Folha de S. Paulo


Documentário revê a atuação da 'Ilustrada' na transição democrática

O documentário "Não Estávamos Ali para Fazer Amigos", que será exibido nesta quarta (5) no 10º Festival de Cinema Latino-Americano em SP, propõe mostrar a inserção da "Ilustrada" na transição do governo militar para a democracia, na década de 1980.

Dirigido por Miguel de Almeida e Luiz R. Cabral, o filme reúne imagens do período –posse de Figueiredo, Lula no estádio em São Bernardo, Diretas Já!, morte de Tancredo, rock, Sarney, censura a filme de Godard– e depoimentos de jornalistas da Folha e protagonistas das mudanças culturais vividas então no Brasil.

Almeida escolheu como tema os anos 1980 –"uma época ainda mal contada no cinema brasileiro"– pela efervescência de cultura urbana, e queria falar de algo que tivesse vivido. Ele trabalhou na "Ilustrada" de 1980 a 1987.

Reprodução
Arrigo Barnabé em depoimento aos diretores Miguel de Almeida e Luiz R. Cabral
Arrigo Barnabé em depoimento aos diretores Miguel de Almeida e Luiz R. Cabral

"Minha geração não era comprometida com partido, queria saber coisas da arte internacional. Fomos atrás e conquistamos espaço. Nada foi de graça, éramos policiados pela direita e pela esquerda."

O filme se preocupa em confrontar uma cultura que propunha uma volta ao passado, das pessoas que procuram remontar espetáculos proibidos na ditadura e lançar músicas censuradas aos artistas que apresentam novas propostas.

Opõe em imagens Gianfrancesco Guarnieri e Chico Buarque conversando sobre remontagem de peças proibidas com depoimento de Antunes Filho defendendo que Nelson Rodrigues não era de direita.

Parece ser possível encontrar confrontação em todas as áreas culturais. Arrigo Barnabé reclama de um esquerda conservadora acusando que seu trabalho "não é música". Tunga relembra as mudanças nas artes plásticos. Angeli fala da influência de sua parceria com Laerte e Glauco no quadrinho brasileiro.

Marcos Augusto Gonçalves, editor da "Ilustrada" em dois períodos e hoje responsável pelo caderno "Ilustríssima", fala no filme sobre a tentativa constante de fugir à arte oficial, sobre buscar o novo. Para ele, "A 'Ilustrada' não refletia o que acontecia, ela realizava uma intervenção".

Na segunda metade do documentário, o roteiro justifica o título. São relembradas alguns embates entre jornalistas da "Ilustrada" e artistas: Pepe Escobar x Nasi, Miguel de Almeida x Fagner (dois episódios muito próximos da agressão física) e Caio Túlio Costa x Caetano Veloso, numa discussão sobre o filme do cantor, "Cinema Falado".

"A crítica cultural era muito brasileira, contemporizadora. O cara virava jornalista para conhecer o Caetano", diz Almeida no filme. "Eu e o Miguel brigamos com todo mundo, literalmente todo mundo", afirma Pepe Escobar.

O diretor abre e fecha o filme com a censura do longa "Je Vous Salue Marie", de Jean-Luc Godard, proibido pelo presidente José Sarney em 1986. "Depois de toda a luta pelas Diretas e pelo fim da censura, aquilo mostra bem o tamanho da nossa decepção".

NÃO ESTÁVAMOS ALI PARA FAZER AMIGOS
DIREÇÃO Miguel de Almeida e Luiz R. Cabral
PRODUÇÃO Brasil, 2015
QUANDO qua. (5), às 21h
ONDE Memorial da América Latina, r. Auro Soares de Moura Andrade, 664, tel. (11) 3823-4600
QUANTO grátis (retirar ingresso com uma hora de antecedência)


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