Folha de S. Paulo


CRÍTICA

Baumbach expõe embate das gerações X e Y em "Enquanto Somos Jovens"

É do filósofo francês Jean-Paul Sartre (1905-1980) o termo "A Idade da Razão", título do famoso primeiro romance de sua trilogia existencialista, "Os Caminhos da Liberdade", dos anos 1940.

Pois "Enquanto Somos Jovens", que estreia nesta quinta (18) no Brasil, trata da razão da idade, e também tem o existencialismo e a busca da liberdade individual entre os seus temas principais. Casamento, filhos e realização profissional como um afrodisíaco são alguns dos outros.

Divulgação
Ben Stiller e Naomi Watts em cena de
Ben Stiller e Naomi Watts como um casal de documentaristas em "Enquanto Somos Jovens"

Mas o mais interessante é o embate entre as gerações X e Y. "Enquanto Somos Jovens" pode despertar várias interpretações, mas conta uma história simples.

Um casal de documentaristas, na casa dos 40 anos, vivido por Ben Stiller e Naomi Watts, se encontra e se encanta com um casal bem mais jovem, na casa dos 20. Ele –Adam Driver, o bonitão da série "Girls"– é um documentarista e ela –Amanda Seyfried, a lindinha de "Mamma Mia"–, dona de uma marca de sorvetes artesanais.

FIM DA IDADE

O primeiro casal, mais próximo da minha geração, se acredita jovem, como se entre os 20 anos e os 50 anos fôssemos todos mais ou menos iguais. Crescemos acreditando que a idade não existia de fato, que isso era coisa das gerações passadas, em que gente de 20 anos casava, tinha filhos e adotava para o resto da vida uma postura "adulta".

Nós não fizemos assim. A partir da adolescência, viramos jovens e gostaríamos de seguir vivendo dessa maneira, com alguma sorte, até que a morte nos separasse. Decretamos o fim da idade, assim como o cientista político Francis Fukuyama anunciou, em 1992, o fim da história.

Pois bem, não só a idade está viva como há duas gerações antagônicas em convivência, talvez pela primeira vez desde os anos 1960. Nós, os X, e eles, os Y. Nós somos a última geração que nasceu analógica, eles os primeiros a nascerem digitais.

O que isso significa em termos de costumes? É disso que trata o filme, com alguma sutileza. A angústia do personagem de Ben Stiller, um documentarista que há cinco anos tenta terminar seu segundo filme depois de uma estreia promissora, diante da absoluta inconsequência do hipster Adam Driver, todo promessa e nenhuma realização, é a angústia de uma geração.

Fizemos tudo direito, jogamos conforme as regras inclusive quando as quebrávamos. Eles chegam e "sampleiam" tudo, sem dramas.

Num dos melhores diálogos do filme, o personagem de Driver afirma ao de Stiller que aquilo (e contar o que é aquilo estraga a experiência) não era um plágio, mas um "compartilhamento". O mais velho surta: "Compartilhar é roubar".

BAUMBACH

O cineasta responsável por este longa-metragem é o brilhante Noah Baumbach, 45, autor de alguns dos melhores filmes independentes da última década. São dele Frances Ha (cujo roteiro foi coescrito por sua mulher, a atriz Greta Gerwig, uma autêntica Y), "O Solteirão" (também com Ben Stiller) e "A Lula e a Baleia", entre outros.

Ele nem finge ser neutro no embate que se estabelece neste "Enquanto Somos Jovens". O protagonista é uma versão dele mesmo, em um mundo em que seus filmes anteriores tivessem dado muito errado. Ele está amedrontado e ressentido com o que vem por aí.

E como poderia ser diferente? Assistimos de camarote à derrocada do nosso jeito de viver. E ainda achamos que podemos participar dessa festa, registrando tudo com nossos smartphones.

ENQUANTO SOMOS JOVENS
QUANDO: ESTREIA NA QUI. (18)
ELENCO: BEN STILLER, NAOMI WATTS, ADAM DRIVER E AMANDA SEYFRIED
PRODUÇÃO: EUA, 2014, 12 ANOS
DIREÇÃO: NOAH BAUMBACH


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