Folha de S. Paulo


CRÍTICA

'O Último Poema do Rinoceronte' abusa de tática da emoção às custas da chantagem moral

Um letreiro na abertura de "O Último Poema do Rinoceronte" anuncia tratar-se da história do poeta iraniano-curdo Sahel Kamangar, "que ficou 27 anos nas prisões da República Islâmica do Irã, enquanto sua família foi informada de que tinha morrido".

A informação impositiva nos coloca no estado de ânimo de adesão imediata a um relato de injustiça, de abuso de direitos humanos. Uma reação calculada, pois o filme é dedicado ao estudante Sane Jaleh e ao poeta e ativista Farzad Kamangar, mortos pelo regime iraniano, "e a todos os políticos prisioneiros ainda mantidos reféns no Irã".

Bahman Ghobadi, diretor iraniano de origem curda, no entanto, não esgota o interesse pelo drama de Sahel Kamangar com o recurso tradicional e simplório do cinema político de conquistar emoção à custa da chantagem moral.

A história é apresentada por meio de flashbacks, nos quais sabemos os detalhes da tragédia pessoal do poeta, separado da família e da mulher, também presa por cinco anos e submetida a torturas e abusos sexuais.

O filme adota mesmo as convenções do melodrama ao sugerir que a condenação foi menos motivada pelo teor dos escritos do poeta do que pela cobiça de um motorista, apaixonado pela mulher dele. Ao mudar de status com a revolução, o empregado usou o novo poder para executar uma vingança pessoal.

FIEL

Essas facilidades, no entanto, são equilibradas com as escolhas formais feitas por Ghobadi para expressar a restrição, a coerção e o controle imposto pelo regime.

O modo como filma os corpos e as faces ou a percepção do mundo que alguém passa a ter depois de décadas encarcerado traduz a experiência muito mais do que a imposição de uma mensagem.

Se o aspecto sorumbático e pesado incomoda, a opção ganha significado quando contrastada com a alegria e a vontade de liberação que alimentavam o delicioso "Ninguém Sabe dos Gatos Persas", feito pelo diretor em 2009. As esperanças de renovação foram desfeitas, o regime se fechou e o cinema de Ghobadi manteve-se fiel aos rumos da realidade.

O ÚLTIMO POEMA DO RINOCERONTE (Fasle Kargadan)
QUANDO: ESTREIA NESTA QUINTA (25)
ELENCO: BEHROUZ VOSSOUGHI, MONICA BELLUCCI, YILMAZ ERDOGAN
PRODUÇÃO: IRÃ/IRAQUE/TURQUIA, 2012, 16 ANOS
DIREÇÃO: BAHMAN GHOBADI


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