Folha de S. Paulo


Palacete histórico no centro de SP abrigará nova Casa de Francisca

Um prédio monumental de 1910, localizado no chamado triângulo histórico do centro de São Paulo, onde nasceu a cidade, vem sendo preparado para reacender sua vocação musical.

Esparramado entre as ruas Direita, Quintino Bocaiúva e José Bonifácio, o Palacete Teresa Toledo Lara foi, no século 20, sede de referências na música paulistana, como as casas de instrumentos e partituras Bevilacqua e Irmãos Vitale e a Rádio Record.

Até o início de 2016, passará a abrigar o novo projeto de um dos melhores espaços para shows da cidade, a Casa de Francisca, que no novo endereço manterá o velho nome.

Bancada pela família proprietária do prédio, a reforma está em fase final de conclusão. Como trata-se de um imóvel tombado pelo patrimônio municipal, teve de ser autorizada pelo Conpresp, o conselho de preservação dos bens históricos de São Paulo.

O novo espaço para shows ocupará uma parte do primeiro andar do prédio de 2.766 m² e três pavimentos (mais subsolo), convivendo com um loja voltada para músicos que já funciona ali, a Casa Amadeus Musical.

Hoje com capacidade para 44 pessoas e autodefinida "a menor casa de shows da cidade", a Casa de Francisca deve ao menos triplicar a capacidade, planejando um público entre 120 e 150 pessoas no novo local.

Mesmo na escala ampliada, os idealizadores prometem manter o ambiente intimista que marca o atual espaço, nos Jardins –onde, durante os shows, o serviço de bar/restaurante é interrompido e celulares são rechaçados com vigor.

"Hoje somos minúsculos; vamos virar pequenos", afirma o artista gráfico Rubens Amatto, 36, um dos fundadores da Casa de Francisca e ponta de lança do novo projeto.

Um projeto de financiamento coletivo, batizado de "El Fundador", será lançado para viabilizar a abertura do espaço. Quem comprar um dos quatro modelos de cadeiras desmontáveis criadas para esse fim levará, além do objeto em si, brindes (como camisa e bandeira) e descontos na compra de ingressos para shows e refeições na casa.

Os modelos serão de papelão, compensado naval, mdf e cumaru –um quinto pacote, o mais barato, incluirá protótipos em miniatura das cadeiras (como a vermelha que Amatto segura na foto acima). Os preços dos pacotes não estão definidos.

Pablo Saborido/Divulgação
Equipe da Casa de Francisca e colaboradores no palacete, com as cadeiras que serão postas à venda
Equipe da Casa de Francisca e colaboradores no palacete, com as cadeiras que serão postas à venda

O projeto da nova Casa de Francisca vai ser lançado na quarta edição da série de shows "El Grande Concerto", nos dias 28, 29 e 30 de agosto, no Auditório Ibirapuera.

ORNAMENTOS

Projetado pelo arquiteto alemão Augusto Fried, por encomenda de Antônio de Toledo Lara, que batizou o prédio com o nome de sua filha, o palacete é uma joia em estilo eclético no coração da capital paulista.

"É um lugar emblemático para o centro. Nenhum outro prédio na região tem uma fachada tão ornamentada", diz o arquiteto Marcello Pucci, que fez o projeto de reforma com Maria Vitória Fischer.

Segundo ele, a intenção foi ao mesmo tempo preservar e modernizar o imóvel. A fachada, com suas esculturas, ornamentos e platibandas, está sendo limpa e restaurada –raspadas, recebem novo revestimento em argamassa.

O piso em ladrilho hidráulico será mantido; o elevador terá a caixa trocada, mas a porta pantográfica fica; banheiros, parte elétrica e hidráulica estão sendo modernizados. Os proprietários, que bancam sozinhos o restauro, não divulgam os gastos. Em 2009, apurou a reportagem, a reforma foi orçada em R$ 5,3 milhões (R$ 7,6 milhões em valores atualizados).

A Casa de Francisca alugará o espaço por pelo menos quatro anos.

Bisneta do construtor do palacete (e neta da filha dele que deu nome ao prédio), a atual proprietária, Tereza Artigas Lara Leite Ribeiro, não quis dar entrevista.

Segundo Rubens Amatto, da Casa de Francisca, facilitou a negociação o fato de Tereza frequentar a casa de shows e gostar de música –informação confirmada pela equipe que trabalha para ela.

A reforma, que contou um auxiliar da proprietária, segue o movimento de recuperação do centro paulistano.

Presidente do Conpresp, a arquiteta Nadia Somekh saudou a iniciativa. "É tudo o que a gente precisa para o centro. Não só um edifício histórico está sendo devolvido à cidade, como o aspecto imaterial dele, que é a manutenção do espírito musical do prédio."

ADONIRAN

Construído como edifício de escritórios com comércio no térreo, o palacete abrigou a Rádio Record entre os anos 1940 e 1950. O auditório da emissora abrigou shows e programas de calouros.

Foi lá que Adoniran Barbosa interpretou papeis célebres de radioator, como o do malandro Charutinho. "Sem aquele prédio e a Rádio Record, não existiria Adoniran. Ele só decolou como sambista depois de se consagrar como radioator", relata Celso de Campos Jr., biógrafo do compositor.


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