Folha de S. Paulo


Crítica: Mesmo com tom romântico em exagero, 'Cativas' é trabalho corajoso

Quem passa na frente de um presídio no fim de semana enxerga a cena: serpenteando muros, mulheres, carregando sacolas, constroem uma enorme fila para aguardar a hora da visita.

A cineasta Joana Nin fez um documentário sobre elas. "Cativas - Presas pelo Coração" trata das angústias, sonhos e frustrações dessas personagens que se prendem às histórias de presidiários.

Divulgação
Carta escrita por preso à mulher em cena do filme 'Cativas - Presas pelo Coração', de Joana Nin
Carta escrita por preso à mulher em cena do filme 'Cativas - Presas pelo Coração', de Joana Nin

Elas pouco falam de crimes. Emocionadas, leem cartas saídas da prisão, contam sobre como o romance começou, expõem planos de uma idílica vida familiar no futuro. São pobres, algumas de classe média baixa, que se desdobram entre o trabalho e a preparação para o encontro com o amado.

As entrevistas, muitas feitas nas casas simples de subúrbio, já revelam o perfil dos encarcerados brasileiros. Mas o filme não vai por esse caminho: o foco são os sentimentos, o romantismo, a longa espera que enreda as mulheres.

Nessa busca, mostra audácia ao escarafunchar a vida sentimental de suas personagens. Uma delas resiste a mostrar as cartas do ex. A cineasta insiste, e a senhora cede, um pouco contrariada. Encontra os escritos numa mochila no fundo de uma caixa.

A diretora consegue o que quer, mas a cena deixa uma sensação de invasão de privacidade. Essa sensação aumenta em outros pontos da fita, que chega a entrar nos quartos fechados da visita íntima.

Há um bisbilhotar talvez exagerado. Talvez encenado. Carregando microfones e sabendo que serão ouvidos por outros, mulheres e homens agem com autenticidade?

A câmera é instalada numa cela. O que se vê são dois presidiários falando sobre a redação de mensagens, sobre figuras de flores nas cartas. Na cena seguinte, a carta, com uma rosa desenhada, chega a seu destino via Sedex.

Como numa visita guiada, o documentário mostra prisões relativamente arrumadas, funcionários prestativos e filas que andam. Não há superlotações e, no pátio, existe espaço para encontros com alguma privacidade. A revista íntima surge como marca humilhante na vida dessas mulheres.

Mesmo com um tom às vezes invasivo e romântico em exagero, "Cativas" é um trabalho corajoso e provocativo. Afinal, as filas que marcam os presídios masculinos não se repetem nas cadeias femininas. Há algo para investigar.

CATIVAS
DIREÇÃO Joana Nin
PRODUÇÃO Brasil, 2013, 12 anos
QUANDO em cartaz
AVALIAÇÃO bom


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