Folha de S. Paulo


Encontro de artistas do grupo fluxus acaba em golpe de violino na cabeça

Na noite da abertura de "Jogando com Ben Patterson", mostra que fica em cartaz até 23 de dezembro na Bolsa de Arte em São Paulo, o americano que empresta o nome ao título da exposição estava sob cuidados. Aonde ia, alguém o seguia com uma cadeira para que se sentasse.

O artista de 81 anos então se levantou e –após ajudar o recifense Paulo Bruscky, 66, a colocar um capacete– flexionou os joelhos, segurou com mãos firmes o braço de um violino e lançou o instrumento até que se quebrasse na cabeça de Bruscky.

A ideia de juntar um dos fundadores do fluxus ­(movimento que surgiu na década de 1960, traduzindo as linguagens da música, da literatura, do cinema e das artes plásticas por meio da performance) ao brasileiro que mais se correspondeu com o grupo partiu da curadora alemã, Karin Stempel.

"Pensei que se eu fosse fazer uma exposição no Brasil em que a figura principal é Ben Patterson teria que convidar o mais importante artista do fluxus no país, Bruscky", explica Karin, que já havia reunido para a ocasião os brasileiros Francisco Klinger Carvalho, Guto Lacaz, Dudi Maia Rosa e Cristina Barros. A mostra conta com 71 trabalhos, entre vídeos, fotos e objetos. Neste sábado (31), haverá novas performances.

Entre todos os integrantes, por mais curioso que pareça, o único que não conhecia Patterson pessoalmente era Bruscky, ainda que o recifense tenha se relacionado, por arte postal, com quase todos os membros do fluxus.

"Tenho cerca de 1.200 correspondências com o grupo", conta. "Tive contato com Ken Friedman, Dick Higgins."

Ele chegou, inclusive, a conhecer Friedman durante o período em que morou em Nova York. Realizou ao lado do americano, com quem mantém contato até hoje, uma performance no Soho que contou com dois espectadores –um deles, um cão.

Nas últimas décadas, Patterson havia escutado por alto o nome de Bruscky, mas não conhecia nada de seu trabalho. "É maravilhoso", diz o americano. Para a curadora, ainda que Bruscky não seja conhecido na Alemanha, qualquer um que vir o seu trabalho dirá que ele faz parte do fluxus ­­­â€“o movimento, embora surgido na Europa, é considerado internacional.

A apresentação que ocorreu na abertura de "Jogando com Ben Patterson" dá conta do espírito desprendido do grupo, que lançou nomes como a japonesa Yoko Ono e o sul-coreano Nam June Paik.

O ato de quebrar um violino na cabeça de Bruscky foi uma variação da performance "One for Violin Solo", de Paik, apresentada em 1962 na cidade alemã de Wiesbaden, durante o festival que aconteceu sob comando do lituano George Maciunas e foi o marco de origem do grupo.

Na versão original, o artista sul-coreano quebrava o instrumento em uma mesa.

COMO DESCARGA

"Qualquer outro criador estaria interessado no conceito de autoria, mas os fluxus não estão preocupados com isso", afirma Karin.

Neste sábado, a partir do meio-dia, serão apresentadas na galeria 12 performances, entre elas "Tristão e Isolda", de Patterson –na qual uma mulher nua será coberta de arroz antes dos grãos serem consumidos pelo artista ao som de música clássica.

Em "Meu Cérebro Desenha e Pinta Assim", equipamentos de eletroencefalograma mostrarão como funciona a mente de Bruscky.

Ainda que alguns apontem a morte de George Maciunas, em 1978, como o término do grupo, para Paulo Bruscky e Ben Patterson não há fim. "A maior contribuição foi o desenvolvimento da performance, que não existia antes", aponta Patterson. "Não acho que algum dia terminará", ele completa.

Bruscky então lembra a definição que mais gosta do movimento, que deixa clara a ideia de continuidade: "Fluxus é como uma descarga".

JOGANDO COM BEN PATTERSON
QUANDO: mostra, de seg. a sex., das 10h às 19h, sáb., das 11h às 17h, até 23/12; performances, sáb. (31), a partir das 12h
ONDE: Bolsa de Arte (r. Mourato Coelho, 790, tel. 11-3812-7137)
QUANTO: grátis


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