Folha de S. Paulo


Nick Cave lê para público registros poéticos escritos em sacos de enjoo

"Fazer turnê é incrivelmente tedioso. É uma explosão de energia e depois o tédio. Você entra num estado mental bizarro."

As palavras são de Nick Cave, que oferece aos fãs uma rara espiada em seu mundo de músico na estrada, num novo livro lançado neste mês que foge dos padrões atuais de biografias de astros do rock.

"The Sick Bag Song", vendido apenas no site oficial, começou como um poema escrito enquanto Cave viajava com sua banda The Bad Seeds pela América do Norte, mas acabou se estendendo e ganhando outros formatos, em 22 capítulos, cada um para uma cidade.

Os registros poéticos eram feitos em sacos de enjoo ("sick bag", em inglês) que Cave encontrava nos aviões, cujas cópias estão no livro, com a letra esquisitona do músico.

"Tenho escrito canções em sacos de enjoo a minha vida toda. É fascinante ver o que fazem com eles", disse Cave durante leitura de trechos do livro no começo do mês, no cinema American Cinematheque de Hollywood.

"A United os revestiu de plástico, não dá para escrever em cima. É muito irritante."

No livro, há divagações sobre criatividade e procrastinação, um poema sobre ele pintando seu cabelo de preto num hotel de Milwaukee (e querendo ficar mais parecido com Johnny Cash e menos com o ditador norte-coreano Kim Jong-un) e memórias sobre encontros com seus ídolos Bryan Ferry e Bob Dylan.

Ele leu para a plateia o trecho sobre Dylan, que se passa no festival de Glastonbury (na Inglaterra) em 1998.

"Uma mão de cetim, fria e branca, pegou a minha. Ei, eu gosto do que você faz, ele me disse. Eu gosto do que você faz também, eu respondi. Eu quase morri. Esvaziei tanto que poderia desaparecer."

*The Sick Bag Song"

nick cave

Cave se recusa a chamar o livro de biográfico. "Sou um escritor de ficção. É um trabalho de ficção sobre um astro do rock envelhecido que se parece muito comigo em turnê pela América em 2014", disse, emendando sua filosofia sobre o "estado mental bizarro" da vida na estrada.

"É um culto de si mesmo. Você está constantemente sendo observado e constantemente se olhando no espelho. Você acaba virando aquilo... a máscara fica. Você acorda, e a máscara continua lá."

O australiano de 57 anos, que hoje vive na Inglaterra, abriu o microfone para responder perguntas do público por mais de uma hora. Disse que não escuta muita música hoje em dia. "Apenas quando dirijo, mas minha mulher acabou de tirar sua carteira, então nem isto eu faço mais", falou.

Um garoto que disse que viajou seis horas de carro de São Francisco só para vê-lo em Los Angeles perguntou sobre o roteiro de "Gladiador 2", que Cave escreveu para o ator e conterrâneo Russell Crowe. "Sim, eu fiz. Mas o que aconteceu é realmente entre Russell Crowe e a lata do lixo".

O cantor, que tem dois livros de ficção, "A Morte de Bunny Munro"(editora Record, 2010) e "And the Ass Saw the Angel" (1989), também leu um trecho sobre sua passagem por Nashville, na qual recebeu uma injeção de esteroide na coxa para "transformar o cantor gripado e com jet lag numa divindade".

"The Sick Bag" está à venda numa edição de luxo de US$ 1.105, que traz também versão em e-book, um áudio book (narrado pelo próprio autor), um vinil e um saco de enjoo com desenhos e escritos originais de Cave.

THE SICK BAG SONG
AUTOR Nick Cave
EDITORA Canongate
ONDE comprar pelo site www.thesickbagsong.com
QUANTO R$ 135 e R$ 3.370, edição de luxo (176 págs.)


Endereço da página:

Links no texto: