Folha de S. Paulo


Grupo de teatro vai da cracolândia ao bordel em versão 'inacabada' de Brecht

É um processo propositalmente inacabado que a Mundana Companhia apresenta a partir desta quarta-feira (28), no Instituto Cultural Capobianco, em São Paulo.

Trata-se da segunda encenação –ou "ocupação", como o grupo apelidou as sessões– de seu "Na Selva das Cidades - Em Obras", versão da peça de Bertolt Brecht. (A primeira ocorreu no início de outubro, em São José do Rio Preto, interior paulista.)

Cada um dos 11 quadros do espetáculo será apresentado apenas uma vez. Há ensaios prévios, mas não existem marcações de cena, e muito se dá na base do improviso. Salienta-se, assim, a ideia de que o teatro é uma arte efêmera.

"Propomos a essência do teatro", afirma o ator Aury Porto, um dos fundadores da Mundana. "Levado ao seu paroxismo. É uma coisa nova a cada espaço, a cada dia", continua a diretora Cibele Forjaz. "É como um jogo de futebol. Você nunca tem certeza do que vai acontecer."

O texto, considerado um dos mais enigmáticos de Brecht, retrata o embate entre um comerciante e um operário na Chicago de 1912. Mas a luta entre o capitalista e o idealista é repleta de paradoxos: a todo momento os personagens invertem seus ideais e posicionamentos.

"É uma peça que dá uma rasteira na gente", diz Cibele.

Para conceber a montagem, entre outubro de 2014 e maio deste ano, a Mundana realizou 14 imersões, um estudo com cenas improvisadas em espaços distintos de São Paulo: da região empresarial da avenida Berrini à favela Ipanema. "Tínhamos que entender a cidade para revelarmos suas contradições", conta a diretora.

No processo, os atores chegaram a trabalhar, durante um final de semana, em um bordel do Baixo Augusta (como camareiras ou caixas de bar). Uma noite, andaram por ruas da cracolândia, cantando e distribuindo comida a usuários de crack –um deles, lembra Aury, animou-se e acompanhou o grupo no coro, entoando clássicos de axé.

A pesquisa ainda teve influência da célebre montagem do Teatro Oficina para "Na Selva das Cidades", em 1969. À época se construía o elevado Costa e Silva, o Minhocão, viaduto que passa ao lado da sede do grupo de Zé Celso.

Para o cenário, concebido pela arquiteta Lina Bo Bardi, foram usados os escombros da construção vizinha.

Ao fundo do palco, lia-se: "São Paulo, a cidade que se humaniza" –referência ao slogan utilizado pelo governo paulistano nos anos 1960.

"Essa versão do Oficina estava muito antenada com temas da época", diz o ator Mariano Mattos Martins. "Tentamos aqui também trazer questões atuais da cidade."

Ainda não há data nem local, mas a Mundana Companhia tem planos de fazer sua próxima ocupação em fevereiro do próximo ano.

NA SELVA DAS CIDADES - EM OBRAS - OCUPAÇÃO #2
QUANDO qua. (28), às 20h (quadros 1 e 2); qui. (29), às 16h (quadro 3); sex. (30), às 16h (quadros 4, 5 e 6); sáb. (31), às 20h (quadros 7, 8 e 9); dom. (1º/11), às 20h (quadros 10 e 11)
ONDE Instituto Capobianco, r. Álvaro Carvalho, 97, tel. (11) 3237-1187
QUANTO grátis
CLASSIFICAÇÃO 14 anos


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