias não autorizadas no Brasil. No entanto, eventuais equívocos podem possibilitar medida posterior. "Mas jamais alguém será censurado pelo simples fato de não ter autorização", completa.
Marroquín afirma que se ofereceu para ser consultor da série com a condição que fosse remunerado. Diz nunca ter recebido uma resposta do diretor. Padilha nega: "Ele nunca me procurou".
Marroquín também contextualizou a declaração que faz na biografia, na qual cita o cantor Frank Sinatra:
"Essa relação foi através de um parceiro do meu pai [Fidel Castaño, segundo o livro], que tinha vínculo direto com Sinatra. Meu pai não teve uma relação direta, ele tinha muitos parceiros que administravam diferentes rotas do narcotráfico e uma delas era essa. Meu pai e os amigos falavam que ele distribuía cocaína melhor do que cantava. Não significa que meu pai o conheceu."
A assessoria da Netflix decidiu não comentar o assunto. Já a Frank Sinatra Enterprises, gravadora que detém os direitos sobre o cantor, não respondeu à Folha.
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Folha - O que você achou da linha histórica conduzida pela série Narcos?
Sebatían Marroquin - É um insulto à história da Colômbia, à memória do meu pai e à de milhares de vítimas que perderam a vida dentro dessa história. É uma maneira muito horrorosa de representar meu pai como o único responsável por tudo o que aconteceu. Omite fatos históricos que não deveria, sobretudo quando se apresenta ao público uma história supostamente verdadeira.
Os diretores incluíram personagens e subtramas que não existiram. O que o senhor achou?
Os diretores falam que é liberdade poética quando são criticados. Mas quando se fala sobre o seriado, dizem que é a história é verdadeira. Se você ler as letras pequenas, dizem que é tudo parecido com a realidade e casualidade. Eu desconfiaria muito de uma série que disse ser a verdade histórica, mas nunca se interessou em falar com a família do protagonista.
O senhor pensa em processá-los?
Não pensava até escutar a resposta do senhor Padilha [ao jornal "O Estado de S. Paulo", 06/11]. Queria saber do senhor Padilha como ele reagiria se eu escrevesse uma história da vida dele sem ele saber?
Dos personagens da série que realmente existiram, algum o incomodou mais?
Me surpreende não mostrarem as torturas do DEA. Eles são simples espectadores, não tocam em ninguém. Entendo que, como autoridades, tinham a obrigação de denunciar as torturas [do Estado colombiano] que foram testemunhas e participantes. Mas o seriado não conta essa parte, apresenta como uma coisa normal. É a violência institucional validada por meio do Netflix.
O que sua mãe e irmã acharam de Narcos?
Eu falei para elas não perderem tempo assistindo. Foi o suficiente eu já ter perdido.
Pretende assistir à segunda temporada?
Acho que a primeira é o suficiente.
Em seu livro, você comenta do contato de seu pai com o cantor Frank Sinatra. Como era essa relação?
Essa relação foi através de um parceiro do meu pai [Fidel Castaño, segundo o livro], que tinha vínculo direto com ele. Meu pai não teve uma relação direta, ele tinha muitos parceiros que administravam diferentes rotas do narcotráfico e um deles tinha com Frank Sinatra. Meu pai e seus amigos falavam que ele distribuía muito melhor cocaína do que cantava. Não significa que meu pai o conheceu, mas que a cocaína dele chegou às mãos de Sinatra.
Isso foi em qual época?
Não saberia precisar, pois na máfia nunca há evidências, não tem documentos. A ideia da máfia é que nunca deixar rastros.
O seu pai era muito fã do cantor brasileiro Roberto Carlos. Ele chegou a ir em algum show ou a ter um exclusivo?
A gente escutava muita música do Roberto Carlos quando viajávamos de carro por diferentes lugares da Colômbia e meu pai cantava. Essas músicas ele dedicava à minha mãe. Que eu saiba, meu pai nunca assistiu a um show dele.
OUTRO LADO
Procurado para comentar a entrevista de Juan Pablo Escobar, o diretor e produtor-executivo da série "Narcos", José Padilha, deu a seguinte declaração.
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"Pablo foi representado por muitas pessoas em muitos livros e filmes, às vezes de maneira heroica, como fez seu primo, Roberto Escobar. Por que será que este senhor ficou chateado só agora? Por que não saiu batendo no que narrou o seu tio, que vivenciou a vida criminosa de Pablo diretamente?
Pode ser que este senhor seja mais um especialista em Pablo Escobar, mas será que é especialista em ética?"
A Netflix tem todo o direito de contar a história de Pablo como bem entender e de explorar comercialmente a sua narrativa, como qualquer escritor e cineasta têm, posto que Pablo Escobar é uma figura pública. E tem também o direito de contratar os consultores que preferir, segundo a sua avaliação, assim como este senhor tem o direito de ficar chateado por não ter sido contratado.
Finalmente, não só alguns familiares e amigos de Pablo nos procuraram, como um deles até fez ameaças veladas a segurança da equipe de filmagem na Colômbia e pediu para receber consultoria para nos proteger..."
A repórter Olívia Freitas viajou a convite da ONG Turma do Bem