Folha de S. Paulo


'Voz de ouro da África', Salif Keita se apresenta em Paraty

"A minha visão era ruim, então eu tive de abandonar a escola", diz Salif Keita, 66, um dos mais reconhecidos músicos da história do Mali, na África Ocidental. "Não teve outra solução. Eu vim para a música", completa. O cantor se apresenta no festival Mimo, em Paraty (RJ), no sábado (3).

O problema de visão que o tirou da sala de aula é decorrente de seu albinismo, anomalia genética cuja mais evidente manifestação é a falta de pigmentação de olhos, pele e cabelos e que, em várias partes do continente africano, ainda é cercada de misticismo e preconceito.

Em países como a Tanzânia, o Burundi e o próprio Mali, portadores da condição são perseguidos, assassinados e, por vezes, têm pedaços de seus corpos amputados e vendidos no mercado negro, pois acredita-se que tenham propriedades curativas.

Assim, paradoxalmente, se foi uma das características inerentes ao albinismo que fez Salif se voltar para a música, a anomalia também foi o maior obstáculo para sua carreira.

Simon Maia/AFP
Malian afro-pop singer-songwriter Salif Keita performs on stage on August 29, 2015 at the Safaricom Jazz festival in Nairobi. African music legend Salif Keita has called for people with albinism to be protected, as Tanzania begins campaigning for general elections amid a fear in rise of witchcraft attacks. AFP PHOTO / SIMON MAINA ORG XMIT: KEN08
O músico malinês Salif Keita

"Não é fácil criar um lugar para si sendo albino", diz o cantor, que fundou em 2005 a organização que leva seu nome e luta pela inclusão social de portadores do albinismo.

"Ainda é um tabu, claro, mas a mentalidade vem mudando. Hoje, pelo menos, a perseguição é mais discreta, não ocorre em público."

Salif nasceu parte da família real malinesa, descendente de Sundiata Keita, fundador, no século 11, do Império do Mali, que se estendeu por mais de um milhão de quilômetros. Pela tradição, membros da família real não poderiam se dedicar à música.

"Quando se carrega o sobrenome Keita, não se é destinado para uma carreira como essa. Mas eu perseverei porque era minha única chance de sobrevivência."

Apesar do início turbulento, com suas canções que misturam rock, R&B e ritmos tradicionais africanos, o músico se consolidou, a partir dos anos 1980, ganhando o epíteto"a voz de ouro da África".

Na categoria "world music", emplacou cinco álbuns na parada da "Billboard". O primeiro a aparecer nela, "Amen" (1991), atingiu o topo da lista, onde permaneceu por 31 semanas. Sem lançar um disco desde 2012, Salif promete um novo álbum para 2016.

JIHAD

"Os últimos eventos no Mali são trágicos. Devemos combater grupos extremistas, que não respeitam o Islã", diz Salif, que é muçulmano. Ele se refere à série de conflitos entre forças estatais e grupos ligados à Al Qaeda que ocorre no Mali há cerca de três anos. Em 2012, a música chegou a ficar proibida no país, por ser considerada anti-islâmica.

"Foi uma coisa terrível", lembra ele, que mora na capital Bamako, no sul, longe do centro dos conflitos. "Proibir a música em um país como o Mali é matá-lo."

MIMO FESTIVAL
Veja destaques do evento em Paraty (RJ)

Divulgação
foto do Zukerman Trio, de Israel
Zukerman Trio, grupo de Israel que se apresenta em Paraty

Strobo - Brasil

O duo criado em 2011 em Belém, no Pará, foi o vencedor do prêmio Mimo Instrumental de 2015, e toca na sexta (2), à 0h

Jacob Collier - Inglaterra

O jovem multi-intrumentista, considerado pelo jornal inglês "The Guardian" como o messias do jazz, toca nesta sexta (2), à 0h

Zukerman Trio - Israel

Maestro e violinista, Pinchas Zukerman toca Beethoven e Brahms com a pianista Angela Cheng e a violoncelista Amanda Forsyth neste domingo (4), às 16h

Eu Sou Carlos Imperial - Brasil (cinema)

A mostra de filmes sobre música do festival exibirá, na sexta (2), às 22h, o longa de Renato Terra e Ricardo Calil sobre o produtor Carlos Imperial

MIMO
QUANDO 2/10 a 4/10; show de Salif Keita neste sábado (3), à 0h; programação completa no site do festival
ONDE Paraty (RJ), na Igreja da Matriz e em palco no centro histórico; sessão de cinema na Casa da Cultura, r. Dona Geralda, 177, tel. (24) 3371 2325
QUANTO grátis


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