Folha de S. Paulo


Mario Prata faz e dá entrevista fictícia

Esta é uma entrevista de ficção. Qualquer semelhança com "Mario Prata Entrevista uns Brasileiros", em que o escritor trava diálogos de mentirinha com 22 personalidades brasileiras (de Tiradentes a Dom Casmurro), é mera coincidência. A Folha também inventou o bate-papo abaixo. Confira os melhores trechos.

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Ilustração do escritor em seu livro 'Mario Prata Entrevista uns Brasileiros
Ilustração do escritor em seu livro 'Mario Prata Entrevista uns Brasileiros'

Folha - Li que o sr. conversou com Pedro Álvares Cabral sobre a relação dele com Maluf.

Mario Prata - Questionei-o sobre seu túmulo em Santarém, com uma placa que diz: "Ao descobridor do Brasil, a homenagem de Paulo Salim Maluf". Cabral alegou desconhecer o homem, embora "off the record" tenha me contado que Pero Vaz de Caminha já citara um gajo de sangue libanês que certa vez interrompeu sua bacalhoada numa bodega lisboeta para contar vantagem: "Sabe o ovo de Colombo? Foi Maluf que fez!".

Que história é essa de Dom João 6º ter um amante?

Desde aquela novela com o Antônio Abujamra, encasquetei se nosso monarca se pegava pensando: "Que rei sou eu?". Ele casou com uma das maiores barangas da Europa, a Carlota Joaquina. Não que fosse um Cauã Reymond do seu tempo, mas o homem tinha suas necessidades. João me confessou que seu camareiro favorito, o Chico, o masturbava regularmente. "Uma punhetinha de nada", como conto na página 134. Joãozinho ficou bravo com o rumo da conversa e me mandou tomar banho. Evidente que era uma ofensa, haja vista que o próprio gosta de dizer que nem Napoleão, fã "dos melhores perfumes franceses", era chegado numa ducha.

Pelo que descreve, Dom Casmurro ficou contrariado com a insinuação de que não era por Capitu que caía de amores...

Ora, o próprio Machado de Assis escreve que Bentinho pergunta a Escobar: "Você janta comigo?", e o amigo responde: "Vim para isto mesmo". Todo mundo sabe que "there's no free lunch" [não existe almoço grátis]. Não tem por que acreditar que a janta seria. E antes eles ficam cinco minutos de mãos dadas. Cinco minutos! É mais tempo do que toda a minha vida sexual somada até os 18.

Faltou coragem a Machado para escancarar esse romance?

Dou uma colher de chá, era o fim do século 19. Três décadas depois, nem Mário de Andrade saiu do armário com todas as letras, como se vê naquela carta ao Manuel Bandeira. Mas o bruxo do Cosme Velho é danado, deixou pistas.

Quem sabe Capitu ganhou olhos de ressaca de tanto vinho do porto que tomou ao perceber o que acontecia entre os dois homens de sua vida? Fora que entrei na internet e digitei: "Dom Casmurro é gay?". Achei um texto do Millôr Fernandes muito oportuno, em que ele repara que todo o mundo quer saber se Capitu deu pra Escobar, mas ninguém fala nada da intimidade dos dois amigos.

Acha que a liberação de biografias não autorizadas vale para seus "tête-à-tête" feitos à revelia dos entrevistados?

Ernest Hemingway dizia: "Todos os bons livros têm algo em comum, são mais verdadeiros do que se tivessem realmente acontecido". Mas se me encherem vou sugerir que esqueçam o que escrevi.

Alguém que gostaria de ter entrevistado e ficou de fora?

Liguei para a igreja do Silas Malafaia, mas o pastor não fazia ideia de quem eu era.Ele até perguntou: "Mario? Que Mario?". Não rola [risos].

O livro é dedicado a seus dois netinhos, Olivia e Daniel. Gostaria que virassem escritores, como o sr. e seu filho Antonio Prata [colunista da Folha]?

Queria eu não transmitir a nenhuma criatura o legado de nossa miséria. Oxalá Antonio dê mais sorte.

MARIO PRATA ENTREVISTA UNS BRASILEIROS
EDITORA Record
QUANTO R$ 35 (248 págs.)
LANÇAMENTO hoje, às 17h, na Livraria da Vila, r. Fradique Coutinho, 915, tel. (11) 3814-5811


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