Folha de S. Paulo


CRÍTICA

Intensidade de Regina Casé em 'Que Horas Ela Volta?' contamina o espectador

O que mais me importa em "Que Horas Ela Volta?" não tem a ver com o realismo social nem com o carisma da protagonista defendida bravamente por Regina Casé.

Havia algo mais que não conseguia entender ao ver o filme. Algo que, em "Durval Discos" (2002), a estreia de Anna Muylaert em longas, se traduzia num estranho que emerge do cotidiano.

Em "É Proibido Fumar" (2009), o tom despojado, mas tocante, já apontava para uma especial sensibilidade por um mundo sem grandes dramas, mas que se distancia da comédia romântica.

O último filme de Anna Muylaert é também o que atingiu o maior público –não devido a concessões, mas por competência da diretora, seu elenco e sua equipe em lidar com o cinema clássico sem se render aos clichês de novela.

Os grandes dramas ou confrontos de personagens são deixados de lado, como se não valessem muito a pena. Nada de heroico ou patético na vida dos personagens.

Também não se trata de uma fuga em direção a uma conciliação conservadora (vocabulário herdeiro de uma arte engajada envelhecida que aqui também não cabe), que pode passar por crítica mas pouco acrescenta às sutilezas do filme.

O que eu não conseguia nomear no filme talvez seja uma alegria em viver, em especial a da protagonista. São várias as cenas e gestos de Val/Regina Casé que exprimem isso: o carinho por Fabinho, o filho que criou; o passeio escondido na piscina à noite; o roubo do presente que dera à patroa.

Essa alegria, essa intensidade de estar no presente, vem da personagem e contamina o espectador. Isso não é pouco nem banal. Diria mesmo raro.

DENILSON LOPES é professor da Escola de Comunicação da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro).


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