Folha de S. Paulo


Willem Dafoe revive dias derradeiros de Pasolini em filme de Abel Ferrara

"Escandalizar é um direito; ser escandalizado, um prazer." A frase de efeito de Pier Paolo Pasolini, morto há 40 anos, resume o lado polemista do cineasta.

Figura central no cinema do século 20, o pensador italiano viveu sob fama de provocador: era gay, comunista e um crítico da sociedade de consumo.

Resume também o "enfant terrible" Abel Ferrara, diretor dos violentos "O Rei de Nova York" (1990) e "Vício Frenético" (1992), que reconta os últimos dias da vida do realizador italiano em "Pasolini", vivido por Willem Dafoe.

"O cara é um mestre: não fala casualmente. Tudo o que dizia era muito sério", afirma Ferrara à Folha, por telefone.

Na madrugada de 2 de novembro de 1975, o corpo de Pasolini foi achado numa praia nos arredores de Roma, espancado e atropelado, horas após ter se engraçado com um garoto de 17 anos na zona de "trottoir" masculino da cidade –jovem como os que ele gostava de retratar em seus filmes.

Ferrara reencena o assassinato cometido em circunstâncias não muito bem esclarecidas. Na época, aceitou-se que foi morto pelo garoto de programa, embora a perícia tenha constatado espancamento por mais de uma pessoa.

"Não tem versão oficial nisso aí. Ninguém sabe quem foram os outros. Pasolini provavelmente também não soubesse [de onde vieram]", diz.

Ferrara também imagina o que teria sido o longa "Porno-Teo-Kolossal", que o italiano planejava dirigir: obra que misturaria catolicismo e sexualidade, duas de suas obsessões artísticas. Para isso, usou o roteiro que Pasolini havia deixado num gravador.

O cineasta italiano, diretor de "Teorema" (1968) e "Saló" (1975), também volta ao cinemas com uma versão restaurada de "Mamma Roma" (1962), cópia inédita no Brasil.

E tem seu lado literário, menos conhecido no país, explorado no recente "Poemas" (Cosac Naify, R$ 59,90, 320 págs.).

"Os filmes são desenvolvimento do que ele já fazia 20 anos antes na literatura", diz o tradutor Maurício Santana Dias, que compilou poemas e textos em prosa de Pasolini. "Ele via o cinema como arte de alcance maior. O livro dá ideia da complexidade dele, escamoteada pelos rótulos."


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