Folha de S. Paulo


Zibia Gasparetto reescreve livros antigos para atingir mais leitores

Aos 500 anos de idade, Lucius decidiu reescrever grande parte de sua obra. E Zibia Gasparetto, aos 89, entrou em ação: a escritora espírita que já vendeu 17 milhões de cópias em todo o mundo, segundo sua própria contabilidade, se pôs a revisar os clássicos que diz ter escrito seguindo os sussurros do espírito Lucius.

"Mudei as frases, tornando-as mais claras. Troquei floreios e facilitei o entendimento", diz a escritora, que há um quarto de século lança um romance por ano e trabalha com um retrato do amigo espiritual sobre a mesa e pantufas lilases sob ela.

"Ele me disse: 'As coisas mudaram. Precisamos ter uma linguagem mais clara, mais simplificada. Nós estamos aí com a internet. Vamos modernizar'." Começou então o que chama de "uma limpa" nas suas obras antigas.

Palavras difíceis e verbos conjugados na segunda pessoa foram abolidos. Ainda resta um "entrechocando-lhes" aqui e um "rijos de macilentas carnes" ali, mas isso "faz parte do estilo" do autor do além, que já foi membro do Parlamento inglês e juiz na França em outras encarnações, diz Zibia, rindo.

Karime Xavier/Folhapress
SÃO PAULO / SÃO PAULO / BRASIL -26 /08/15 -10 :00h - Perfil da escritora Zibia Gasparetto, que, aos 89 anos, está reescrevendo seus livros mais populares (ela vendeu mais de 17 milhões de cópias).( Foto: Karime Xavier / Folhapress) . ***EXCLUSIVO***ILUSTRADA
Zibia Gasparetto, 89, reescreve seus livros mais populares com a ajuda do espírito Lucius

Nos últimos meses, chegaram ao mercado novas edições de clássicos do gênero, como "Ninguém É de Ninguém" (2000) e "Esmeralda" (1985). Além do léxico sem enfeites, aumentou-se o tamanho das letras e os desenhos de flores da capa foram substituídos por fotos de modelos, "mais parecidas com os dias de hoje, para sair mais", admite a autora.

Também para se aproximar do espírito dos tempos, ela lançou seu primeiro livro para colorir: "Eu Comigo!". As frases foram psicografadas por entidades, ao contrário das ilustrações, traçadas por profissionais sem dons mediúnicos aparentes.

A preocupação comercial é maior do que nunca na casa, que teve a vendagem "um tanto afetada" pela crise.

FILME E COSMÉTICO

O mau momento se mostra com um vazio na Vida & Consciência, editora e gráfica que o clã Gasparetto erigiu num prédio de três andares no Ipiranga, com decoração alva e fotos de unicórnios e flores nos banheiros.

A empresa familiar teve de demitir 52 funcionários. A matriarca quer vender suas impressoras industriais e deixar de fazer livros para outras editoras. "São tempos duros, esses de PT", diz a autora.

Mas ela vê uma luz no fim do túnel: o livro "Nada É por Acaso", de 2005, deve virar longa pela Globo Filmes, dirigido por Jorge Fernando. A Globo Filmes informou "ainda" não estar envolvida.

A empreitada obteve autorização do Ministério da Cultura para captar R$ 5,6 milhões via leis de incentivo. A autora afirma que já conseguiram R$ 3,2 milhões e que recebeu nas últimas semanas a lista com três atores globais cogitados para cada personagem. "Vai depender da agenda das novelas", diz ela.

Com mais de 50 edições, "Ninguém É de Ninguém" seria a segunda produção cinematográfica, no caso de sucesso, afirma. "É que esse filme custaria muito mais caro."

Outra saída para burlar a queda nas vendas foi uma parceria firmada com a marca de cosméticos Avon, que revende de porta em porta suas obras impressas em papel mais barato, por preços que vão de R$ 12 a R$ 20.

Mas, acima de tudo, os maus bocados serão superado com trabalho, acredita ela. Três tardes por semana, Zibia se isola numa salinha, com um computador, um rádio e um copo d'água, onde a entrada de qualquer outra pessoa é vetada, e deixa Lucius falar em sua orelha, para ela digitar no computador.

Atualmente, trabalha em dois romances –antes eram quatro de uma vez, mas o espírito, diz, anda vindo menos.

"Não é culpa do meu declínio físico, não, foi ele quem me disse." Ainda que não cogite se aposentar, Zibia já constrói uma sucessão.

"Se eu puder deixar outros autores por aí, seria bom." Para isso, lê originais novos toda semana e dá conselhos. "Colegas achavam que nosso estilo tinha de ser piegas, isso é errado." Vocativos como "irmãozinho" foram proibidos em obras da editora.

Antes do fim de 2015, Zibia planeja lançar seu 36º romance, ainda sem nome. "Se Lucius permitir, é claro."


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