Folha de S. Paulo


Em obra, artista remete a caminhos do Central Park

Como uma escultura pastoral alojada no coração de uma metrópole, o Central Park fascinou e provocou artistas por décadas.

Claes Oldenburg contratou coveiros para escavar e encher um buraco ali, para formar um "monumento invisível". Christo e Jeanne-Claude colocaram portões laranja. Diane Arbus usou sua câmera para capturar as estranhezas do parque.

Então, quando Tatiana Trouvé, conceituada escultora que trabalha em Paris, foi convidada pelo Fundo Público de Arte para criar um trabalho relacionado ao parque, seus instintos a fizeram sonhar alto.
A peça que ela fez, "Desire Lines" [Linhas de desejo], tem, de certo modo, o tamanho do parque.

Ela é composta por quilômetros de fios coloridos que, se desenrolados dos carretéis de madeira que os prendem, poderiam se estender ao longo de cada centímetro dos 212 caminhos, pelas contas Tatiana, que serpenteiam pelos 341 hectares do parque.

Como a história de Borges sobre um mapa tão grande e detalhado que corresponde precisamente ao território que mapeia, a instalação de Tatiana situa-se entre o mundo real e o representado. Isso parece justo porque, como disse em uma entrevista recentemente, ela primeiro conheceu o parque pelo estudo de mapas e fotos e só depois o visitou pessoalmente.

"Foi muito interessante. Dá para ver que o Central Park não é só chão, mas tubos, cabos, luzes e tudo o que é necessário para que ele funcione. É como uma grande máquina, e muita coisa não está à vista. Para mim, foi como fazer uma escultura em cima de outra escultura."

Quando disse isso, ela estava em uma antiga loja na Park Avenue convertida no ano passado em um espaço de exposição pela Galeria Gagosian, que a representa.

Lá, há um modelo em escala reduzida de "Desire Lines", três racks metálicos tomados por carretéis de fios. Nas mesas havia mapas retangulares desenhados à mão pela artista, mostrando os caminhos sinuosos do parque, acentuados com cobre e estanho.

A instalação do parque é a primeira encomenda pública que Tatiana, 46, concluiu nos EUA.

Durante mais de dois anos, ela trabalhou no projeto do Central Park. Ela queria que o parque e seus caminhos funcionassem como espaços físicos e evocações da cultura. Então, mergulhou no que chama de "o mundo das marchas" e usou placas de metal para marcar cada um dos seus 212 carretéis -um para cada caminho do parque.

"Os locais do parque já têm nomes que o transformam em uma história da sociedade moderna: Portão dos Engenheiros, Portão das Mulheres, Portão dos Artistas, Portão dos Guerreiros, Portão dos Agricultores", disse.
Então, ela destinou um caminho para marcar a data de 7 de março de 1965, a marcha pelos direitos civis que foi de Selma até Montgomery, no Alabama.

Outro caminho representa o 21 de outubro de 1967, a marcha rumo ao Pentágono.

Mas os caminhos também passam pelo poético e pelo conceitual, como a corda bamba que Philippe Petit atravessou entre as torres do World Trade Center; ou "Phat Free", a performance do artista David Hammons de 1995 em que ele chutou um balde em uma rua deserta de Nova York à noite; ou "Winos Do Not March" (bêbados não marcham), de Frank Zappa, ou a obra "Easy", de Allan Kaprow de 1972, no qual estudantes carregavam pedras ao longo de um leito seco de rio.

"Há muitos artistas que fizeram obras sobre esses caminhos, mas infelizmente, não posso usar todos aqui", disse Tatiana.

Porém, ela se animou e acrescentou que isso pode acontecer um dia: "Esse é apenas um minúsculo atlas de todos os caminhos que achei, daqueles que consegui encontrar. Eu poderia continuar trabalhando com isso por anos".


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